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Parceria inédita pode levar reatores nucleares flutuantes às plataformas de petróleo brasileiras
O Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN/CNEN) firmou uma parceria inédita com a Petrobras para avaliar a viabilidade do uso de reatores nucleares modulares pequenos (SMRs) flutuantes em plataformas marítimas de petróleo. A iniciativa, assinada em novembro de 2024, é pioneira no Brasil e busca reduzir as emissões de gases de efeito estufa na indústria offshore, fazendo parte do planejamento da companhia para a neutralidade das emissões operacionais até o ano de 2050. Atualmente, as plataformas utilizam a queima de gás para gerar sua própria energia.
Os SMRs têm ganhado espaço como alternativa para a geração de energia entre 20 MW e 300 MW, com maior segurança operacional e sem emissão de CO₂. Com estrutura modular, podem ser produzidos em série e instalados com mais agilidade. O tamanho reduzido facilita o transporte e o funcionamento é garantido mesmo sem intervenção humana ou fonte externa de energia. Por operarem de forma independente, são considerados viáveis para locais de difícil acesso, como plataformas no alto-mar.
O projeto está sendo conduzido pelo Centro de Engenharia Nuclear (CEENG) do IPEN, sob coordenação da Dra. Maria Alice Morato Ribeiro, e prevê uma análise técnica e regulatória completa sobre o uso de SMRs em plataformas offshore. A iniciativa envolve o mapeamento dos reatores em desenvolvimento no mundo, a avaliação da compatibilidade com as condições operacionais das plataformas brasileiras, além de estudos sobre segurança, licenciamento (nuclear, ambiental e marítimo), viabilidade econômica e encerramento seguro das atividades do reator ao fim de sua vida útil, processo conhecido como descomissionamento. Também será analisada a responsabilidade pela operação e propriedade dos reatores, culminando na especificação do modelo mais adequado para uso no mar. “A gente não vai construir protótipo. Vamos pegar os projetos existentes e ver como adaptá-los à realidade da Petrobras. Ainda não sabem qual reator adquirir nem como especificá-lo. Caberá a nós realizar esse estudo completo”, afirma Maria Alice.
Existem quatro tipos principais de usinas nucleares oceânicas: flutuantes, assentadas, fundeadas e submersas. O projeto em parceria com a Petrobras foca nas usinas nucleares flutuantes, que podem ser instaladas em embarcações ancoradas próximas às plataformas de petróleo. Além das plataformas, essas instalações são vistas como alternativas viáveis para regiões litorâneas remotas, para aplicações como a dessalinização da água do mar. A equipe do IPEN vai analisar os principais projetos de SMRs em desenvolvimento no mundo para a aplicação offshore: o ACPR50S, ACP100S e ACP25S, todos baseados na tecnologia de reatores de água pressurizada (PWR); o BANDI-60S, uma versão adaptada de reator PWR; o KLT-40S, com projeto derivado de reatores usados em navios quebra-gelo; e o CMSR, que utiliza tecnologia de reator a sal fundido (MSR). “O SMR com aplicação float é uma das soluções mais promissoras atualmente. Está todo mundo atrás disso, principalmente as empresas de petróleo”, destaca a coordenadora do projeto.
A parceria com a Petrobras marca um avanço estratégico para o Brasil na corrida global pelos reatores nucleares modulares pequenos. O País ainda não possui nenhum SMR em operação e o projeto coordenado pelo IPEN representa uma oportunidade inédita de acumular conhecimento técnico, estabelecer contato direto com fabricantes internacionais e preparar o terreno para futuras aplicações, inclusive fora do setor de petróleo, como em data centers e grandes empreendimentos de alto consumo energético.
“É muito importante que a gente comece a estudar SMR com quem sabe, porque, no futuro, vamos ter uma maior capacidade de trabalhar com essa tecnologia”, ressalta Maria Alice. A pesquisadora destaca que o contrato prevê inclusive a possibilidade de geração de patentes, caso surjam inovações durante as análises técnicas. Com duração de 36 meses, o estudo coloca o Brasil entre os pioneiros do setor, já que ainda não há nenhum SMR flutuante em operação no mundo. O primeiro, desenvolvido na China, está previsto apenas para 2026 ou 2027. “Estamos estudando o que ainda não existe”, resume a pesquisadora.
Emanuel Galdino
Bolsista BGE-DA/IPEN-CNEN
