Versão para profissionais de saúde
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Prevenção e Fatores de Risco
- Quem fuma cigarro ou utiliza outros produtos derivados do tabaco, como cigarro de palha, de Bali, de cravo ou kreteks, fumo de rolo, tabaco mascado, rapé, charutos, cachimbos e narguilé, dentre outros, tem risco muito maior de desenvolver câncer de boca e de faringe do que não fumantes. Quanto maior o número de cigarros fumados, maior o risco de câncer.
- Consumo de bebidas alcoólicas
- Mascar betel (mistura de semente de areca – um gênero de palmeira –, folhas de Piper betle –um tipo de pimenteira – e, geralmente, tabaco. Há outras variações desta mistura). A semente de areca libera substâncias altamente cancerígenas
- Infecção pelo papilomavírus humano (HPV) tipo 16
- Exposição à radiação solar (para o câncer de lábio)
- Excesso de gordura corporal (sobrepeso e obesidade) (Segundo o Fundo Mundial de Pesquisa em Câncer e o Instituto Americano de Pesquisa em Câncer - WCRF/AICR, na sigla na língua inglesa)
- Gênero e Idade – a doença é mais frequente em homens brancos acima de 40 anos
- Imunosupressão
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Exposição a agentes carcinogênicos no contexto do trabalho.
O tabagismo e o etilismo são os principais fatores de risco para os cânceres de lábio e cavidade oral. Evidências demonstram haver sinergismo entre tabagismo e etilismo, o que potencializa o risco. recomenda-se não usar produtos de tabaco, fumado ou não fumado. Mas, se já usa, parar de fumar ou de usar qualquer produto de tabaco reduz o risco de desenvolvimento do câncer de boca.
O Sistema Único de Saúde oferece tratamento gratuito para quem deseja parar de fumar.
Em relação a bebidas alcoólicas, evidências mostram que o acetaldeído, o principal e mais tóxico metabólito do álcool, interrompe a síntese e o reparo do DNA e, portanto, pode favorecer a carcinogênese. Além disso, maior exposição ao etanol também induz o estresse oxidativo por meio do aumento da produção de oxigênio com potencial reativo e genotóxico. Sugere-se, ainda, que o álcool possa funcionar como um solvente, favorecendo a penetração celular de carcinogénos dietéticos ou ambientais (por exemplo, tabaco) ou interferindo nos mecanismos de reparo do DNA. Pessoas que consomem bebidas alcoólicas em altas quantidades também podem ter dietas carentes de nutrientes essenciais, como o folato, tornando os tecidos-alvo mais suscetíveis aos efeitos carcinogênicos do álcool.
O excesso de gordura corporal (sobrepeso e obesidade, definido pelo IMC, circunferência de cintura e relação cintura/quadril elevados, aumenta o risco de desenvolver câncer de boca. Os mecanismos específicos para descrever essa relação ainda não estão esclarecidos. No entanto, o excesso de gordura corporal está associado a alterações metabólicas e endócrinas, como hiperinsulinemia e níveis elevados de estrogênio. A insulina e o estrogênio estimulam a multiplicação celular e inibem a apoptose, levando à proliferação celular aumentada. Além disso, a obesidade também estimula a resposta inflamatória, favorecendo a carcinogênese.
O câncer de cavidade oral também está associado a exposições ocupacionais classificadas pela IARC como carcinogênicas para humanos, destacando-se a radiação solar, relevante especialmente para trabalhadores ao ar livre, e a exposição a betumes e suas emissões, comuns em atividades de pavimentação, asfaltamento, impermeabilização e coberturas. Profissionais envolvidos nesse tipo de atividade compõem grupos de risco reconhecidos. Outro agente importante é a exposição ocupacional a radioiodos, incluindo o iodo-131, relevante em setores como a medicina nuclear e serviços de radioproteção. A exposição ao papilomavírus humano (HPV) tipo 16 e/ou 18 em atividades de trabalho também deve ser considerada.
A utilização de equipamentos de proteção individual (EPI) adequados à realização de atividades de trabalho nas quais haja exposição a agentes relacionados ao desenvolvimento desse tipo de câncer, assim como a identificação precoce dessas exposições, pode contribuir para a redução dos riscos de desenvolvimento da doença.
REFERÊNCIAS:
IARC. List of classifications by cancer sites with sufficient or limited evidence in humans, IARC Monographs Volumes 1–140a. International Agency for Research on Cancer, 2025. Disponível em: < https://monographs.iarc.who.int/wp-content/uploads/2019/07/Classifications_by_cancer_site.pdf>. Acesso em: 21 nov. 2025
OTERO, Ubirani Barros et al. Câncer relacionado ao trabalho: relato de experiência do Instituto Nacional do Câncer na atualização da Lista de Doenças Relacionadas aoTrabalho do Ministério da Saúde no Brasil. Revista Brasileira de Saúde Ocupacional, [s. l.], vol. 50, p. edoc1, 2025.
Ministério da Saúde (BR). Portaria GM/MS nº 5.674, de 1º de novembro de 2024.Altera a Portaria de Consolidação GM/MS nº 5, de 28 de setembro de 2017, e atualiza a Lista de Doenças Relacionadas ao Trabalho (LDRT). Diário Oficial União. 5 nov 2024.
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Detecção precoce
A detecção precoce do câncer é uma estratégia utilizada para encontrar um tumor numa fase inicial ou subclínica e, assim, aumentar a chance de tratamento bem-sucedido.
A detecção precoce baseia-se em duas estratégias: diagnóstico precoce, em que busca-se identificar o câncer em estágio inicial em pessoas que apresentam sinais e sintomas suspeitos por meio de investigação com exames clínicos, laboratoriais, radiológicos ou endoscópicos; e rastreamento, estratégia na qual pessoas sem sinais ou sintomas, mas pertencentes a grupos com maior risco de ter a doença, são examinadas periodicamente com objetivo de detectar o câncer estágio inicial ou lesões pré-cancerígenas (INCA, 2021; 2022).
Rastreamento
Atualmente não há recomendação para o rastreamento do câncer de boca e orofaringe como estratégia de detecção precoce, pois as evidências científicas atuais não são suficientes para avaliar os riscos e os benefícios do rastreamento em pessoas assintomáticas (IARC, 2023; USTaskForce, 2023).
De acordo com a IARC (2023), o rastreamento em pessoas de alto risco pode reduzir a mortalidade por câncer de boca e orofaringe mas não foi possível estabelecer impacto do rastreamento na população geral, com base nos estudos disponíveis.
Diagnóstico precoce
O diagnóstico precoce do câncer de boca é a estratégia recomendada para a detecção precoce desse câncer. Deve-se realizar a investigação oportuna dos seguintes sinais e sintomas suspeitos na boca e orofaringe:
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Ulcerações persistentes por mais de 15 dias.
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Placas vermelhas ou esbranquiçadas na língua, nas gengivas, no palato e na mucosa jugal que não decorrem de outra doença ou causa conhecida.
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Nódulos no pescoço.
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Rouquidão persistente.
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Dificuldade de mastigação, deglutição ou fala.
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Assimetria facial.
Essas alterações suspeitas na cavidade oral devem ser investigadas e a confirmação diagnóstica realizada por meio de biópsia. Quando o câncer é confirmado, deve-se encaminhar o paciente para tratamento oncológico.
Profissionais de saúde devem conhecer e estar atentos aos principais fatores de risco e aos sinais e sintomas do câncer de lábio e cavidade oral, de forma a identificar precocemente alterações e possibilitar o diagnóstico e tratamento em tempo oportuno.
Referências
IARC Working Group on the Evaluation of Cancer-Preventive Interventions. Oral Cancer Prevention. IARC Handbooks of Cancer Prevention vol. 19. Lyon, France, 2023. Disponível em: https://publications.iarc.who.int/Book-And-Report-Series/Iarc-Handbooks-Of-Cancer-Prevention/Oral-Cancer-Prevention-2023 Acesso em: 15 jul 2025.
INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER JOSÉ ALENCAR GOMES DA SILVA. Detecção precoce do câncer. Rio de Janeiro: INCA, 2021. Disponível em: https://www.inca.gov.br/publicacoes/livros/deteccao-precoce-do-cancer Acesso em: 07 jul 2025.
INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER JOSÉ ALENCAR GOMES DA SILVA. Diagnóstico precoce do câncer de boca / Instituto Nacional de Câncer. – Rio de Janeiro : INCA, 2022. Disponível em: https://www.inca.gov.br/publicacoes/livros/diagnostico-precoce-do-cancer-de-boca Acesso em: 07 jul 2025.
USTaskForce. Literature Surveillance Report. Oral Cancer: Screening. 2023. Disponível em: https://www.uspreventiveservicestaskforce.org/uspstf/document/literature-surveillance-report/oral-cancer-screening Acesso em: 15 jul 2025.
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Sinais e sintomas
Dor, irritação, nodulação ou manchas (eritroplasia ou leucoplasia), odinofagia, disfagia, disartria, disfonia, fixação da língua e trismo, otalgia reflexa, dispneia, adenomegalia e sangramento.
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Diagnóstico
O diagnóstico do câncer de cavidade oral normalmente pode ser feito com o exame clínico, mas a confirmação depende da biópsia. Esse procedimento, na grande maioria das vezes, pode ser feito de forma ambulatorial, com anestesia local, por um profissional treinado.
A biópsia em nível ambulatorial é feita com algumas pinças de biópsia de saca-bocado. O material coletado é enviado para análise histopatológica. Outras biópsias podem ser feitas com pequenas incisões em “cunha”, normalmente em alguns centros de tratamento odontológico. A punção por agulha fina é outro recurso que pode ser utilizado, seja das próprias lesões da cavidade oral ou de alguma massa cervical que o paciente apresente.
Exames de imagem, como a tomografia computadorizada, auxiliam no diagnóstico, e, principalmente, ajudam a avaliar a extensão da tumoração. O exame clínico associado à biópsia, com o estudo da lesão por tomografia computadorizada (nos casos indicados) permitem ao cirurgião determinar a extensão da tumoração e definir o tratamento adequado. As lesões muito iniciais podem ser avaliadas sem exame de imagem em um primeiro momento. O diagnóstico inicial permite a instituição do tratamento com melhor resultado funcional, visto que os tumores diagnosticados em estágios mais avançados vão implicar em tratamentos mais complexos, com maior possibilidade de sequelas.
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Classificação e Estadiamento
Tumor Primário
T1- Tumor ≤ 2 cm com PI (profundidade da invasão, não espessura do tumor) ≤ 5 mm
T2- Tumor ≤ 2 cm com PI > 5 mm OU tumor > 2 cm e ≤ 4 cm com PI ≤ 10 mm
T3- Tumor > 2 cm e ≤ 4 cm com PI > 10 mm OU tumor > 4 cm com PI ≤ 10 mm
T4a Lábio: o tumor invade o osso cortical ou envolve o nervo alveolar inferior, assoalho da boca ou pele da face (p. ex., queixo ou nariz)
Cavidade oral: tumor > 4 cm com PI > 10 mm OU tumor que invade apenas estruturas adjacentes (p. ex., ao longo do osso cortical da mandíbula ou maxila, ou que envolve o seio maxilar ou a pele da face)
NOTA: A erosão superficial do osso/alvéolo dentário (isolado) por um tumor gengival primário não é suficiente para classificar um tumor como T4.
T4b Doença local muito avançada
O tumor invade o espaço mastigatório, placas pterigoides ou a base do crânio e/ou envolve a artéria carótida interna
Linfonodos Loco Regionais
N1- Metástases em um único linfonodo ipsilateral, ≤ 3 cm e sem extensão extranodal
N2- Metástases em um único linfonodo ipsilateral > 3 cm, mas ≤ 6 cm e sem extensão extranodal; OU em múltiplos nódulos ipsilaterais ≤ 6 cm e sem extensão extranodal; OU em linfonodos bilaterais ou contralaterais ≤ 6 cm e sem extensão extranodal
N3- Metástase em um linfonodo > 6 cm e sem extensão extranodal; OU em quaisquer linfonodos e extensão extranodal
Metástase á distância
M0- Nenhuma metástase a distância
M1- Metástase à distância
ESTADIAMENTO
Estágio I. T0, T1 ou T2, N0 ou N1, M0.
Estágio II. T0, T1 ou T2, N2, M0; T3 ou T4, N0 ou N1, M0.
Estágio III. T3 ou T4, N2, M0.
Estágio IV. Qualquer T, qualquer N, M1.
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Tratamento
O tratamento do câncer de cavidade oral, na grande maioria das vezes, é cirúrgico, tanto nas lesões menores, com cirurgias mais simples, com menor repercussão funcional; quanto para os tumores maiores, que vão implicar em ressecções mais complexas e com sequelas funcionais. O cirurgião de Cabeça e Pescoço é o profissional que irá avaliar o estágio da doença; e, mediante essa avaliação, associada à realização de exames complementares, determinará o tratamento mais indicado. A radioterapia e a quimioterapia são indicadas quando a cirurgia não é possível ou quando o tratamento cirúrgico deixaria sequelas funcionais tão importantes que seriam muito complicadas para a reabilitação funcional e a qualidade de vida do paciente.
A cirurgia normalmente consiste na retirada de uma ou mais área da cavidade oral associada à retirada dos linfonodos do pescoço (esvaziamento cervical) e com algum tipo de reconstrução, quando necessário. Nas cirurgias maiores, pode ser necessária a ressecção de segmentos ósseos. Essas ressecções devem ser programadas procurando a melhor reconstrução no primeiro momento, para obter o melhor resultado funcional. Em alguns casos, porém, podem ser necessários outros procedimentos em um segundo tempo para restabelecer a função da área ressecada.
Nas lesões mais simples, muitas vezes é suficiente apenas a retirada da lesão com fechamento primário. Além do tratamento cirúrgico, nos casos mais complexos, é necessária a realização de radioterapia complementar para obter melhor resultado curativo. Em todas as etapas do tratamento é importante um aspecto interdisciplinar dos profissionais de saúde, visando prevenir complicações e sequelas. Esse aspecto deve ser feito desde antes da instituição do tratamento (por exemplo, a higienização dos elementos dentários antes do tratamento radioterápico), durante o tratamento em si, pois há modificações importantes da mastigação, da respiração, da fala - algumas temporárias; outras não, e pós-tratamento, buscando otimizar o resultado funcional e minimizar as sequelas.
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Regiões anatômicas e prognósticos
A cavidade bucal está dividida nas seguintes áreas:
- Lábios;
- Dois terços anteriores da língua;
- Mucosa jugal;
- Assoalho da boca;
- Gengiva inferior;
- Gengiva superior;
- Área retromolar;
- Palato duro.
Todas as áreas apresentam drenagem linfática para o pescoço, sendo que a primeira estação de drenagem inclui os linfonodos júgulo-digástricos, júgulo-omo-hioideos, submandibulares e submentonianos (ou seja, níveis I, II e III). Linfonodos do segundo escalão de drenagem são os parotídeos, os jugulares e os cervicais posteriores (superiores e inferiores).
A maior parte dos tumores malignos da cavidade bucal é constituída pelo carcinoma epidermoide, que se classifica em: bem diferenciado, moderadamente diferenciado e pouco diferenciado. Este tumor ocorre em aproximadamente 95% dos casos.
Embora apresentem menor incidência, deve-se citar outros tipos de tumores que podem ocorrer na cavidade oral, tais como: os tumores salivares (das glândulas salivares menores e da sublingual), os sarcomas (os de origem vascular, os musculares e os ósseos) e o melanoma de mucosa.
O prognóstico de pacientes com câncer de cavidade oral depende da área da cavidade oral comprometida e do estadiamento do sistema TNM (Classificação de Tumores Malignos). As lesões situadas nas porções mais anteriores e as lesões iniciais (I-II) têm prognóstico melhor em comparação às lesões avançadas (III - IV).
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Acompanhamento pós-tratamento
É importante manter o acompanhamento após tratamento com consultas de rotina com equipe multidisciplinar e exames de imagem quando necessários, principalmente nos primeiros 5 anos.
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Prevenção e Fatores de Risco