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Pesquisadoras do Ibict são premiadas por melhor trabalho de comunicação científica na 16ª ConfOA
A pesquisa “Soberania e Governança de Dados de Povos Indígenas em tempos de Inteligência Artificial Generativa” foi reconhecida como o melhor trabalho de comunicação científica na 16ª Conferência Lusófona de Ciência Aberta (ConfOA), que ocorreu de 8 a 11 de setembro em Goiânia.
O trabalho é de autoria de Lais Barbudo Carrasco (MIUN- Suécia), Emanuelle Torino (UTFPR e Ibict), Caio Saraiva Coneglian (Unimar e Unesp) e Silvana Aparecida Borsetti Gregorio Vidotti (Unesp e Ibict).
Durante a apresentação do trabalho, no último dia 10, Emanuelle Torino e Silvana Vidotti, ambas pesquisadoras do Ibict, destacaram a importância de discutir a soberania e governança de dados em face do avanço da inteligência artificial.
"O trabalho aborda a soberania e governança de dados de povos indígenas, promovendo uma reflexão crítica sobre os desafios éticos e legais inerentes ao uso de dados, especialmente no contexto da crescente inteligência artificial", explicou Emanuelle Torino.
Segundo as pesquisadoras, a inteligência artificial, apesar de suas inúmeras oportunidades, apresenta riscos significativos. A expansão do compartilhamento de dados e objetos digitais acelera o acesso e uso desses recursos, o que demanda o aprofundamento de discussões éticas sobre a governança e a soberania de dados e do patrimônio cultural dos povos indígenas.
Entre os riscos levantados, a IA generativa, por exemplo, consome grandes volumes de dados de forma automática e, muitas vezes, sem transparência, o que levanta questões sobre propriedade intelectual e consentimento para o treinamento de algoritmos. Há também o risco de a IA "alucinar", gerando informações sem a devida atribuição de fontes, o que pode levar à exploração cultural, reprodução de estereótipos e distorção de identidades indígenas ao usar narrativas e saberes tradicionais indevidamente.
Além disso, a ampliação da capacidade de processamento e armazenamento de dados por sistemas de IA gera riscos significativos à segurança da informação e à proteção de dados sensíveis. No Brasil, a ausência de uma regulamentação legal para o desenvolvimento da IA agrava esses desafios, tornando o cenário dependente do compromisso ético das grandes corporações tecnológicas, que frequentemente operam em contextos comerciais. A falta de regulamentação específica para IA no Brasil agrava esses desafios, tornando o cenário dependente do compromisso ético das empresas de tecnologia.
Para alcançar uma IA verdadeiramente inclusiva, as pesquisadoras avaliam que é necessária a colaboração, transparência e respeito à diversidade de saberes, assegurando a compatibilidade entre inovação tecnológica, direitos humanos e justiça social. Para enfrentar esses desafios, são propostos caminhos para a soberania e a governança de dados indígenas em três abordagens fundamentais:Princípios FAIR, Princípios CARE e as Etiquetas Local Contexts (LC).
Os Princípios FAIR são um conjunto de medidas para garantir que os dados sejam localizáveis, acessíveis, interoperáveis e reutilizáveis. Os Princípios CARE são um conjunto de princípios e subprincípios para assegurar o tratamento equitativo na coleta, uso, recuperação e armazenamento de dados de povos indígenas. Já as etiquetas Local Contexts (LC) possuem uma série de etiquetas de Conhecimento Tradicional e Biocultural que devem ser utilizadas na representação, acesso e uso de dados e objetos digitais de povos indígenas.
“Essas etiquetas permitem que as próprias comunidades determinem as regras de uso, acesso e interpretação de seus conhecimentos tradicionais e bioculturais”, diz Emanuelle Torino.
O trabalho conclui que ampliar o acesso e a circulação do saber não é apenas uma questão técnica, mas envolve escolhas éticas, políticas e culturais profundas, por meio de práticas que promovam a decolonização, equidade e preservação dos saberes tradicionais para fortalecer a autodeterminação dessas comunidades, buscando uma ciência verdadeiramente inclusiva e transformadora.
Emanuelle Torino destacou ainda que ela e seus colegas não possuem lugar de fala neste tema, pois nenhum deles tem origem indígena. No entanto, como pesquisadores, atuam para fortalecer a ideia de soberania e governança de dados de povos indígenas e outras comunidades minoritárias e ou em situação de vulnerabilidade.
A pesquisadora também pontua uma preocupação histórica, mencionando que a população indígena frequentemente relata que pesquisadores (frequentemente não-indígenas) foram às comunidades, coletaram dados e não retornaram mais, o que desrespeita a soberania e a governança dessas comunidades, que são garantidas por lei. Diante disso, ela sugere que é fundamental que os pesquisadores se coloquem "a serviço das comunidades” e não de seus próprios interesses, promovendo uma atuação em campo ética e colaborativa.