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CIÊNCIA E ACOLHIMENTO
Cláudio Moss da Silva: cuidado e dedicação que transformaram vidas na Infectologia
Rio Grande (RS) – Há 35 anos, um grupo de médicos visionários e dedicados começava a enfrentar uma epidemia desconhecida, que trazia medo e incertezas. Entre eles estava Cláudio Moss da Silva, que testemunhou de perto os primeiros casos de HIV em Rio Grande e contribuiu para a criação do SAE Infectologia do HU-Furg. O que começou com atendimentos pontuais, sem estrutura formal, transformou-se em um serviço de referência regional, reconhecido pelo cuidado humano, pela pesquisa científica e pela formação de novas gerações de profissionais de saúde. Confira o que Cláudio compartilhou:
Como foi o primeiro contato com os pacientes vivendo com HIV?
“O primeiro contato que tive foi por meio da leitura de artigos publicados em periódicos internacionais. Eu me perguntava se algum dia veria um caso real. Era final da década de 1980. Formei-me em 1983, fiz residência em Clínica Médica, depois treinamento em Terapia Intensiva. Os primeiros casos no Brasil já começavam a surgir, para nós, ainda era algo distante, desconhecido. Quando voltei a Rio Grande, em 1987, os primeiros pacientes começaram a chegar. Aquilo exigia coragem e disposição para aprender e enfrentar algo totalmente novo.”
E como foi o atendimento a esses primeiros pacientes?
“Era tudo desafiador. Eu sempre tive atração por situações complexas, mas isso era diferente, assustador e, ao mesmo tempo, fascinante. Havia muito preconceito. Poucos médicos dispostos a enfrentar esse desafio. No início, colegas atendiam pacientes no Hospital Universitário e eu na Santa Casa. Discutíamos cada caso, tentando entender a doença e organizar o atendimento. Cada paciente era uma lição, cada atendimento era um aprendizado que nos moldava.”
Como surgiu o ambulatório que se tornaria o SAE Infectologia?
“No início, éramos três colegas (Jussara, Gabriela e eu), atendendo em horários determinados, sem agendamento. Se aparecia um paciente, atendíamos; se vinham três ou quatro, atendíamos todos. Não havia estrutura formal, mas havia dedicação. Pouco tempo depois fomos obrigados a trabalhar com agendamento de consultas, pois a demanda era cada vez maior. Estudávamos juntos, participávamos de atividades fora da cidade e nos tornamos referência para outros profissionais. Cada conquista, mesmo pequena, tinha um peso enorme.”
Quais foram os desafios para organizar o Serviço no Hospital?
“Lutamos muito para ter leitos exclusivos, laboratórios adequados e estrutura de investigação clínica. Era uma batalha constante: convencer a administração, educar profissionais, organizar atendimentos. Mas cada vitória nos motivava. Hoje, temos laboratórios de CD4, carga viral e diagnóstico de doenças oportunistas, além de produção científica contínua.”
Como foi consolidar o SAE Infectologia ao longo do tempo?
“Com treinamento no exterior, estudos, publicações e reuniões de discussão. Cada colega tinha sua frente de atuação, mas todos lutávamos juntos. Fomos agregando novos colegas ao grupo. Uma equipe multiprofissional foi se formando. Conseguimos reconhecimento no Hospital, no município, no estado e, em alguns aspectos, nacionalmente. Construímos um serviço sólido, que atende, pesquisa e forma profissionais.”
Qual é o sentimento ao ver o SAE Infectologia com 35 anos?
“Sentimento de dever cumprido. Fizemos o que estava ao nosso alcance. Hoje, ver a equipe, a consolidação do Serviço e o impacto na vida dos pacientes, é emocionante. É a prova de que dedicação, ciência e acolhimento podem transformar vidas. Começamos com o HIV, mas expandimos para toda a Infectologia. Hoje temos residência médica em Infectologia, pesquisas contínuas na área e formação de novos profissionais. Nosso objetivo é fortalecer o Serviço e garantir sua continuidade.”
Que lembranças guarda dos pacientes?
“Muitas são emocionantes. Ver pacientes que chegaram em estado grave e hoje vivem bem é recompensador. Criar relações de confiança, acompanhar trajetórias de vida e perceber a diferença que nosso cuidado fez é inesquecível.”
Quem se destacou nesse processo?
“Impossível citar uma única pessoa, sempre desenvolvemos um trabalho em equipe. Com o tempo, muitos profissionais vieram para somar. Se juntaram a nós, os colegas Nildo, Márcia, Rossana, Roseli, Carla, Letícia e, na sequência, vários outros. O grupo continuou crescendo, agregando novos médicos e se renovando. Todos sempre trabalharam com dedicação. Na Enfermagem, Elaine e Maiba foram pioneiras e fundamentais na construção do Serviço. Não podemos esquecer que contamos com o comprometimento de muitas pessoas que sempre nos apoiaram e nesse aspecto, profissionais atuantes na Farmácia, agendamento de pacientes, técnicos de Laboratório e de Serviço de Imagem. Sem eles, nada seria possível. A força de equipe foi o que nos manteve unidos e firmes diante dos desafios.”
Que legado o SAE Infectologia deixa?
“Um legado de cuidado humano, pesquisa e formação. Mostra que, mesmo diante de desafios inéditos e de poucos recursos, é possível criar um serviço de referência, baseado no acolhimento, na ciência e na responsabilidade social. Pessoalmente, aprendi que dedicação, curiosidade e trabalho em equipe são fundamentais. O enfrentamento do HIV mostrou a importância do cuidado integral, da humanização e da responsabilidade social. Cada desafio enfrentado nos ensinou algo que vai muito além da Medicina: nos remete à empatia, resiliência e coragem.”
Qual é seu desejo para o futuro do SAE Infectologia?
“Que continue crescendo, formando profissionais, oferecendo atendimento de excelência e servindo de modelo para outros serviços. Que nossas conquistas inspirem iniciativas ainda maiores, sempre com foco na saúde da população e no cuidado integral. Cada geração traz inovação, energia e comprometimento. A dedicação e a paixão pelo Serviço se renovam, garantindo que o espírito do SAE continue vivo. Meu desejo é que tudo que construímos permaneça, sirva de embrião para iniciativas maiores, contribua para a saúde pública e para a formação de profissionais capacitados.”
Sobre a Ebserh
O HU-Furg faz parte da Rede Ebserh desde julho de 2015. Vinculada ao Ministério da Educação (MEC), a Ebserh foi criada em 2011 e, atualmente, administra 45 hospitais universitários federais, apoiando e impulsionando suas atividades por meio de uma gestão de excelência. Como hospitais vinculados a universidades federais, essas unidades têm características específicas: atendem pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS) ao mesmo tempo que apoiam a formação de profissionais de saúde e o desenvolvimento de pesquisas e inovação.
Por Andreia Pires
Apoio de Leonardo Andrada de Mello/UCR15 e Alan Bastos/UAO5
Coordenadoria de Comunicação Social/Ebserh