Pronunciamento do presidente Lula na entrega do prêmio MEC da Educação Brasileira em Brasília
Bem, meus amigos, minhas amigas, vocês perceberam que nós tivemos um pequeno problema, porque é a primeira vez que a gente participa da organização de um Oscar, o Oscar da Educação, organizado pelo nosso Ministério da Educação.
Eu quero começar cumprimentando a minha querida companheira Janja [primeira-dama do Brasil], nosso querido companheiro ministro Camilo Santana [ministro da Educação], o governador do estado [do Ceará], Elmano de Freitas, Rafael Fonteles [governador do Piauí], a nossa governadora de Pernambuco, Raquel Lyra, cumprimentar a senadora Zenaide Maia, cumprimentar os deputados federais que estão aqui, Átila Lins, Luiz Gastão, professora Luciene Cavalcante e Rogério Correia, cumprimentar a Fátima Gavioli, secretária de Educação de Goiás, os prefeitos que estão aqui presentes, Denise Santos Reis, diretora da Escola Municipal, Amanda Sousa Santos, professora do Centro de Ensino de Tempo Integral, Gabrieli Freitas, Eitelan Maciel, aluna e aluno premiados, em nome de quem cumprimento todos os queridos companheiros que receberam o prêmio aqui.
Não é fácil, nesse país em que a educação nunca foi tida como uma coisa prioritária, a gente ter a coragem de criar um prêmio para premiar os melhores alunos, as melhores escolas, os melhores prefeitos e os melhores governadores que se dedicaram a cumprir a meta de fazer com que a gente possa sonhar que a educação é a única e a mais eficaz solução para que a gente possa resolver definitivamente o problema do nosso país.
Até porque eu digo e repito sempre, não há exemplo nenhum na história da humanidade de algum país que tenha se transformado em um país de primeira grandeza, sabe, sem antes fazer investimento na educação. A educação, ela é boa para o país, ela é boa para o mundo, ela é boa para o Estado, ela é boa para a cidade, ela é boa para a família e, sobretudo, ela é boa para a pessoa que consegue se formar.
Não é uma tarefa fácil. Há muitos anos e há muitos anos, muita gente nesse país e educadores de enorme qualidade tentaram resolver o problema da educação desse país e sempre se parou na falta de prioridade na questão da educação.
Eu digo isso porque muitos alunos jovens que vieram aqui receber os seus prêmios precisam saber. O nosso querido Brasil foi o último país da América do Sul a fazer uma universidade. Eu de vez em quando fico citando exemplos para ver se a gente se toca de quanto a educação foi desprezada no Brasil, é que de Santo Domingo, na República Dominicana, a cidade onde Cristóvão Colombo aportou sua caravela quando descobriu a América, em 1492, em 1532, Santo Domingo já tinha a sua primeira universidade feita pelo rei da Espanha.
E a primeira universidade brasileira foi feita em 1920, a Universidade Brasil. E ela foi feita porque o rei da Bélgica vinha para o Brasil e naquele tempo era importante dar o título de Doutor Honoris Causa ao rei que viesse visitar o Brasil, então juntou-se várias faculdades e criou a Universidade Brasil. Eu estou dizendo isso apenas para mostrar o desprezo que ao longo de séculos a educação teve no país.
O filho do rico poderia estudar aonde quisesse, o filho do pobre ou era filho de escravo ou era filho de indígena ou era filho de gente pobre, a ele restava apenas o consolo de trabalhar. Esse número que o Camilo citou, que um terço da população brasileira não terminou o ensino fundamental, é o resultado do descaso que a educação foi no Brasil. Simplesmente é o resultado do descaso.
Nós resolvemos mudar a regra do jogo. Para mudar a regra do jogo é preciso convencer a sociedade, o Congresso Nacional, o próprio governo, de que não é possível fazer educação de graça. Educação custa. E ela custa porque tem que ter infraestrutura, porque tem que ter laboratório, porque tem todo o material, o acesso ao conhecimento científico e tecnológico, porque tem professoras e professoras que precisam receber salário para poder dar aula e para poder dar aula de forma satisfatória.
Esse é um problema que nós estamos tentando resolver. Por isso, nós já fizemos acordo com praticamente 100% dos governadores e 99% dos prefeitos para saber se todos eles assumam o compromisso conosco de até 2030 a gente pelo menos alfabetizar 80% das crianças brasileiras até o segundo ano de escola, que é o momento propício para que a gente possa alfabetizar as crianças brasileiras.
Ao mesmo tempo, nós estamos fazendo um esforço muito grande para ver se a gente consegue em pouco tempo ter Escola de Tempo Integral para que as nossas crianças possam aproveitar o dia aprendendo, aprendendo e aprendendo e não ficando na rua vítima, sabe, de muitas coisas erradas que existem nesse país. Sobretudo, para dar tranquilidade à mãe e ao pai, para ir para o trabalho sabendo que o filho está em uma Escola de Tempo Integral, aprendendo, sabe, mais coisa do que a escola habitualmente ensina.
É preciso aprender música, é preciso aprender arte, é preciso ter acesso à cultura como um todo para que essas crianças possam ser mais preparadas do que os pais foram ou do que os avós foram.
Esse é um desafio extraordinário. E o exemplo maior disso é a quantidade de alunos no Pé-de-Meia. Seria uma total irresponsabilidade... quando o Camilo me trouxe o problema, eu dizia para o Camilo que era um problema de orçamento, que a gente não tinha dinheiro para fazer, portanto, se 480 mil crianças deveriam abandonar a escola todo ano, era um problema dos pais e não um problema do governo.
E nós assumimos como um problema do governo. É um problema do Estado. O Estado não pode transferir a sua responsabilidade para a família ou não pode transferir a nossa responsabilidade para Deus. É preciso que a gente assuma a responsabilidade e foi por isso que nós criamos o Pé-de-Meia para garantir que esses jovens, meninos e meninas, possam continuar na escola estudando.
E eu tenho certeza que, para aqueles que pensam que nós estamos gastando dinheiro para colocar menino em ensino técnico, daqui a alguns anos eles vão agradecer o dia em que esse país teve um governo que se preocupou em não deixar os nossos adolescentes desistirem do ensino para trabalhar e ajustar o orçamento familiar.
Da mesma forma que nós tivemos uma preocupação com a formação técnica profissional dos nossos meninos. É importante a gente nunca deixar de falar, em 100 anos, de 1909 a praticamente 2003, esse país construiu, ao longo de um século, apenas 140 Institutos Federais. Nós vamos terminar o nosso mandato agora em dezembro de 2026 com 785 institutos federais espalhados por esse país.
E ainda é muito pouco se a gente levar em conta o atraso a que nós estamos submetidos. Porque é necessário que a gente tenha a noção de que o mundo está exigindo de cada um de nós cada vez mais competitividade, cada vez mais uma boa formação, cada vez mais produtividade, cada vez mais conhecimento para que a gente possa se transformar em uma nação competitiva com as nações mais desenvolvidas do mundo.
E esse é um desafio que está colocado para nós. É um desafio que está colocado para o Camilo. E por que Camilo veio ser ministro da Educação? Eu já tinha tido muita sorte, quando eu trouxe o companheiro Fernando Haddad [atual ministro da Fazenda] para ser meu ministro da Educação, que nós fizemos uma pequena revolução na educação nesse país, criando o Reuni [Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais], criando o ProUni, começando a fazer os Institutos Federais e fazer universidade.
É importante, jovens, que vocês não tenham, sabe, não esqueçam nunca. Eu sou o único presidente da República desse país que não tem diploma universitário. E tenho muito orgulho de ser o presidente que mais fez universidades federais na história desse país e mais extensões universitárias. E é exatamente pelo fato de eu não ter tido a oportunidade de ter um diploma universitário que eu tenho quase como uma profissão de fé, que todas as pessoas, independentemente do berço em que nasceram, independentemente da origem social, independentemente do credo religioso ou da cor, todos têm direito à mesma oportunidade.
Nós não queremos tirar direito de ninguém, absolutamente de ninguém. O que nós queremos é dar o direito daqueles que nunca participaram, daqueles que são tratados como se fossem invisíveis nesse país, de ter a oportunidade de fazer o vestibular, de fazer o Enem e de cursar uma universidade.
Eu tenho certeza absoluta de que esse país será igual quando o filho de um trabalhador estiver disputando a mesma vaga no banco de uma universidade com o filho do seu patrão. Isso não será prejuízo para ninguém, será qualificação e igualdade da sociedade brasileira. Todos têm que ter oportunidade e cabe ao Estado garantir que o filho do mais pobre possa disputar uma vaga na universidade junto com o filho do mais rico.
Da mesma forma, a Lei de Cotas que foi aprovada. Ora, se a gente não levasse em conta a necessidade de a gente recuperar o prejuízo histórico desse país, a gente ia ter cada vez mais uma sociedade muito desigual, porque teve muita gente segregada, ao longo de séculos pessoas foram segregadas. Eu sou filho de um homem que morreu e ele não deixava minhas irmãs irem para a escola porque minhas irmãs iriam escrever carta para o namorado.
E quem é próximo da minha idade, que nasceu em algumas regiões desse país, sabe que era assim que era pensado. As meninas não podiam estudar porque iam escrever carta para os namorados. E é preciso que a gente então comece a perceber o orgulho que me dá quando a gente percebe que o número de meninas é muito maior no Enem do que o número de meninos.
Quando a gente percebe que a USP, que era a universidade de brancos, hoje é uma universidade em que tem brancos e negros em igualdade de condições. Nós estamos apenas tentando recuperar o tempo perdido para fazer justiça. E quando o companheiro Camilo propôs a entrega desse prêmio, eu acho uma coisa extraordinária, porque um prêmio, por mais singelo que ele seja, ele provoca uma competitividade entre escolas, entre municípios e entre estados.
É sempre muito orgulhoso ganhar um prêmio e, sobretudo, ganhar um prêmio como governadores de estado que foram os que mais incentivaram os meninos e as meninas a estudarem. Da mesma forma que a Olimpíada da Matemática, eu sempre conto que quando nós começamos a discutir a Olimpíada da Matemática no setor público aqui, em 2004, tinha muita gente que dizia que o pobre não tem interesse por isso. "Lula, você está perdendo tempo, os alunos de escola pública não querem fazer a Olimpíada da Matemática". A gente fez quase que na marra.
E no primeiro ano se inscreveram 10 milhões de alunos. No segundo, 14 milhões de alunos. No terceiro, 19 milhões de alunos. Ou seja, porque nesse país sempre se partiu do pressuposto de forma negativa. Ah, não dá. Ah, não pode. Ah, não tem jeito. Ah, não é possível. Pelo amor de Deus, vamos tentar.
Vamos dar um crédito para que as pessoas tenham uma chance. E quando as pessoas têm uma chance, as pessoas começam a dizer: "Eu não vou permitir que essa chance me escape. Eu quero construir um sonho".
E eu posso dizer para os jovens que hoje ganharam o prêmio aqui, sem conhecer a mãe de vocês, sem conhecer o pai de vocês, eu tenho certeza que o maior sonho do pai de vocês, o maior sonho da mãe de vocês é verem você ter um diploma numa universidade ou num Instituto Federal, se formar e ter uma profissão. Porque uma profissão não é tudo na vida da gente, mas uma profissão garante que a gente saia da miséria que a gente vive nesse país. Eu vou terminar dizendo uma coisa para estimular vocês.
Foi graças a um curso técnico que eu fiz no Senai, que eu fui o primeiro filho da minha mãe, de oito, a ganhar mais que o salário mínimo. Eu fui o primeiro a ter um televisor. Eu fui o primeiro a ter uma geladeira. Eu fui o primeiro a ter um carro. Eu fui o primeiro a ser presidente do sindicato. E fui o primeiro a ter uma casa. E o único a ser presidente da República desse país.
Isso, numa demonstração, Camilo, eu quero dar os parabéns a você como o criador, sabe, desse prêmio, da ideia de dar o prêmio aos prefeitos, aos professores, aos alunos, às escolas e aos governadores e prefeitos e às escolas que se dedicaram.
Porque isso agora passa a fazer parte da nossa vida. Tem gente que coloca no currículo até uma palestra que ele deu, e vocês vão poder colocar no currículo de vocês, alunos, prefeitos e diretores de escola, você vai poder colocar no currículo o seguinte: "Eu ganhei o prêmio do MEC, porque a minha escola foi a melhor nisso, a minha escola foi a melhor naquilo, meu Estado foi o melhor naquilo". Então, motivo de orgulho.
Então, eu quero dizer para vocês o seguinte, esse prêmio que vocês receberam, para vocês pode parecer apenas um prêmio. Eu, a sensação que eu tive aqui, entregando esse prêmio para vocês, é como se eu estivesse entregando o Oscar, o Oscar da resiliência, o Oscar da teimosia, o Oscar de pessoas que acreditam que não tem nada impossível nesse planeta quando a gente tem vontade. Não tem nada impossível.
A gente não pode desanimar, não existe espaço para desanimar. Porque se eu nasci onde nasci, cheguei onde cheguei, vocês podem chegar muito mais longe do que eu, vocês podem alcançar o que vocês quiserem, o que vocês não podem é desistir, o que vocês não podem é desanimar, o que vocês não podem é deixar de sonhar. E quem sonha pequeno, pensa pequeno, quem pensa pequeno, sonha pequeno.
E é preciso sonhar grande. Esse país está precisando de todos nós, porque o mundo está ficando mais perverso, o mundo está ficando mais nervoso e nós precisamos de um país soberano, democrático, em que o povo brasileiro seja o único dono do seu nariz aqui nesse país. Parabéns professores, parabéns prefeitos, parabéns governadores, parabéns professores e alunos.
Que Deus abençoe todos vocês pelo sacrifício e pelo esporte que vocês fizeram. Parabéns.