Maria Martins
A Coordenação-Geral de Patrimônio Histórico (CGPH) publica neste Espaço da Memória informações sobre as obras que podem ser apreciadas no percurso da visita cívica.
Canto da noite
Figura Feminina, nua, deitada. Da base da escultura se projetam aspectos alongados, que fazem alusão a membros de um corpo entrelaçados. Na obra “canto da noite”, Maria Martins mescla a forma humana com aspectos que remetem à natureza evidenciada pelos longos braços como ramos de uma floresta, integrando e diluindo a figura. Os traços fisionômicos da personagem são indefinidos, abstratos, numa possível tentativa de dar forma ao que não é palpável, como sentimentos de desejo e até mesmo o ato de emitir sons. O estudo intitulado Maria Martins: Metamorfoses apresenta conexões entre a obra e os cantos de Zaratustra do filósofo Nietzsche. O título da obra e do canto são os mesmos, e a leitura do poema pode dialogar com os aspectos exprimidos na obra de Maria Martins, já que segundo esse estudo, era leitora e admiradora das obras de Nietzsche.
É noite; eis que se eleva mais alto a voz fervilhante das fontes
[fervilhantes.
E minha alma é também uma fonte fervilhante.
É noite. Eis que despertam todas as canções amorosas,
[e minha alma é também uma canção de amante.
[…]
Nietzsche, Friedrich. “O canto da noite”
A Mulher e sua Sombra
Duas figuras femininas estilizadas, em bronze, sobre base de madeira. Ambas encontram-se em posição frontal e eretas, estando uma mais recuada que a outra. A figura da frente, em dourado, tem a boca aberta, cabeça inclinada as palmas das mãos voltadas para cima, tal como se estivesse suplicando, tal como um grito. A figura de trás, em cor escura, também está com a boca aberta e as mãos viradas para cima, de seu ventre se projeta dez protuberâncias que lembram seios. Duas serpentes, saindo de sua cabeça, enroscam-se pelo corpo, tentando alcançar a figura da frente, assim como seus membros inferiores. A sombra tentando alcançar aquele que a projeta, tentando controlá-la. Em Maria Martins, a evocação de uma natureza não dominada pela técnica une-se a elementos do inconsciente para criar imagens de forte impacto visual, o que condiz com a ligação da artista ao movimento surrealista. O Surrealismo pode ser entendido como a superação de uma realidade mutiladora que dilacera o homem de si mesmo e que o leva a perder a unidade do ser. O arquétipo da sombra, conceito desenvolvido pelo psiquiatra Carl Jung, diz respeito aos sentimentos mais primitivos e os instintos mais reprimidos, e pode ser um dos possíveis caminhos para um diálogo com a obra, no sentido da bidimensionalidade do ser e do sentir.
Maria de Lourdes Martins Pereira de Souza (Campanha MG 1894¹ - Rio de Janeiro RJ 1973). Escultora, desenhista, gravadora e escritora. Desenvolve grande parte de sua carreira no exterior em virtude das atividades do marido, o embaixador Carlos Martins. Influenciada pelo surrealismo, as suas obras foram reconhecidas internacionalmente, com exemplares expostos na seção de Arte Moderna do Museu de Arte da Filadélfia e também no Museu de Arte Moderna de Nova Iorque, no Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM), no Paço das Artes da USP; trabalhos encontram-se também no Rio de Janeiro, no Palácio do Planalto, em Brasília, e ainda em países como a França e a Bélgica. Colaborou na organização das primeiras Bienais Internacionais de São Paulo e na fundação do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro - MAM/RJ. As duas obras apresentadas, foram doadas pela artista, na instalação do Palácio do Itamaraty em Brasília, em 1970.
“A sensação visualmente é explosiva. Difícil, ficar diante de uma obra de Maria Martins sem ser provocado. A obra fala por si” - Jornalista e doutora em História da Arte, Graça Ramos.
Outras obras de Maria Martins em Brasília:
o Rito dos Ritmos – Palácio da Alvorada
REFERÊNCIAS:
MARIA Martins. In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. São Paulo: Itaú Cultural, 2019. Disponível em: . Acesso em: 25 de Out. 2019. Verbete da Enciclopédia.
ISBN: 978-85-7979-060-7
Maria Martins: metamorfoses / Views of the exhibition Maria Martins: Metamorphoses, MAM, São Paulo, 2013.
Nietzsche, Friedrich. “O canto da noite”, apud Maria Martins. Deuses malditos I – Nietzsche, op. cit.
Os arquétipos e o inconsciente coletivo / CG. Jung ; [tradução Maria Luíza Appy, Dora Mariana R. Ferreira da Silva]. - Perrópolis, RJ : Vozes, 2000.