Apresentação
- 1. Apresentação: Instrumentos de pesquisa na documentação do Projeto Resgate
O presente texto é parte do trabalho como consultor individual no âmbito do Projeto Resgate Barão do Rio Branco (Projeto 914BRZ3025 – Edital 04/2021), em uma cooperação da Fundação Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro (FBNRJ) com a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO). As atividades estão sendo realizadas em conjunto com outros dois consultores – Rafael Afonso Gonçalves e Hugo Coelho Vieira, sob coordenação da professora Doutora Érika Simone de Almeida Carlos Dias.
Antes de analisarmos o instrumento de pesquisa referente às Irmandades e ordens religiosas, é preciso destacar a história do Projeto “Resgate”. A partir de 1959, a UNESCO passou a implementar projetos e políticas na área do Patrimônio Arquivístico Comum. Esse projeto possibilitou que vários países e comunidades pudessem ter acesso às memórias históricas comuns entre diferentes Estados ou povos. Assim, nasce o Projeto Resgate Barão de Rio Branco, de um esforço de cooperação entre Brasil e Portugal para salvaguardar através de microfilmes a documentação referente à História do Brasil depositada em arquivos lusitanos, sendo o principal deles o Arquivo Histórico Ultramarino (AHU). Na década de 1990, os portugueses consentiram que pesquisadores brasileiros e portugueses tratassem, catalogassem e microfilmassem as mais de 28 séries concernentes às diversas capitanias brasileiras, bem como séries que abrangem outras áreas do ultramar português e que, direta ou indiretamente, se interligam com o Brasil por questões econômicas, administrativas, políticas ou, ainda, por laços de parentesco entre os diversos agentes da governação portuguesa no Brasil e no Império lusitano (DIAS, 2012).
A nova cooperação entre a UNESCO e a FBN tem como finalidade conceber instrumentos específicos de difusão do seu acervo documental junto a instituições educacionais, culturais e científicas do Brasil. Uma das ações para alcançar esses objetivos é a elaboração de documentos contendo recortes temáticos dos manuscritos que fazem parte do Projeto Resgate.
Esses instrumentos temáticos além de propor a difusão da documentação, também possibilitam uma facilidade ao trabalho para pesquisadores de diferentes áreas do conhecimento. André Porto Ancona Lopez define os instrumentos de pesquisa como “ferramentas utilizadas para descrever um arquivo, ou parte dele, tendo a função de orientar a consulta e de determinar com exatidão quais são e onde estão os documentos” (p. 10). Já o Dicionário de terminologia arquivística, define os instrumentos como obra de referência publicada ou não “que identifica, localiza, resume ou transcreve, em diferentes graus e amplitudes, fundos, grupos, séries e peças documentais existentes num arquivo permanente, com a finalidade de controle e de acesso ao acervo” (1996, p. 45).
A consultoria do Edital (Projeto 914BRZ3025 – Edital 04/2021) compreende, na realidade, dois grandes instrumentos temáticos. Um primeiro, referente à Hodologia e, um segundo instrumento sobre Irmandades e ordens religiosas. No trabalho, entretanto, daremos enfoque ao segundo instrumento. Assim, apresentaremos a divisão das unidades de trabalho para a leitura dos documentos principais, os critérios de seleção e, por fim, uma análise da quantidade de verbetes e documentos principais que serão separados para a elaboração do instrumento temático de Irmandades e ordens religiosas.
1.1. Unidades de trabalho
Como já elencamos na introdução, o trabalho está sendo realizado por três consultores. Nesse sentido, para melhor organização, a coordenação do projeto resolveu dividir as séries do Conselho Ultramarino em três grandes Unidades de Trabalho. Assim, resultaram as seguintes unidades para cada consultor: Unidade 1, Hugo Coelho Vieira, região Nordeste, mais catálogo de São Paulo-Mendes Gouveia; Unidade 2, Rafael Afonso Gonçalves, região Norte, Centro-Oeste, mais Conselho Ultramarino Diversos, e os catálogos Bahia-Castro e Almeida e Bahia-Luísa da Fonseca; e, Unidade 3, Jeferson dos Santos Mendes, as capitanias da região Sul e Sudeste, mais o catálogo do Rio de Janeiro elaborado por Castro e Almeida.
Vale ressaltar, que para a organização das unidades de trabalho utilizaram-se duas diretrizes, a da regionalização e a da equidade, onde cada integrante da equipe de consultores recebeu uma quantidade similar de documentos para fazer à leitura. Nesse sentido, a Unidade 3, que ficou sob minha responsabilidade, abrange as capitanias da região Sul e Sudeste da América portuguesa.
Separadas as unidades de trabalho e as respectivas séries, passamos a leitura dos verbetes, na busca de descritores, subdescritores e palavras-chave correspondentes aos verbetes dos instrumentos de pesquisa – Hodologia e Irmandades e ordens religiosas.
1.2. Critérios e descritores
Com a organização da divisão das unidades de trabalho, a partir das diretrizes já descritas, iniciamos a fase de leitura dos verbetes. Os objetivos dessa leitura, para além de ambientar os pesquisadores a utilizarem os catálogos das séries documentais como instrumentos de investigação, tinha também como principal meta a procura de descritores, subdescritores e palavras-chave. A partir desse entendimento, foram criados os critérios para a construção dos instrumentos de pesquisa do recorte temático 1 e do recorte temático 2. Foram elaborados, a partir, primeiro, da leitura dos verbetes dos documentos das séries que compunham cada unidade de trabalho; segundo, da procura dos descritores e subdescritores mais adequados aos recortes temáticos, e por último, da escolha dos verbetes que vão compor os instrumentos de pesquisa 1 e 2.
Assim, buscamos encontrar palavras, expressões, frases, temas que tivessem relação com o primeiro instrumento Hodologia e com Irmandades e ordens religiosas, segundo instrumento.
Para a procura dos termos, palavras e expressões de alguns verbetes que compreendem os instrumentos temáticos foi necessária a leitura dos documentos completos de cada série. Entende-se aqui por documentos completos, os anexos, requerimentos, relatórios, cartas, entre outros. Estes documentos estão depositados no site da Biblioteca Nacional http://resgate.bn.br/docreader/docmulti.aspx?bib=resgate. A leitura exigiu conhecimento de Paleografia e Diplomática, facilitada também pela experiência dos pesquisadores com a documentação do Brasil colonial.
A partir da leitura dos verbetes construímos um pequeno índice para auxiliar na escolha dos documentos que irão compor o catálogo. Segue abaixo um pequeno indículo, com os descritores, subdescritores e palavras-chave de algumas caixas e séries que compõem a Unidade de trabalho 3. Os descritores são variados para cada série. A título de exemplo, segue um indículo da série CU_07 Espírito Santo e CU_71 Paraguai. O primeiro com uma presença acentuada do primeiro instrumento, enquanto o segundo há uma predominância do segundo.
O assunto pode ser verificado no trecho “Quadro 4: CU_007 Espírito Santo”, “Quadro 5: CU_071 Paraguai”, situado na parte de Apêndice deste catálogo.
A partir do indículo acima, apresentaremos dois exemplos de verbetes selecionados. É importante lembrar, que os verbetes foram escolhidos a partir dos critérios que elaboramos para a construção do instrumento de pesquisa, que segundo a nossa escolha, fazem referência as temáticas de Hodologia e Irmandades e ordens religiosas. Com os critérios criados, detalhamos a seguir os tipos de verbetes encontrados que farão parte do instrumento de trabalho 1 e 2. Para melhor compreensão da presença dos descritores, subdescritores e palavras-chave destacamos em negrito o que torna o verbete relevante para ser utilizado em cada temática.
CU_017 Rio de Janeiro
1799, Setembro, 16, Rio de Janeiro
OFÍCIO do alferes das Milícias de Mato Grosso, residente em Campos dos Goitacazes, José Lopes de Oliveira, ao [secretário de estado da Marinha e Ultramar], D. Rodrigo de Sousa Coutinho, encaminhando requerimento [em que solicita a secretaria do governo de Vila Rica; denunciando a derrubada da mata na fazenda São Pedro, Cabo Frio, que foi dos jesuítas e pertence presentemente a índios, sob o comando do sargento-mor de Milícias de Cabo Frio, José Cardoso Ramalho; sobre aldeias indígenas abandonadas, como a de Santo Antônio dos Guarulhos, no rio Paraíba do Sul, defronte da vila de São Salvador de Campos de Goitacazes, ocupadas por foreiros poderosos e ricos].
Anexo: requerimento.
AHU-Rio de Janeiro, cx. 176, doc. 33.
AHU_ACL_CU_017, Cx. 174, D. 12851.
CU_059 Brasil-limites
1753, abril, 3, Colônia do Sacramento
OFÍCIO do [governador da Nova Colônia do Sacramento], Luís Garcia de Bivar, ao [secretário de estado dos Negócios Estrangeiros e Guerra], Sebastião José de Carvalho e Melo, sobre o envio dos 3 ofícios que havia remetido pelo navio espanhol com destino a Cádiz; informa que os geógrafos e astrônomos da 1ª Partida para a Demarcação dos Limites, de ambas as nacionalidades, tem tido dificuldades em executar seus trabalhos ao chegarem em Santa Tecla, devido ao grupo de índios que se armaram, incitados pelos padres da Companhia de Jesus, em oposição à demarcação.
Anexo: 3 ofícios.
AHU-Brasil-Limites, cx. 1, doc. 23.
AHU_ACL_CU_059, Cx. 1, D. 26.
Esta primeira etapa de elaboração dos critérios, possibilitou além da escolha dos descritores temáticos e subdescritores atrelados aos descritores principais, o avanço na separação dos verbetes que farão parte dos instrumentos. Com conteúdos específicos de cada série, foi possível elencar os melhores descritores e subdescritores para o trabalho de levantamento dos verbetes que melhor expressam os recortes temáticos. Passaremos agora a analisar o resultado da separação do segundo instrumento temático.
1.3. Instrumento temático: Irmandades e ordens religiosas
Após a conclusão da leitura e separação dos verbetes apresentaremos alguns resultados e conclusões para o instrumento de Irmandades e ordens religiosas. A principal fonte para os instrumentos temáticos é importante lembrar, são os catálogos dos documentos do Arquivo Histórico Ultramarino. Estas cadeias de papéis, que circulavam do centro para as periferias e vice-versa, contém um número significativo de cartas, requerimento, alvarás, atas sobre Irmandades e ordens religiosas. Estes papéis vão desde pedidos para confirmação de Irmandades, autorização para missionar ou criar conventos, além da administração das aldeias indígenas pelos jesuítas.
Para o instrumento de Irmandades e ordens religiosas, o total computado pelas unidades de trabalho, foi de 5.460. Trinta e três vezes o total de documentos existentes em todas as séries (183.593). Este número pode ser sequencialmente dividido em: Unidade de trabalho 1: 2.594 verbetes; Unidade de trabalho 2: 1.256 verbetes e, Unidade de trabalho 3: 1.610. Percebe-se já em um primeiro olhar que a primeira unidade de trabalho possui um número muito superior as outras duas unidades. Nos quadros abaixo (6-7-8) verificaremos o número de documentos principais para cada unidade e série.
O assunto pode ser verificado no trecho “Quadro 6: Unidade de trabalho 1”, “Quadro 7: Unidades de trabalho 2” e “Quadro 8: Unidade de trabalho 3”, situado na parte de Apêndice deste catálogo.
Em relação ao instrumento de Irmandades e ordens religiosas, a partir do que expomos nos quadros acima, é possível verificar alguns números. Para a primeira unidade de trabalho há o predomínio das séries CU_015 Pernambuco, CU_023-1 São Paulo/Mendes Gouveia e CU_005 Bahia. Para a unidade de trabalho 2, CU_005-01 Bahia-CA, CU_009 Maranhão e CU_13 Pará. No instrumento das Irmandades e ordens religiosas, para a Unidade de trabalho 3, prevalece a série CU_017 Rio de Janeiro, seguida de CU_017-01 Rio de Janeiro-CA e em terceiro CU_011 Minas Gerais.
Ainda, a partir dos quadros, é possível verificar que a maioria dos verbetes concentra-se nas capitanias principais. Em maior quantidade nas séries referentes às capitanias de Pernambuco, Bahia e Rio de Janeiro. Entretanto, proporcionalmente, algumas séries se sobrepõe aos documentos principais existentes nas capitanias principais. Como por exemplo, CU_071 Paraguai, que de 27 documentos, foram separados 19; e, para a unidade de trabalho 1, CU_023-1 São Paulo/Mendes Gouveia, de 5.113 foram separados 378 – superior a CU_005 Bahia que contém no total 19.610 documentos principais.
Nesse sentido, ainda, podemos destacar a importância de fazer um instrumento de pesquisa para facilitar o trabalho dos pesquisadores. Como os índices temáticos, além de importantes instrumentos de investigação, possibilitam maior celeridade ao trabalho. Em suma, os instrumentos de pesquisa temáticos, seguindo uma série de critérios de leitura e observação possibilitam aos historiadores, cientistas sociais, entre outros interessados, a possibilidade de fazer recortes dentro da temática dos índices, além de uma melhor compreensão da totalidade da documentação existente dentro das séries depositadas no Arquivo Histórico Ultramarino, disponíveis no site da FBN, a respeito da temática.
Para finalizar, entendemos que esse instrumento de pesquisa vai auxiliar o pesquisador em suas investigações sobre ordens religiosas, missões jesuíticas, Companhia de Jesus, Irmandades, padres jesuítas, indígenas da América, evacuação dos índios, aldeamentos, colégio dos jesuítas, botica, expulsão, conflitos, índios guaranis, encomenderos, demarcação dos limites, demarcação das fronteiras, formação teológica e descrição da fauna e da flora.
Referências:
BOSCHI, Caio César. Projeto Resgate: História e arquivística (1982-2014). Revista Brasileira de História. São Paulo, v. 38, nº 78, 2018.
DIAS, Érika S. de Almeida Carlos. Informação e memória: o projeto resgate e a administração do Brasil colonial no século XVIII. IRIS. Recife. v. 1. n. 1. p. 43-66, jul./dez. 2012.
DICIONÁRIO de terminologia arquivística. São Paulo: Associação dos Arquivistas Brasileiros (Núcleo Regional de São Paulo); Secretaria de Estado da Cultura, 1996.
LOPEZ, André Porto Ancona. Como descrever documentos de arquivo: elaboração de instrumentos de pesquisa. São Paulo: Arquivo do Estado, Imprensa oficial, 2002.
MARTINS, Ana Canas Delgado. A documentação do Conselho Ultramarino como património arquivístico comum: subsídios à sua história. Revista Brasileira de História. São Paulo, v. 38, nº 78, 2018.
Jeferson dos Santos Mendes - Doutor em História e Cultura do Brasil pela Universidade de Lisboa
Lattes: http://lattes.cnpq.br/3284620192147683
OrcID: https://orcid.org/0000-0002-9536-707X
Contato: mendesjeferson@campus.ul.pt
- 2. Apresentação da equipe
Coordenação
Érika Dias – Professora Doutora pela Universidade Nova de Lisboa, Editora Científica pela Fundação Cesgranrio
Lattes: http://lattes.cnpq.br/1597765272180734
OrcID: https://orcid.org/my-orcid?orcid=0000-0002-5608-646X
Contato: erikasimonedias@gmail.com
Consultores
Hugo Coêlho Vieira – Doutor em História pela Universidade Federal de Pernambuco
Lattes: http://lattes.cnpq.br/4202170533384411
Contato: hugocoelhovieira@gmail.com
Jeferson dos Santos Mendes - Doutor em História e Cultura do Brasil pela Universidade de Lisboa
Lattes: http://lattes.cnpq.br/3284620192147683
OrcID: https://orcid.org/0000-0002-9536-707X
Contato: mendesjeferson@campus.ul.pt
Rafael Afonso Gonçalves – Doutor em História pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”- UNESP
Lattes: http://lattes.cnpq.br/8864002116550819
OrcID: https://orcid.org/0000-0003-4129-8969
Contato: goncalves.hist@gmail.com
Equipe responsável (Edital 04/2021)