Uma estrada sinuosa, que serpenteia os morros do leste de Minas Gerais, cortando o Vale do Aço. Assim é a BR-381/MG, entre Belo Horizonte e Governador Valadares. Construída ainda na década de 1960, ela dá acesso aos estados do Espírito Santo, ao norte, e de São Paulo, ao sul.
Vidas transitam pelos quase 300 quilômetros da rodovia federal. Caminhoneiros transportam minério e outros insumos essenciais à economia brasileira; passageiros de ônibus vencem a distância de um estado a outro; motoristas de carros de passeio se deslocam diuturnamente entre as cidades da região para estudar, trabalhar, cuidar da saúde e se divertir.
Foram décadas de investimentos aquém ao movimento e relevância da BR-381 para as economias mineira e nacional. Após três tentativas frustradas, o Ministério dos Transportes realizou em agosto de 2024 o bem-sucedido leilão que transferirá, neste histórico 22 de janeiro de 2025, a administração da rodovia à iniciativa privada. A medida vai assegurar que mais de R$ 9 billhões sejam aplicados na modernização da via, ampliação de sua capacidade operacional e elevação dos níveis de serviços prestados aos usuários.
Com a concessão, o Governo Federal viabiliza investimentos em obras de recuperação e adequação de um trecho que por tanto tempo ficou conhecido com o “Rodovia da Morte”. Apelido pejorativo que aumenta o medo de quem precisa se locomover pela estrada e mexe com o brio dos residentes de municípios que margeiam a BR-381/MG.
O cenário de deterioração das rodovias federais brasileiras, que se acentuou nos últimos anos, trouxe consequências para além dos prejuízos econômicos. Buracos, ausência ou má sinalização, iluminação precária, falta de acostamento e pavimento deteriorado são alguns dos problemas que, somados à imprudência de motoristas, levam a tantas ocorrências graves nas pistas do país. Muitas delas, fatais.
Dados da Polícia Rodoviária Federal (PRF) indicam que entre os anos de 2018 e 2023, ocorreram 3.960 sinistros de trânsito no trecho da BR-381 que vai de Belo Horizonte a Governador Valadares. Quatrocentas e vinte pessoas perderam a vida nessa estrada.
A equipe da Assessoria Especial de Comunicação do Ministério dos Transportes foi até João Monlevade, onde Andreia reside, conversar com os moradores sobre a relação deles com a rodovia. Todos tinham uma tragédia para lembrar. Muitos foram vítimas ou perderam amigos e parentes ao se deslocarem pela 381. Um dos casos mais dramáticos ocorreu em 2020, quando um ônibus que transportava passageiros de Alagoas para São Paulo caiu de um viaduto com mais de 30 metros de altura. Morreram 19 pessoas.
Na época, o Serviço Voluntário de Resgate (Sevor) atuou no apoio às vítimas. O grupo havia sido criado poucos meses antes devido à quantidade de acidentes na BR. Com o passar dos anos, as ocorrências aumentaram e a equipe se fez ainda mais presente, sempre de forma voluntária.
Entre as tantas pessoas resgatadas pelo Sevor, estava o técnico de segurança do trabalho Luiz Vanderlei Pinto. Ele sofreu um acidente grave na BR-381. Foi resgatado por um amigo que fazia o curso de técnico em segurança no trabalho à época. Devido a várias fraturas pelo corpo, foi submetido a diversas cirurgias.
"Essa é uma estrada muito antiga, com muitas curvas e o volume de veículos cresceu muito. Foram muitas vidas ceifadas", comenta Luiz Vanderlei. "Mas a gente também tem esperança com essas duplicações. Porque é muito triste para quem já passou por algum acidente aqui na 381, e eu sou prova viva disso. Nasci de novo e estou aqui para contar a história", ressalta.
Aos 65 anos, Gladstone Lobato brinca que está na estrada desde que nasceu, e que trabalha com transportes desde que se entende por gente. Quando jovem, começou a namorar com Jane Alves, que vivia em Coronel Fabriciano, a mais de 200 quilômetros de Pedro Leopoldo, onde ele reside até hoje. Era a década de 1980 e semanalmente Gladstone percorria a BR-381 para ver a futura esposa. Também cruzava a rodovia em viagens a trabalho, atuando no ramo de logística.
Hoje, o diretor da TransAvante e vice-presidente da Federação das Empresas de Transportes de Carga do Estado de Minas Gerais (FETCEMG) fala sobre a rodovia que corta o leste mineiro com o orgulho de quem a conhece como poucos. "Tudo passa pela 381. Apesar do título de Trevo do Brasil, Minas Gerais tem muitas montanhas, especialmente na região metropolitana de BH, Zona da Mata e leste do estado, por onde passa essa BR. Ela é artéria, mas uma estrada difícil de operar, com grande volume de caminhões. Isso traz um custo operacional alto pro transportador: pneu, óleo diesel, peças. E quanto mais longo o percurso, mais insegura fica a viagem. Transitar pela BR-381 hoje é rezar e dar sorte", explica.
Gladstone entende o papel essencial dessa estrada para Minas Gerais, tanto economicamente quanto nas histórias de vida que são construídas ao longo dos quilômetros que avançam. Ele sabe que os anos não foram tão bons para a BR-381/MG, mas comemora a concessão, depositando esperança nas adequações por vir.
A incorporação de novas fontes de investimentos por meio de contratos de concessão se consolida como um caminho estratégico para a melhoria da qualidade da malha rodoviária brasileira. Mediante a atração de capital privado, o Governo Federal garante os recursos necessários para um ambiente de pleno funcionamento da infraestrutura de transportes, sem impor novos gargalos ao orçamento público.
Em 2023 o Ministério dos Transportes instituiu a Política Nacional de Outorgas Rodoviárias, que orienta e padroniza os novos contratos de concessão. Trata-se de instrumento estratégico para tornar as propostas mais atrativas à iniciativa privada, assegurando ao Estado o poder de fiscalização sobre o cumprimento dos contratos. Isso garantiu que projetos que estavam engavetados ou sofriam com a falta de proponentes fossem arrematados em leilão.
Foi o que aconteceu com a BR-381/MG após ajustes à proposta original para adequação à nova política de outorgas.
A estrada mineira foi a leilão em 29 de agosto de 2024, tendo como critério a proposta com a menor tarifa de pedágio. Venceu o grupo investidor 4Um FIP em Infraestrutura de Responsabilidade Ltda, que criou a concessionária Nova 381 para assumir a administração da rota com início em Belo Horizonte, a partir do entroncamento com a BR-262/MG (sentido Sabará) até o entroncamento com a BR-116/MG (Governador Valadares).
Caberá à nova concessionária – cujo contrato com a União é assinado neste 22 de janeiro de 2025 – aplicar os R$ 9,34 bilhões previstos para serviços operacionais e obras estruturantes, como duplicação, correção de traçado e criação de pistas de escape, além da manutenção da estrada ao longo dos próximos 30 anos. A empresa não estará sozinha nesta missão: obras e negócios que podem surgir atrelados às intervenções na rodovia – como pousadas, hotéis, bares e restaurantes – devem gerar em torno de 80 mil novas vagas de trabalho na região.
O estado de Minas Gerais lidera o portifólio de concessões rodoviárias posto em andamento pelo Ministério dos Transportes na atual gestão federal. Além da BR-381/MG, outros quatro trechos tiveram edital aberto para serem repassados à administração privada. Quem conhece o estado e o setor de logística, aposta nas melhorias futuras.
“O negócio não é só falar da BR-381. A gente tem que falar de um conjunto de obras feitas pelo Governo Federal que se somam à concessão da BR-040 para o Rio de Janeiro, por exemplo, para que a gente não fique preso num funil”, conclui Gladstone Lobato, representante do setor produtivo.
Veja, no mapa, as rotas de desenvolvimento da infraestrutura de transportes pelo território mineiro.
