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Colisão planetária pode explicar estrutura misteriosa de Mercúrio, revela estudo com participação brasileira
- Estudo publicado hoje na Nature Astronomy propõe que uma colisão entre dois protoplanetas de massas semelhantes deu origem à composição incomum de Mercúrio.
- Pesquisa foi liderada por ex-aluno de doutorado do Observatório Nacional e seu orientador, com participação de instituições brasileiras e alemãs.
- Simulações hidrodinâmicas reproduziram com precisão a estrutura interna do planeta, reforçando a hipótese do impacto como chave para entender sua formação.
Rio de Janeiro, 27 de junho de 2025 – Um novo estudo publicado na revista Nature Astronomy propõe uma explicação inédita para um dos maiores mistérios do Sistema Solar: a composição incomum de Mercúrio. Liderado por pesquisadores ligados ao Observatório Nacional (ON/MCTI), com a colaboração de pesquisadores da Faculdade de Engenharia da UNESP/Guaratinguetá e da Universidade Tübinguen, na Alemanha, o trabalho aponta que o planeta pode ter se formado após uma colisão rasante entre dois protoplanetas de massas semelhantes — uma reviravolta nas teorias que tentavam explicar por que Mercúrio tem um núcleo de ferro tão desproporcional em relação ao seu tamanho.
Crédito: NASA/Laboratório de Física Aplicada da Universidade Johns Hopkins/Instituição Carnegie de Washington
A pesquisa foi desenvolvida por uma equipe internacional que inclui o astrônomo e diretor substituto do Observatório Nacional (ON/MCTI), Dr. Fernando Roig, e o ex-doutorando da instituição, Dr. Patrick Oliveira Franco. Juntos, eles buscaram entender por que Mercúrio exibe uma estrutura interna tão distinta dos demais planetas rochosos, desafiando as teorias mais tradicionais da formação planetária.
De acordo com o estudo “Forming Mercury by a grazing giant collision involving similar mass bodies”, publicado na prestigiosa revista Nature Astronomy em 27 de junho de 2025, um impacto gigante entre dois protoplanetas (aglomerados de matéria que constituem a fase inicial na evolução dos planetas) de tamanho similar no início do Sistema Solar seria a explicação para essa propriedade peculiar.
Instantâneos da colisão dos protoplanetas na simulação
Mercúrio é o menor e mais interno planeta do nosso Sistema Solar, sendo apenas um pouco maior que a Lua da Terra. Junto com Vênus, Terra e Marte, Mercúrio é um dos planetas rochosos, possuindo uma superfície sólida coberta de crateras, mas este planeta possui uma série de características pouco compreendidas em comparação com os outros planetas rochosos. Sua estrutura interna é particularmente intrigante. Isso porque o planeta possui um grande núcleo sólido de ferro, além de um núcleo externo líquido composto de ferro, enxofre e silicatos. Um manto de silicato pobre em ferro encontra-se abaixo de uma crosta de silicato de apenas 10 km de espessura, o que representa uma camada surpreendentemente fina.
Estrutura interna de Mercúrio - Crédito: ESA / Laboratório de Física Aplicada da Universidade Johns Hopkins/Instituição Carnegie de Washington
Uma hipótese que poderia explicar essa composição atípica seria a de que Mercúrio teria colidido violentamente com um protoplaneta muito maior. No entanto, simulações indicam que colisões desse tipo são extremamente raras, o que levou os cientistas a buscarem explicações alternativas.
Foi então que os pesquisadores, liderados pelo então doutorando do Programa de Pós-Graduação em Astronomia do ON, MSc. Patrick Franco, e seu orientador, Dr. Fernando Roig, passaram a investigar novas abordagens para desvendar a origem da composição incomum de Mercúrio.
Por meio de simulações hidrodinâmicas avançadas, eles descobriram que a estrutura anômala do planeta pode ser resultado de um evento mais comum: uma colisão rasante entre dois protoplanetas de massas semelhantes.
No estudo, que fez parte da tese defendida pelo aluno em 2023, foram realizados dois grupos de simulações, cada um com uma composição inicial diferente para o corpo-alvo, e testaram-se três conjuntos distintos de parâmetros de impacto, com o objetivo de avaliar sua viabilidade. Após 48 horas de evolução após a colisão, quando a forma final dos remanescentes do evento se estabilizou, os resultados reproduziram com notável precisão as características atuais de Mercúrio, tanto em termos de massa quanto de composição.
“Esses resultados indicam que uma única colisão de raspão envolvendo dois embriões planetários de massas comparáveis é um cenário altamente provável para explicar a estrutura atual de Mercúrio. Isso confirma o impacto gigante como a hipótese mais plausível para a origem do planeta”, pontuaram os pesquisadores.
Conforme destacou o principal autor do estudo, Dr. Franco, atualmente contratado como pós-doutor em astrofísica no Instituto de Física do Globo de Paris (IPGP): “O trabalho reforça a ideia de que impactos gigantes não são apenas parte da formação planetária — eles podem, na verdade, ser os principais fatores que moldaram a estrutura final dos planetas rochosos no Sistema Solar".
O Dr. Roig destacou que o trabalho ainda apresenta algumas limitações. Por exemplo, a evolução orbital dos dois corpos que colidiram pode, eventualmente, levar a um novo encontro, resultando em um desfecho totalmente diferente.
“Por isso, nossos próximos passos estarão focados justamente na análise do cenário pós-impacto. Em particular, queremos investigar como o Mercúrio resultante evoluiu durante os estágios finais da formação planetária, se ele poderia sobreviver no longo prazo e se seria capaz de se estabilizar na órbita atual de Mercúrio”, pontuou Roig.
Sobre o Observatório Nacional
Fundado em 1827, o Observatório Nacional (ON) é uma Unidade de Pesquisa do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) que desempenha um papel fundamental na construção e desenvolvimento dos campos científicos da Astronomia, Geofísica e Metrologia em Tempo e Frequência no Brasil, nas quais realiza pesquisa, desenvolvimento e inovação, com reconhecimento nacional e projeção internacional. Suas atividades incluem a formação de pesquisadores em cursos de pós-graduação, geração, conservação e disseminação da Hora Legal Brasileira e a divulgação e popularização do conhecimento científico produzido. Saiba mais em: http://www.on.br/
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Informações à imprensa:
Dr. Fernando Roig – froig@on.br
Astrônomo e diretor substituto do Observatório Nacional (ON/MCTI)