Metodologia
As coletas serão realizadas em três componentes biogeográficos amazônicos: norte amazônico (N Am), sudoeste amazônico (SW Am) e sudeste amazônico (SE Am) nas seguintes localidades: Estação Experimental de Silvicultura Tropical, 60 km ao norte de Manaus (N Am); município de Novo Airão, APA Rio Negro, 250 km a oeste de Manaus (SW Am) e município de Careiro Castanho, Parcela do PPBio, 100 km ao sul de Manaus (SE Am).
Os insetos serão coletados com armadilhas de interceptação de voo (Malaise) ao nível do solo (armadilha Shannon) e em diferentes estratos da floresta; coletas com armadilhas suspensas para grupos coprófilos; coletas com funil de Berlese para serrapilheira do solo e do dossel; varredura com rede entomológica; coletas adicionais com armadilhas Malaise pequenas junto a riachos; coletas com liberação de CO2 para grupos hematófagos; coletas com armadilhas luminosas utilizando diferentes comprimentos de onda; coletas com armadilha de emergência; coletas manuais em troncos em decomposição; rapel para alcançar bromélias, orquídeas, samambaias epífitas e serrapilheira acumulada na copa das árvores.
As armadilhas para o dossel serão suspensas e sustentadas por cordas apoiadas em árvores emergentes. As amostras serão coletadas em álcool comercial (96º) a cada duas semanas durante 14 meses consecutivos ou de acordo com a necessidade de coletas mais próximas, conforme a armadilha utilizada.
Para as análises estatísticas as curvas de acumulação, rarefação, estimadores de riqueza, e a estimativa do significado das diferenças encontradas entre níveis na floresta e entre amostras sazonais vão utilizar os algoritmos disponíveis em R.
Por causa da envergadura taxonômica do projeto, eles podem ser aplicados ao conjunto completo de dados (com estimativas para insetos como um todo), mas também para cada ordem em particular (e, quando houver interesse, para cada família em particular). Isso é necessário devido as diferenças de biologia entre os grupos (e, portanto, de sazonalidade) e por causa da diferença na proporção de espécies pouco comuns e raras.
Curvas de rarefação serão feitas a partir de 28 réplicas temporais de coleta (14 meses com amostras coletadas a cada 15 dias) de cada um dos cinco níveis do estrato vertical. Dentre todas as amostras, oito delas, coletadas em intervalos de 60 dias, terão todo o material sequenciado. As oito réplicas temporais (sete réplicas ao longo do ano e uma réplica de sobreposição com o ano anterior) resolvem o problema de uso de pseudoréplicas e devem permitir robustez suficiente nas análises estatísticas.
As amostras quinzenais serão processadas nos laboratórios do INPA e as amostras para sequenciamento, também em laboratórios associados (UFRJ e FFCLRP). Para as amostras selecionadas todos os exemplares serão individualizados em tubos separados para sequenciamento; seguido da identificação do material sequenciado em ordens; encaminhamento do material para os coordenadores de cada ordem; identificação do material sequenciado no nível de família pelos coordenadores de cada ordem; encaminhamento do material de cada família para especialistas para identificação do gênero (e espécies, quando possível) para publicações taxonômicas relacionadas a essas famílias (no caso de famílias grandes, com mais de um laboratório envolvido); retorno da informação de identificação genérica/específica para a equipe central para construção das análises gerais.
Este projeto utiliza uma abordagem alternativa de triagem, a triagem reversa (reverse workflow)(Wang et al. 2018). Passo (1), todos os exemplares das grandes amostras selecionadas são sequenciados para o COI (DNA barcode) usando protocolos de extração simplificada e sequenciamento com MinION, com um dano mínimo ou nenhum para os espécimes; (2) com os dados de barcode, os exemplares são fisicamente reunidos em unidades taxonômicas (MOTUs), que, na maioria dos casos, correspondem a espécies; (3) a identificação dos grupos maiores (ordens) e menores (famílias) de exemplares individualizados e já sequenciados, com distribuição aos especialistas.
Com os exemplares já reunidos em clusters (espécies), a identificação de um único exemplar do cluster automaticamente implica na identificação, às vezes, de dezenas ou centenas de exemplares. Isso eliminará a etapa laboriosa, demorada e cara de reconhecimento individual dos exemplares em ordens e depois em famílias.
Isso faz com que amplos levantamentos de biodiversidade se tornem um processo extremamente viável, com gigantesca redução de tempo, custos e erros. O tempo dos pesquisadores vai ser dedicado à análise e à preparação dos trabalhos, não ao processamento do material.
A delimitação das espécies será realizada inicialmente com base no sequenciamento do COI (barcode) de todos os exemplares coletados (Yeo et al., 2021). Um total de 96 espécimes serão colocados em solução de extração por aproximadamente 17 minutos e o DNA será obtido através de um termociclador por meio de duas etapas de aquecimento. Após a neutralização, > 20 ul de um template estará disponível para amplificação do COI. Usando HotSHOT, o processo de purificação de DNA não é necessário.
A amplificação por PCR de cada amostra extraída será realizada com o seguinte par de primers mlCO1intF: 5'- GGWACWGGWTGAACWGTWTAYCCYCC-3' (Leray et al. 2013: DOI: 10.1186/1742-9994-10-34) e jgHCO2198: 5'- TANACYTCNGGRTGNCCRAARAAYCA-3' (Geller et al. 2013; DOI: 10.1111/1755-0998.12138). Esses primers são marcados na extremidade 5' com marcadores de 9 pb, que diferem entre si por pelo menos três pares de bases. Cada amostra em cada biblioteca de sequenciamento receberá uma combinação exclusiva de marcadores de primer direto e reverso. Isso permite que as leituras sejam atribuídas ao seu espécime de origem. O sucesso da amplificação é avaliado por eletroforese em gel. Amplicons serão agrupados em volume igual dentro de cada placa. O agrupamento equimolar entre as placas será realizado aproximando a concentração com base na presença e intensidade das bandas de gel. O sequenciamento será realizado com MinION (Oxford Nanopore).
Os barcodes serão obtidos em corridas de 10.000 exemplares no MinION em aproximadamente 40 minutos, preservando os exemplares (vouchers), inclusive os espécimes muito pequenos.
A disponibilidade do barcoding de todos os exemplares vai permitir uma discussão da confiabilidade dos algoritmos disponíveis de delimitação de espécies a partir de sequências de barcoding. Também discutiremos o uso de morfologia no processo iluminação recíproca para a delimitação de espécies e do uso de árvores com mitogenoma completo das espécies. Para os clados na zona cinzenta da evolução para o surgimento de novas espécies (entre 3 e 5% de divergência entre subclados) haverá análises cuidadosas adicionais. A extensão da base de dados e a complexidade das inferências deve criar um novo paradigma na literatura sobre uma taxonomia integrativa entre morfologia e dados moleculares.
Todos os dados serão reunidos em uma planilha e serão feitas as inferências de espécies compartilhadas em vários estratos da floresta (ou épocas), porcentagem das espécies exclusivas de estratos, distribuição das guildas etc. O material coletado estará disponível em instituições no Brasil dentro do conceito de metacoleções. O material deve ter uma divisão tripartite, com base em compromisso assinado pelos pesquisadores envolvidos: (1) um terço a ser depositado no INPA; (2) um terço a ser depositado no MNRJ, de forma a impulsionar com uma nova coleção o acervo perdido no trágico incêndio de 2018; e (3) um terço na coleção do pesquisador ou da pesquisadora estudando o material, quando em outras instituições.