MAST celebra centenário da visita de Einstein ao Brasil

Em 9 de maio, o Museu de Astronomia e Ciências Afins (MAST) comemora 100 anos da visita de Albert Einstein ao Rio de Janeiro, quando à época visitou as instalações do Observatório Nacional, onde hoje funciona o museu, em São Cristóvão. Inicialmente, Einstein desembarcou no Rio de Janeiro em 21 de março de 1925, a caminho da Universidade de Buenos Aires, que o havia convidado para um ciclo de palestras. Ele passou um dia no Rio de Janeiro e retornou para sua temporada mais longa no Brasil em 4 de maio de 1925. Durante sua visita à cidade, o cientista visitou o Observatório Nacional e outras instituições científicas, e fez palestras no Clube de Engenharia, na Escola Politécnica e na Academia Brasileira de Ciências.
Mas a ligação de Einstein com o Brasil havia começado seis anos antes, em 1919, quando o cientista teve comprovada parte dos conceitos da Teoria da Relatividade, na cidade de Sobral, no Ceará, e na ilha de Príncipe, no Golfo da Guiné. Três comissões – britânica, norte-americana e brasileira – foram a Sobral observar o eclipse solar e estudar diferentes questões. Os americanos estavam interessados na influência do Sol no magnetismo terrestre. A comissão brasileira queria analisar a borda do Sol. A delegação britânica focou na comprovação da alteração do espaço pelos corpos de grande massa, uma das características da Teoria da Relatividade. Os instrumentos da delegação brasileira estão hoje no acervo do MAST e o local de observação, em Sobral, abriga o Museu do Eclipse.
“Existe correspondência de Henrique Morize, então diretor do Observatório Nacional, com o coordenador da comissão inglesa, dando suporte sobre qual o melhor ponto de observação no Brasil e como chegar lá. Na visita à instituição, Einstein pôde conhecer pessoas que haviam participado da observação do eclipse e trabalhado junto com a comissão inglesa. A nova sede do Observatório em São Cristóvão havia sido inaugurada recentemente. Einstein visitou os aparelhos de sismologia e vários instrumentos de observação astronômica”, diz o historiador da ciência Alfredo Tolmasquim, pesquisador titular do MAST.
Ele conta que Einstein fez os primeiros trabalhos sobre a Teoria da Relatividade em 1905, mas foi apenas após o experimento do Ceará que o cientista se tornou a maior celebridade da ciência. O resultado foi anunciado pelos pesquisadores ingleses em uma sessão solene da Academia de Ciências e da Academia de Astronomia de Londres e noticiado como de grande importância para a ciência, primeiramente no jornal The Times e depois pela imprensa de todo o mundo.
“Einstein não esteve em Sobral, na Ilha de Príncipe e nem em Londres, mas estava ansioso pelos resultados, que ele tinha certeza de que seriam satisfatórios. A imprensa noticiou o resultado do experimento com grande alarde. E, com a repercussão, o cientista acordou muito famoso no dia seguinte”, diz Tolmasquim. Ao se tornar conhecido globalmente, o físico alemão começou a viajar pelo mundo para divulgar suas ideias científicas, receber homenagens e defender o pacifismo e o sionismo.
Tolmasquim observa que, no início do Século 20, Einstein publicou cinco artigos muito importantes; um deles lhe conferiu o prêmio Nobel. Mas era uma atividade restrita ao meio acadêmico, com uma repercussão interna. Aos poucos, o cientista foi subindo na carreira acadêmica, tendo sido convidado pela Politécnica de Zurich e outras universidades, até que, em 1914, assumiu o posto de professor titular da Universidade de Berlim, o topo da carreira, sem ter a obrigação de dar aulas.
“Einstein publicou a Teoria da Relatividade Restrita em 1905 e a Teoria da Relatividade Geral em 1916, prevendo que os corpos de grande massa deformam o espaço em torno deles. O espaço não seria homogêneo, e sim moldável. Ele calculou qual seria a deformação provocada pelo Sol, verificando que a alteração na órbita de Mercúrio, planeta mais próximo ao Sol, coincidia com o valor da deformação do Sol no espaço. O cientista foi além afirmando que a deformação do espaço também causava alteração na trajetória da luz. Isso só poderia ser comprovado durante um eclipse. Após algumas tentativas frustradas – por falta de condições meteorológicas e pela Primeira Guerra Mundial –, a teoria pôde ser comprovada no eclipse de Sobral, no Ceará, o primeiro após o fim da guerra”, explica Tolmasquim.
A Teoria da Relatividade de Einstein, especialmente a Teoria da Relatividade Geral, é um pilar da física moderna. Ela descreve a gravidade como uma curvatura do espaço-tempo, o que tem sido confirmado por diversas observações e experimentos. Houve muita repercussão do público o fato do tempo ser relativo, mas, para Einstein, mais importante era a descoberta de que a velocidade da luz é uma constante, a relatividade do tempo era apenas uma consequência disso.
Tolmasquim diz que uma aplicação prática da teoria nos dias atuais pode ser entendida por meio de aplicativos como o Waze, baseado na navegação por GPS e que contém informações de usuários e detalhes sobre rotas, dependendo da localização do dispositivo portátil na rede. “Como há a deformação do espaço pelos corpos de grande massa, se não houvesse a correção em função da teoria da relatividade, nossa posição apareceria deslocada, e o Uber iria buscar a pessoa em outro local. Outro exemplo é uma nave espacial que, tentando chegar à Lua, poderia passar ao largo”, explica Tolmasquim.
No Rio de Janeiro, Einstein também participou de atividades sociais como um grande evento para a comunidade judaica e um encontro com membros da comunidade alemã. O cientista era muito assediado pela imprensa, e isso o incomodava, sobretudo na viagem à Argentina. Ele se ressentia do fato de que muitos tentavam usar seu nome para validar coisas que ele não havia dito e precisava desmentir o tempo todo.
“Para Einstein, a viagem não teve um grande significado científico, mas teve oportunidade de interagir com cientistas da América do Sul. Ele ressaltou a importância dos cientistas estarem acima das divergências geopolíticas e ficou satisfeito com o impacto de sua presença nas comunidades judaicas locais. Ele também tinha um interesse quase antropológico pelas diferentes culturas e costumes. Mas, por outro lado, sentiu que foi uma perda de tempo e decidiu que não faria mais viagens de longa distância que não tivessem um objetivo estritamente científico. Na viagem à América do Sul, ele encontrou cientistas interessados na Teoria da Relatividade, mas não que estivessem realizando pesquisas em temas próximos”, analisa Tolmasquim.
Como registro da viagem, Tolmasquim e o físico Ildeu de Castro Moreira, conhecido pelas suas pesquisas sobre popularização da ciência no Brasil, foram em busca do manuscrito que Einstein escreveu para sua palestra na Academia Brasileira de Ciência, e traduzido por Roberto Marinho de Azevedo para ser publicado na Revista da Academia. “Encontrei o documento com Jorge Veiga, um familiar de Getúlio das Neves, que foi uma das pessoas que recebeu Einstein. Fui a sua casa, ele tirou uma foto em tamanho original e me entregou. Pouco depois, Veiga faleceu. O documento ficou perdido durante um tempo e hoje está em posse de seu filho. Eu tenho essa cópia”, conta Tolmasquim.

- Frente e verso do cartão postal escrita por Einstein na passagem pelo Rio de Janeiro

