Funai e Sesai promovem formação para fortalecer atendimento ao povo Warao em João Pessoa (PB)

Para fortalecer a política indigenista em contexto urbano em João Pessoa (PB), foi promovida a Formação Intercultural em Saúde para Atendimento ao Povo Warao, entre os dias 26 e 28 de agosto, no Espaço Cultural José Lins do Rego, na capital paraibana. O evento foi promovido pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai)  em conjunto com o Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei) Potiguara, vinculado à Secretaria de Saúde Indígena (Sesai), do Ministério da Saúde (MS).

O principal objetivo foi promover um espaço de diálogo entre profissionais que atuam nas redes municipal e estadual de saúde de João Pessoa e lideranças da comunidade indígena Warao.

A iniciativa reafirma a interculturalidade (respeito entre diferentes culturas), o respeito à cosmologia indígena (visões de mundo diversas) e a atenção às vulnerabilidades específicas decorrentes do processo migratório, em conformidade com os princípios do Sistema Único de Saúde (SUS) e a Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas (PNASPI).

Mais do que uma capacitação, a formação se estruturou como uma oficina de trocas de experiências e saberes, possibilitando a identificação conjunta de desafios e a definição de estratégias para o aprimoramento do atendimento à população Warao. 

Participação social

O pedagogo e liderança Warao, Ramon Gomez Quinonez, expressou a alegria da comunidade em participar do evento, destacando que “momentos como esse são oportunidades para que suas vozes sejam ouvidas e suas necessidades compreendidas”. 

A liderança ressaltou, ainda, o desafio de manter viva a identidade Warao em contexto urbano e enfatizou que a educação e o acesso a serviços adequados são fundamentais para o futuro das crianças. “O atendimento em saúde vai além do aspecto médico, incorporando o respeito à cultura e ao modo de vida de seu povo”, reforçou.

Política indigenista compartilhada

A coordenadora de Acompanhamento de Saúde Indígena da Funai, Rachel Geber, destacou que o encontro também teve como objetivo sensibilizar gestores estaduais e municipais para a responsabilidade no atendimento aos Warao. “Estamos contribuindo com o debate para explicar que a política indigenista é transversal e que é uma questão do Estado brasileiro e não somente do Governo Federal. Atender indígenas migrantes no sistema de saúde municipal e estadual faz parte desse raciocínio”, reforçou.

Para Rachel, as políticas indigenistas só alcançam sua efetividade quando são realizadas de forma articulada entre União, estados e municípios. “Somente assim conseguiremos garantir um atendimento digno, respeitoso e culturalmente apropriado para todas os indígenas que vivem em contexto urbano”, enfatizou.

Segundo Wdson Fernandes, chefe do Serviço de Promoção dos Direitos Sociais e Cidadania (Sedisc) da Coordenação Regional (CR) da Funai em João Pessoa, a formação voltada ao atendimento das comunidades indígenas Warao representa um marco importante para a Paraíba, ao promover uma capacitação multicultural e diferenciada para os profissionais de saúde. Ele ressaltou a necessidade de que essas ações sejam contínuas e alcancem também áreas como educação, assistência social e segurança, de modo a garantir um atendimento humanizado, respeitoso e adequado às especificidades culturais desses povos. 

Wdson destacou ainda que, segundo o Censo Demográfico de 2022, João Pessoa abriga 2.809 indígenas, enquanto o estado da Paraíba registra um total de 30.140 indígenas, números que evidenciam a expressiva presença indígena tanto no contexto urbano quanto em outros territórios, reforçando a responsabilidade dos municípios e do estado em oferecer serviços públicos sensíveis às particularidades socioculturais dessa população.

A CR João Pessoa teve papel fundamental na realização do evento ao coordenar e articular sua execução, garantindo os insumos necessários, o transporte e, consequentemente, a presença dos indígenas. Participaram da formação representantes das secretarias estadual e municipal de saúde da Paraíba, da Secretaria de Estado do Desenvolvimento Humano (Sedh/PB), do Centro Estadual de Referência de Migrantes e Refugiados (Cermir/PB) e indígenas Warao.

Articulação interinstitucional

Para muitos servidores municipais, a formação também foi uma experiência de vida. A funcionária da Prefeitura Municipal de João Pessoa, Cristiane Vieira Coutinho, que atua na Policlínica de Mandacaru, destacou a importância do contato direto com os indígenas. “Foi um dia maravilhoso, pois nunca tinha tido a oportunidade de estar pessoalmente com indígenas. Essa vivência me marcou muito e reforça o quanto precisamos trabalhar com acolhimento e humanização. Muitas vezes, o povo Warao ouve apenas a palavra ‘não’, mas nossa missão é buscar os ‘sins’ que fazem a diferença no cuidado e na atenção que eles tanto necessitam”, relatou.

A psicóloga Larissa Rodrigues, referência técnica da Atenção Psicossocial do Dsei Potiguara, reforçou a necessidade de articulação entre os diferentes entes federativos. Para ela, a formação com os profissionais que atuam com os Warao em João Pessoa é necessária e pede que Estado e município realizem ações conjuntas para executar a atenção diferenciada prevista no SUS e que a Sesai executa.

“Os povos originários têm histórias e contextos muito diferentes dos nossos, que não somos indígenas, e eles precisam ser atendidos a partir da compreensão dessas histórias, contextos, modos de viver, comer, produzir a vida e lidar com os processos de saúde e adoecimento”, salientou Larissa Rodrigues, reafirmando que essa atenção deve ser uma política de Estado e que precisa garantir recursos para que os profissionais tenham cada vez mais condições de executar seu trabalho, como agentes facilitadores do acesso a diversos direitos.

Formação Intercultural em Saúde para o Povo Warao

Durante os três dias de formação, os participantes compartilharam os principais desafios enfrentados no atendimento à comunidade Warao — cuja língua, cultura, costumes e noções de saúde e doença demandam abordagens sensíveis e diferenciadas. A partir desses relatos, foi elaborado um mapa visual coletivo das dificuldades vivenciadas pelos Warao, permitindo também identificar os obstáculos enfrentados pelos profissionais de saúde e, desse modo, buscar estratégias qualificadas para aprimorar o atendimento.

A expectativa é que esta formação seja o início de uma série de ações contínuas, capazes de assegurar que todos os entes federativos estejam alinhados na garantia de direitos e no oferecimento de serviços culturalmente apropriados à população indígena urbana — especialmente aquelas em situação de mobilidade como os Warao.