ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA NO MINISTÉRIO DA CULTURA
PARECER REFERENCIAL nº 2/2025/CONJUR-MINC/CGU/AGU
PROCESSO nº 01400.024161/2023-43
INTERESSADO: Ministério da Cultura
ASSUNTO: Prestações de contas de projetos financiados por fomento cultural direto ou indireto.
EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO. FOMENTO CULTURAL. MANIFESTAÇÃO JURÍDICA REFERENCIAL. VALIDADE: 01/03/2026.
I - Fomento à cultura. Fomento direto e indireto a projetos culturais para execução de ações ou apoio a espaços culturais. Prestação de contas.
II - Orientações para aplicação da Lei nº 14.903/2024 (Marco Regulatório do Fomento à Cultura), do Decreto nº 11.453/2023 (Mecanismos de Fomento do Sistema de Financiamento à Cultura), da Instrução Normativa MinC nº 1/2015 (Política Nacional de Cultura Viva) e da Instrução Normativa MinC nº 23/2025 (mecanismo de incentivos fiscais do Pronac).
O presente parecer consiste em manifestação jurídica referencial elaborada em decorrência da necessidade de revisão e atualização do Parecer Referencial nº 4/2023/CONJUR-MinC/CGU/AGU[1], exarado nos autos no processo nº 01400.021307/2016-70, cujo objeto é a prestação de contas do Projeto Pronac nº 16-1316, tendo resultado em manifestação jurídica referencial para aplicação de novos critérios de julgamento das contas marcadamente focados em resultados, não apenas para o projeto então examinado, mas para todos os projetos culturais do mecanismo de incentivos fiscais do Pronac - Programa Nacional de Apoio à Cultura - de que trata a Lei Rouanet - Lei nº 8.313/1991.
I - Relatório.
Tendo em vista que o Parecer Referencial nº 4/2023/CONJUR-MinC/CGU/AGU[1] foi elaborado sob a vigência da já revogada Instrução Normativa MinC nº 1/2023, faz-se necessária sua atualização em vista das inovações vigentes na nova regulamentação em matéria de prestação de contas dos projetos do mecanismo de incentivos fiscais do Pronac.
Ademais, verifica-se que o prazo de vigência do referido parecer encontra-se próximo de expirar, o que justifica uma revisão geral de sua fundamentação e suas conclusões, já que neste ínterim o Sistema Federal de Financiamento à Cultura passou também pelas inovações da Lei nº 14.903/2024, que instituiu o Marco Regulatório do Fomento à Cultura.
O objetivo da presente manifestação jurídica referencial é oferecer às unidades técnicas assessoradas do Ministério da Cultura responsáveis pelo acompanhamento e avaliação de prestações de contas de recursos públicos de fomento direto ou indireto orientações básicas sobre os procedimentos e critérios de julgamento das contas que podem ser adotados conforme o instrumento de fomento utilizado, especialmente no que se refere à sistemática de avaliação de resultados com preponderância no objeto em detrimento da conformidade documental de cada item de despesa analisado no bojo da prestação de contas financeira de cada projeto, com base nos critérios estabelecidos Lei nº 13.019/2014, que institui o Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil (MROSC), na Lei nº 14.903/2024, que institui o Marco Regulatório do Fomento à Cultura; no Decreto nº 11.453/2023, que dispõe sobre os mecanismos e modalidades de fomento do Sistema Federal de Financiamento à Cultura; na Instrução Normativa MinC nº 1/2015[2], que regulamenta os instrumentos da Política Nacional de Cultura Viva (PNCV); na Instrução Normativa MinC nº 17/2024[3], que dispõe sobre a simplificação das prestações de contas de projetos culturais; e na Instrução Normativa MinC nº 23/2025[4], que estabelece procedimentos relativos à prestação de contas de projetos culturais específicos do mecanismo de incentivos fiscais do Pronac.
II - Do escopo e do cabimento de parecer referencial.
2024 foi um ano de profundas inovações na legislação que trata dos instrumentos de fomento à cultura do Sistema Nacional de Cultura - SNC - do art. 216-A da Constituição Federal, e em particular dos instrumentos da administração pública federal. Com a edição da Lei nº 14.835, de 4 de abril de 2024, que instituiu o Marco Regulatório do Sistema Nacional de Cultura, e da Lei nº 14.903/2024, que instituiu o Marco Regulatório do Fomento à Cultura, consolidou-se o Sistema Nacional de Financiamento à Cultura (SNFC) como instrumento constitutivo do SNC, abrangendo o conjunto de mecanismos de financiamento público e suas modalidades de aplicação, na esteira da regulação iniciada com o Decreto nº 11.453/2023, que justificara a edição do Parecer Referencial nº 4/2023/CONJUR-MinC/CGU/AGU a partir das novas metodologias de prestações de contas nele previstas.
O Decreto nº 11.453/2023 havia unificado, em um regulamento geral do sistema de financiamento à cultura, normas comuns ao Pronac (Lei nº 8.313/1991), à PNCV (Lei nº 13.018/2024), à Política Nacional Aldir Blanc (Lei nº 14.399/2022) e à Lei Paulo Gustavo (Lei Complementar nº 195/2022), otimizando o uso dos mecanismos de fomento direto e indireto à cultura previstos nestas leis e, em grande parte, sujeitos a regimes jurídicos semelhantes, seja do ponto de vista orçamentário, de governança ou de controle de seus programas, projetos e ações. A partir de sua edição foram estabelecidos procedimentos padronizados de prestação de contas para instrumentos não previstos em legislação específica, seguindo os parâmetros da Lei Complementar nº 195, de 2022, e inaugurando um novo paradigma de prestação de contas para as parcerias do Estado com o segundo e o terceiro setor na área cultural, seja no que tange aos projetos culturais aprovados no mecanismo de incentivos fiscais do fomento indireto, seja no caso dos diversos instrumentos jurídicos firmados no âmbito do fomento direto.
Com o advento do Marco Regulatório do Sistema Nacional de Cultura e do Marco Regulatório do Fomento à Cultura com status de lei (Leis nº 14.835/2024 e 14.903/2024), instrumentos de parceria inicialmente concebidos para a execução da Política Nacional Aldir Blanc (Lei nº 14.399/2022) e da Lei Paulo Gustavo (Lei Complementar nº 195/2022) passaram a ser formalmente admitidos para os demais mecanismos do Sistema Nacional de Financiamento da Cultura, consolidando a estratégia de unificação das regras de parceria e de simplificação de prestações de contas das diversas modalidades de fomento.
Portanto, a presente manifestação jurídica referencial não apenas atualiza, mas amplia o escopo do Parecer Referencial nº 4/2023/CONJUR-MinC/CGU/AGU, buscando abranger os procedimentos de prestação de conta aplicáveis não apenas ao mecanismo de fomento indireto à cultura por meio dos incentivos fiscais da Lei nº 8.313/1991, mas a outros instrumentos de fomento direto que possam ser utilizadas para executar as modalidades previstas no art. 8º, incisos I e II, do Decreto nº 11.453/2023. Tais modalidades consistem no (i) fomento à execução de ações culturais e no (ii) apoio a espaços culturais, e assim como no fomento indireto por meio de incentivos fiscais, materializam-se por meio de projetos culturais apresentados ao poder público em planos de trabalho e respectivos orçamentos, os quais devem prestar contas e ser avaliados após sua execução, seja por meio dos resultados esperados, seja por meio de sua execução financeira.
A partir da Lei nº 14.903/2024, todas estas modalidades de fomento direto passam a utilizar-se, em regra, de um instrumento específico do regime próprio de fomento à cultura denominado termo de execução cultural, previsto no art. 4º, inciso I, da referida lei. Embora outros instrumentos possam ser alternativamente utilizados, conforme previsto no art. 2º e no art. 38 da lei, o regime jurídico geral aplicável passa a ser o do Capítulo II da lei, inclusive no que se refere a prestações de contas, com regras básicas previstas no art. 18 da lei.
Ademais, a edição da Instrução Normativa MinC nº 17/2024[3] estabeleceu distinções claras entre instrumentos de transferência voluntária e instrumentos de transferências para organizações da sociedade civil, adotando para estes procedimentos específicos simplificados de análise das prestações de contas, considerando as especificidades do regime próprio de fomento à cultura (Lei nº 14.903/2024) e do Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil (Lei nº 13.019/2014).
Dado o contexto das inovações normativas do regime próprio de fomento à cultura ora apresentado, a presente manifestação jurídica referencial justifica-se na medida em que os instrumentos utilizados para as modalidades de fomento que envolvam projetos culturais estão sendo claramente uniformizados em seus procedimentos de prestação de contas para o alcance de maior eficiência administrativa.
Com esta uniformização, cada vez mais os processos administrativos de prestações de contas destes projetos permitirão uma análise jurídica padronizada em casos repetitivos que envolverão meramente o cotejo de documentos e informações de caráter estritamente técnico relativo ao cumprimento de objeto e execução financeira de orçamentos e planos de trabalho, sendo cada vez mais padronizado também o exame de questões processuais como a ocorrência de prescrição (art. 79 do Decreto nº 11.453/2023 c/c Lei nº 9.873/1999) ou de decadência (art. 18, § 4º, da Lei nº 14.903/2024).
Assim, deixar de atualizar o Parecer Referencial nº 4/2023/CONJUR-MinC/CGU/AGU e voltar a uma sistemática de análises jurídicas individualizadas em processos de prestações de contas e recursos contra decisões em prestações de contas impactaria severamente na celeridade das atividades desenvolvidas pelos órgãos assessorados. Mesmo não sendo obrigatórias tais análises por meio de prévio parecer, a ausência de uma orientação jurídica formal para tantos casos repetitivos levaria a um volume significativo de consultas, especialmente num contexto de plena vigência da força-tarefa instituída pela Portaria SGPTC/SE/MinC nº 2, de 13 de novembro de 2024[5], destinada a mapear e sanear o passivo de prestações de contas do Pronac e da PNCV, incluindo seus programas de intercâmbios culturais, justamente em decorrência das inovações da Instrução Normativa MinC nº 17/2024[3]. A mudança de paradigma de análises das contas, somada à nova demanda de análises em questões jurídicas e técnicas até então pouco enfrentadas pela administração, torna recomendável que se mantenha a orientação por manifestação jurídica referencial, com vistas a otimizar a análise tempestiva de processos em que se podem vir a adotar medidas de elisão de danos ao erário.
Por fim, registre-se ainda que a Instrução Normativa MinC nº 23/2025[4], em seu art. 72, manteve o regramento vigente desde 2023 e estabeleceu que a metodologia de prestação de contas dos projetos culturais do mecanismo de incentivos fiscais deverá ser realizada conforme as normas dos arts. 30 e 51 do Decreto, sendo de R$ 750.000,00 o valor de corte para que o projeto seja considerado de médio porte e possa ter a análise financeira dispensada, restringindo-se à análise da execução física do objeto. Tal critério coloca um elevado número de projetos do mecanismo de incentivo fiscal sujeitos à nova sistemática de prestação de contas e demonstra a pertinência da presente manifestação jurídica referencial, nos termos do art. 3º, § 1º, da Portaria Normativa nº 5/2022/CGU/AGU[6], uma vez que se trata de questão que envolve a decisão de dispensa ou não da análise documental de prestações de contas financeiras em casos repetitivos de projetos culturais, com potencial de ser resolvidos de forma padronizada e suscitando menos consultas individualizadas à Consultoria Jurídica.
Por oportuno, registre-se ainda que a presente manifestação se dá com fundamento no art. 11 da Lei Complementar nº 73/93, subtraindo-se do âmbito da competência institucional deste órgão de assessoramento jurídico análises que importem em considerações de ordem estritamente técnica. Consoante o Enunciado nº 7 das Boas Práticas Consultivas da Advocacia-Geral da União, a manifestação consultiva que adentrar questão jurídica com potencial de significativo reflexo no mérito do ato administrativo deve conter justificativa expressa da necessidade de tal abordagem, evitando posicionamentos conclusivos sobre matéria que envolva o exame de conveniência ou oportunidade de tais atos. Em se tratando de manifestação jurídica referencial, que consiste em abordagem abstrata e padronizada de temas jurídicos repetitivos, sobressai a necessidade de reforçar o caráter não vinculante das orientações ora proferidas, que podem suscitar pronunciamento específico em caso de dúvidas pontuais sobre casos concretos, sempre que os gestores e autoridades assessoradas considerem necessário.
III - Da integração do Sistema Nacional de Financiamento da Cultura e do Regime Próprio de Fomento à Cultura.
A regulamentação unificada dos sistemas de financiamento da cultura conferiu ao Decreto nº 11.453/2023 o status de política estruturante do Sistema Nacional de Cultura (SNC) previsto no art. 216-A da Constituição Federal, na medida em que permitiu o tratamento uniforme dos mecanismos orçamentários e das modalidades de fomento comuns às políticas e programas existentes na legislação. A estruturação do Capítulo II do decreto foi ao encontro desta diretriz, ao consolidar em um único ato normativo todas as modalidades do chamado fomento direto à cultura, isto é, aquele executado diretamente a partir do orçamento da União – seja com recursos de dotações orçamentárias diversas, ou, no modelo mais tradicional e preconizado no Plano Nacional de Cultura (Lei nº 12.343/2010, art. 5º), por meio do Fundo Nacional de Cultura.
Com relação ao fomento indireto, o Capítulo III e o Capítulo IV da minuta regulamentaram a Lei nº 8.313/1991, com inovações normativas no capítulo referente ao mecanismo de incentivos fiscais, fortalecendo diretrizes de governança e modalidades de incentivo combinadas com ações afirmativas por meio editais de chamamento público, qualificando os projetos apresentados sob o aspecto de aderência às políticas públicas do Ministério da Cultura (art. 50 do Decreto nº 11.453).
Esta sistematização consolidou-se no Capítulo III da Lei nº 14.903/2024, que qualificou as fontes de financiamento à cultura.
Para o presente parecer, entretanto, importa destacar que o Decreto nº 11.453/2023, mais do que tratar de forma minuciosa e abrangente os mecanismos orçamentários do Sistema Nacional de Financiamento à Cultura, também introduziu de forma analítica as modalidades de fomento à disposição da administração pública federal, estadual ou municipal para celebração de parcerias entre si ou com o setor privado, especialmente, mas não exclusivamente, com o terceiro setor.
No art. 8º, o Decreto nº 11.453/2023 estabelece que os recursos dos diversos mecanismos de fomento direto poderão ser aplicados nas modalidades de (i) projetos culturais, incluídas aí a execução de ações culturais e a manutenção de espaços culturais elencadas nos incisos I do artigo; ou ainda mediante (ii) concessão de prêmios ou bolsas culturais, elencados nos incisos II e IV do artigo; sem prejuízo de outras modalidades diversas de aplicação que venham a ser instituídas em ato da Ministra de Estado da Cultura, com aplicações variadas ou mesmo mistas das modalidades existentes.
Para o escopo do presente parecer, importa analisar as modalidades que envolvem a execução de projetos culturais, formatados a partir de planos de trabalho com orçamentos ou metas a serem atingidas e prestações de contas a serem apresentadas ao término de sua execução, diferentemente das bolsas e prêmios, que se caracterizam como doações que se incorporam ao patrimônio dos beneficiários.
Nos arts. 22, 23 e 35, o Decreto nº 11.453/2023 menciona os instrumentos jurídicos específicos disponibilizados pela legislação às modalidades de fomento à cultura atinentes a projetos com fomento direto. Termos de Compromisso Cultural, instituídos pela Lei nº 13.018/2014; Termos de Fomento, Termos de Colaboração e Acordos de Cooperação, instituídos pela Lei nº 13.019/2014; Termos de Execução Cultural, respaldados nos procedimentos estabelecidos pela Lei Complementar nº 195/2022 e mais recentemente pela Lei nº 14.903/2024; e contratos de financiamento reembolsável, instituídos pela Lei nº 8.313/1991; encontram-se disciplinados de forma didática de modo a atender às finalidades das legislações de cultura, sem conflitar com o regramento específico já estabelecido para instrumentos com abrangência para toda a administração pública. No caso do fomento indireto, a estruturação deste mecanismo em torno da modalidade de projetos é regra decorrente do art. 19 da Lei nº 8.313/1991 e da regulamentação do Ministério, atualmente consubstanciada na Instrução Normativa MinC nº 23/2025.
Com o advento da Lei nº 14/903/2024, o Regime Próprio de Fomento à Cultura passou a consagrar o Termo de Execução Cultural como o instrumento por excelência para o fomento direto nas modalidades de execução de ações culturais e apoio a espaços culturais, formatados em projetos culturais (art. 4º, inciso I, e arts. 12 e 13 da Lei nº 14.903/2024), ao passo que para o fomento indireto, por não haver repasses, não existe um instrumento bilateral firmado entre as partes, mas uma autorização de captação de patrocínio outorgada ao proponente por meio de portaria, sendo as obrigações de prestação de contas decorrentes diretamente da legislação de regência.
IV - Inovações na prestação de contas de projetos culturais.
Na esteira da Lei Paulo Gustavo (Lei Complementar nº 195/2022) e do Decreto nº 11.453/2023, a Lei nº 14.903/2024 consolidou uma série de inovações que resultam na adoção de um novo paradigma de prestação de contas para as parcerias na área cultural, seja no que tange aos projetos culturais aprovados no mecanismo de incentivos fiscais do fomento indireto, seja no caso dos diversos instrumentos jurídicos firmados no âmbito do fomento direto.
A Lei Paulo Gustavo reforçou no ordenamento jurídico um paradigma que se formava desde a marco regulatório das parcerias com organizações da sociedade civil (Lei nº 13.019/2014) e a Política Nacional de Cultura Viva (Lei nº 13.018/2014), passando a prever de forma ampla uma metodologia de prestação de contas com foco no cumprimento do objeto e escalonada de estágios mais simplificados até estágios mais detalhados conforme a necessidade, independentemente das modalidades ou instrumentos jurídicos utilizados. Por conseguinte, suas prestações de contas tornam-se mais simplificadas, uma vez que voltadas mais para o cumprimento do objeto pactuado e menos para sua execução financeira, a qual passa a ter relevância secundária como mecanismo de controle, apenas na apuração de desvios e irregularidades.
Estas inovações materializaram-se em diversos dispositivos do Decreto nº 11.453/2023 e da Lei nº 14.903/2024, encontrando-se atualmente sedimentados também na atual Instrução Normativa MinC nº 17/2024[3] e na Instrução Normativa MinC nº 23/2025[4], para projetos de fomento indireto, conforme se observará nos tópicos a seguir.
V - Descabimento das regras aplicáveis a transferências voluntárias aos incentivos e transferências para o setor privado.
De início, é importante observar que a Instrução Normativa MinC nº 17/2024 passou a distinguir de forma expressa os instrumentos de transferência voluntária, para execução de parcerias do setor público, dos instrumentos de transferência para organizações da sociedade civil, destinados à execução de parcerias entre o setor público e o terceiro setor. Embora tais parcerias já contassem com regimes jurídicos próprios, a edição de tal instrução contribuiu para tal tratamento diferenciado, na medida em que exigiu que as distintas modalidades de transferência estejam expressas nas normas de cada programa de governo, nos editais, nos instrumentos de celebração da parceria e em todos os seus meios de divulgação, a fim de evitar ambiguidade de entendimentos quanto ao regime jurídico aplicável à sua execução, monitoramento e avaliação.
De modo especial, a IN MinC nº 17/2024 evidencia a impossibilidade de aplicar aos instrumentos com o terceiro setor qualquer exigência exclusiva de instrumentos de transferências voluntárias, seja no que se refere à celebração e execução das parcerias, seja no que se refere ao monitoramento e prestação de contas, objeto do presente parecer, conforme disposto em seus arts. 2º e 3º:
Art. 2º As modalidades de transferências discricionárias no âmbito do Ministério da Cultura deverão estar expressas nos seus programas, editais e demais materiais, a fim de evitar a ambiguidade de entendimentos, observando-se o seguinte:
I - são instrumentos de Transferência Voluntária: convênio, contrato de repasse e instrumentos congêneres firmados entre órgãos ou entidades de diferentes esferas da federação; e
II - são instrumentos de Transferência para Organizações da Sociedade Civil: termo de fomento, termos de colaboração, termo de compromisso cultural e instrumentos congêneres firmados com organizações da sociedade civil.
Art. 3º É vedada a aplicação de quaisquer exigências atinentes às Transferências Voluntárias em instrumentos celebrados com fundamento na Lei nº 13.019, de 31 de julho de 2014, na Lei nº 13.018, de 22 de julho de 2014 e nas Lei nº 14.903, de 27 de junho de 2024.
Neste sentido, cabe pontuar que as disposições da Portaria Conjunta MGI/MF/CGU nº 33/2023[7] e da Portaria Conjunta MGU/MF/CGU nº 28, de 21 de maio de 2024, por tratarem de normas complementares ao Decreto nº 11.531/2023, aplicam-se tão-somente a instrumentos de transferência voluntária, isto é, convênios, contratos de repasse e instrumentos congêneres firmados entre órgãos ou entidades de diferentes esferas da federação. Para o monitoramento e avaliação de tais parcerias, aplicam-se as orientações do Parecer Referencial nº 2/2024/CONJUR-MinC/CGU/AGU[8] (parágrafos 208 a 213) e do Parecer Referencial nº 4/2024/CONJUR-MinC/CGU/AGU[9] (parágrafos 193 a 200), ou de suas futuras reedições, tendo em vista que tais pareceres tiveram seus prazos de validade recentemente expirados.
Tal orientação, inclusive, já se encontrava prevista também no Parecer Referencial nº 3/2024/CONJUR-MinC/CGU/AGU[10], que tratava da celebração de termos de fomento e termos de colaboração no âmbito do Ministério da Cultura, verbis:
30. Vale notar, ainda, que os repasses de recursos a entidades privadas, nos termos da Lei nº 13.019/2014 e do Decreto nº 8.726/2016, não caracterizam transferências voluntárias, conforme definidas no art. 25 da Lei Complementar nº 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal).
31. Por esse motivo, o art. 84 da Lei nº 13.019/2014 estabelece que não se aplica às parcerias regidas por esta Lei o disposto na revogada Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, cujo art. 116 rege os convênios (estes sim transferências voluntárias) - previsão correspondente ao art. 184 da Lei nº 14.133, de abril 2021. E no mesmo sentido, o art. 2º da Portaria Conjunta nº 33/2023 (que disciplina os convênios) estabelece que não se aplicam as exigências da Portaria Conjunta aos termos de colaboração, termos de fomento e acordos de cooperação celebrados com organizações da sociedade civil.
32. Existem apenas duas exceções a esta regra, ou seja, hipóteses em que a legislação sobre convênios aplica-se a entidades privadas:
a) O art. 3º, inciso IV, da Lei n. 13.019/2014, estabelece que não se aplicam as exigências da Lei (MROSC) aos convênios e contratos celebrados com entidades filantrópicas e sem fins lucrativos nos termos do § 1º do art. 199 da Constituição Federal (ou seja, as entidades que atuam de forma complementar do sistema único de saúde). Por sua vez, o art. 13, inciso VI, da Portaria Conjunta nº 33/2023 estabelece que poderão ser celebrados convênios com as entidades privadas sem fins lucrativos de que trata o art. 199, § 1º, da Constituição Federal.
b) O art. 3º, inciso X, da Lei nº 13.019/2014, estabelece que não se aplicam as exigências da Lei (MROSC) às parcerias entre a administração pública e os serviços sociais autônomos. Por sua vez, o Decreto nº 11.531, de 16 de maio de 2023 (que dispõe sobre convênios), estabelece que o instrumento de parceria a ser celebrado com os serviços sociais autônomos é o convênio.
33. Portanto, vale frisar, não se aplica às parcerias celebradas com organizações da sociedade civil a legislação que rege os convênios, nomeadamente a Lei de Licitações e Contratos e a Portaria Conjunta nº 33/2023 (e suas antecessoras), seja na fase de seleção, de execução ou de prestação de contas.
O mesmo entendimento aplica-se no âmbito da Política Nacional de Cultura Viva (PNCV), seja em função do art. 2º da citada Instrução Normativa MinC nº 17/2024, seja por força da Instrução Normativa MinC nº 1/2015[2] (atualizada pela IN nº 8/2016), que em seu Capítulo VI, Seção VI (arts. 41 a 43) e Capítulo VII (arts. 44 a 54) estabelece regras específicas de monitoramento e prestação de contas para os Termos de Compromisso Cultural (TCC), dentre as quais destacamos (i) a subsidiariedade do Relatório de Execução Financeira, nos termos do art. 45, (ii) prazos específicos para apresentação dos relatórios pelas organizações parceiras e análise das prestações de contas pela administração (arts. 44 e 47), bem como (iii) critérios próprios para reprovação ou aprovação com ressalvas das prestações de contas dos TCC (arts. 49 e 51). Tal entendimento já havia sido aventado no Parecer Referencial nº 7/2023/CONJUR-MinC/CGU/AGU[11], que trata especificamente da celebração de TCC.
Ainda com relação a esse tema, é importante ressaltar que a adoção de procedimentos informatizados de análise de prestações de contas por meio de trilhas de auditoria encontra-se atualmente disciplinada para convênios e contratos de repasse por meio da Portaria Conjunta MGI/CGU nº 41/2023[12], além da Portaria MinC nº 124/2024[13], que estabelece no âmbito do ministério os limites de tolerância de risco para análise informatizada de prestação de contas de convênios e repasses. Portanto, tais normativas não se aplicam aos instrumentos de fomento direto ao setor privado objeto do presente parecer, conforme elucidado na seção II e no § 21 deste parecer.
No entanto, no que tange ao fomento indireto, é importante destacar que a Instrução Normativa nº 23/2025[4], em seu art. 66, § 1º, estabelece que o monitoramento da execução dos projetos – isto é, o acompanhamento do projeto durante sua vigência e antes da apresentação da prestação de contas – será realizado de forma automatizada mediante comprovação documental pelo próprio proponente no Sistema de Apoio às Leis de Incentivo à Cultura (Salic), à medida em que executa o projeto. E em seu art. 72, inciso III, tal IN estabelece ainda que o relatório de execução do objeto e o relatório de execução financeira serão exigidos juntamente com os dados do monitoramento referido no art. 66, o que permite a utilização de análises preditivas nas prestações de contas dos projetos de incentivos fiscais regidos pela IN MinC nº 23/2025, podendo integrar os relatórios de execução de objeto e de execução financeira, simplificando a elaboração de tais relatórios. Embora tal regramento não permita diretamente a aplicação da Portaria MinC nº 124/2024 ao mecanismo de incentivos fiscais da Lei Rouanet, abre espaço para que eventualmente sejam estabelecidos parâmetros de tolerância de risco para a simplificação dos relatórios de execução física e financeira também de tais projetos.
VI - Da possibilidade de aprovação de prestações de contas com base no cumprimento do objeto, dispensando-se a análise financeira.
O Marco Regulatório das Parcerias com Organizações da Sociedade Civil – MROSC (Lei nº 13.019/2014) e a Política Nacional de Cultura Viva – PNCV (Lei nº 13.018/2014) representaram grande inovação institucional na regulação de instrumentos de parceria próprios para as relações da União com o terceiro setor, inclusive instrumentos específicos para a área cultural. Com a instituição do termo de fomento, do termo de colaboração e do termo de compromisso cultural, firmados com foco nos resultados e elaborados com base em metas e indicadores a serem cumpridos, as prestações de contas tornam-se mais simplificadas, uma vez que voltadas mais para o cumprimento do objeto pactuado e menos para sua execução financeira, a qual passou a ter relevância secundária como mecanismo de controle na apuração de desvios e irregularidades. Tais diretrizes encontram-se previstas nos arts. 63 a 66 da Lei nº 13.019/2014, para termos de fomento e termos de colaboração, e nos arts. 44 e 45 da Instrução Normativa MinC nº 1/2015[2], para termos de compromisso cultural.
Com o Decreto nº 11.453/2023, esse movimento do MROSC e da PNCV, além de se consolidar para outros instrumentos de fomento direto instituídos posteriormente, também passou ser utilizado para o fomento indireto. Em seu art. 51, tal decreto passou a admitir também no fomento indireto uma metodologia de prestação de contas estabelecida a partir de matriz de risco, com critérios de escalonamento em que a análise da prestação de contas financeira só seria exigível em projetos a partir de um determinado valor, para projetos de médio ou grande porte.
Atualmente, este valor está definido no art. 72 da Instrução Normativa MinC nº 23/2025[4], sendo de R$ 750.000,00 (setecentos e cinquenta mil reais). A partir deste valor, a prestação de contas financeira da execução do projeto deve ser analisada, vedada a simples prestação de informações atinentes ao cumprimento do objeto, sendo que a partir de R$ 5.000.000,00 (cinco milhões de reais), uma nova camada de controle é adicionada, com o monitoramento automatizado da conformidade financeira do projeto durante sua execução, com base em modelo preditivo de prestação de contas (arts. 66 e 72, inciso III, da IN nº 23/2025). Além disso, nos projetos de pequeno porte, até R$ 200.000,00 (duzentos mil reais), a análise da prestação de contas poderá ocorrer in loco, com dispensa a avaliação financeira, nos termos do art. 30 do Decreto nº 11.453/2023.
Com a Lei nº 14.903/2024 (art. 18, § 1º), a prestação de contas in loco por meio de visita técnica para aferição de cumprimento de objeto em projetos de até R$ 200.000,00 (duzentos mil reais) passou a ser a regra também para os Termos de Execução Cultural (TEC), o que torna este instrumento preferencial em relação aos instrumentos de fomento direto do MROSC quando tal forma de prestar contas seja considerada mais apropriada para a ação cultural executada, tendo em vista que no MROSC não existe previsão legal de prestação de contas exclusivamente in loco por meio de vistoria para projetos de baixo valor, com dispensa de apresentação de relatórios pela organização parceira.
Voltando ao fomento indireto, cabe ainda reforçar o que foi mencionado na seção anterior a respeito do art. 72, inciso III, da Instrução Normativa MinC nº 23/2025, segundo o qual o relatório de execução do objeto e o relatório de execução financeira são exigidos juntamente com os dados do monitoramento preditivo e automatizado referido no art. 66 da IN. Tal regramento abre espaço para a simplificação dos relatórios de execução física e financeira em projetos do mecanismo de incentivos fiscais do Pronac, sempre que o monitoramento automatizado puder substituir eficientemente os procedimentos de análise da execução financeira dos projetos. Nesse sentido, há de se observar o disposto nos arts. 70 e 71, que respectivamente indicam (i) os documentos comprobatórios que devem ser apresentados no sistema Salic ao longo da execução do projeto para fins de monitoramento automatizado, diretamente relacionados à execução financeira, e (ii) os documentos que devem compor o relatório final do proponente e ser apresentados no prazo de 60 (sessenta dias) do término da vigência do projeto, relacionados diretamente ao cumprimento do objeto.
VII - Retroatividade e irretroatividade das regras sobre critérios de análise das prestações de contas.
A partir da publicação da Instrução Normativa nº 1/2023/MinC, conforme previsto no § 2º do seu art. 80, suas regras passam a se aplicar aos projetos pendentes de julgamento de prestação de contas, desde que não se refiram a relativas a critérios e condições para aprovação de projetos, conforme estabelecido no caput do artigo.
As regras que se aplicam imediatamente a projetos referem-se a critérios processuais de análise e aprovação de prestação de contas, não abrangendo regras materiais que estabelecem condições de aprovação dos projetos culturais. Para estas, aplica-se o disposto no § 1º do art. 80 da nova instrução normativa, com base no art. 78 do Decreto nº 11.453/2023.
Ou seja, as normas e condições sob as quais um determinado projeto foi aprovado permanecem válidos entre as partes até o final de sua execução, e, nesta extensão, determinam o julgamento das prestações de contas, embora não impeçam a aplicação das regras processuais de análise e aprovação da nova instrução normativa.
Com este entendimento, é válido considerar aplicável a regra de dispensa de análise financeira a projetos que estejam em valor abaixo do nível de corte estabelecido na instrução normativa vigente para projetos de médio porte. Porém, caso esta análise já tenha sido realizada no caso concreto, sua desconsideração deve ser motivadamente expressa na decisão de aprovação ou reprovação das contas, especialmente se suas orientações estiverem em contradição com a decisão ao final adotada, conforme exposto na seção seguinte deste parecer.
Tal princípio de irretroatividade também se reflete na Instrução Normativa MinC nº 23, 2025[4], na forma do enunciado mais simples contido no seu art. 96: "As disposições desta Instrução Normativa aplicam-se aos projetos em andamento, respeitados os direitos adquiridos pelo proponente". Como exemplo de regras que geram direito adquirido ou ato jurídico perfeito, além das próprias condições do ato de aprovação do projeto, podemos citar as regras de alterações de projetos elencadas no art. 65 da IN nº 23/2025/MinC. Eventuais alterações supervenientes em tais regramentos não podem gerar impacto sobre as condições materiais estabelecidas em projetos alterados sob sua vigência.
Portanto, por mais que o regime jurídico do Marco Regulatório do Fomento à Cultura tenha ampliado sobremaneira a simplificação da prestação de contas e seus critérios de análise, inclusive no fomento indireto, não se afigura possível simplesmente desconsiderar análises financeiras conclusivas já realizadas em processos nos quais tais análises seriam em tese dispensadas pelas regras em vigor, devendo, se for o caso, ser expressamente refutadas por meio de novas análises financeiras que apontem suas falhas e nulidades.
No que tange ao MROSC, o art. 83 da Lei nº 13.019/2014 estabelece uma regra geral de irretroatividade para as parcerias celebradas anteriormente à entrada em vigor da lei, porém com a ressalva de possibilidade de sua aplicação subsidiária a tais parcerias, desde que em benefício do alcance do objeto da parceria. Em aderência ao entendimento acima, entende-se que essa aplicação subsidiária está condicionada à inexistência de direitos adquiridos reclamados pelas partes.
VIII - Da revisão de atos administrativos para aplicação de novas regras procedimentais.
Em aderência ao entendimento formulado na seção anterior, entende-se que a revisão de pareceres de análise de prestações de contas, sejam eles de cumprimento de objeto ou de execução financeira, somente se pode dar para eventual aplicação imediata de regras processuais de análise e julgamento de contas, não sendo possível tal revisão quando importem em rever as condições materiais sob as quais os projetos tenham sido aprovados, em virtude da necessidade de respeitar direitos adquiridos e atos jurídicos perfeitos consolidados entre as partes pactuantes.
Neste sentido, não é possível, por exemplo, revisar atos administrativos que tenham apurado descumprimento de regras de limites de despesas, visto que tais regras impactam no projeto de forma objetiva.
Por outro lado, é possível, por exemplo, revisar pareceres que, em atividade de monitoramento ou fiscalização, tenham glosado despesas em razão da mera ausência de documentos em projetos que, pelas regras da nova instrução normativa, estariam dispensados de apresentá-los, uma vez que a mera ausência de documentos não comprova o descumprimento de execução do projeto.
Importante considerar que tal orientação não afasta a possibilidade de revisão de qualquer decisão administrativa em sede de recurso ou pedido de reconsideração, quando a autoridade modificar o julgamento sobre questões de fato ou mesmo de direito trazidas pela recorrente, pois se trata de prerrogativa inerente à função recursal, independentemente da questão relativa às modificações normativas. O entendimento aqui exposto diz respeito exclusivamente à revisão de pareceres técnicos por motivos de aplicação intertemporal de regras para fins de aplicação de metodologias simplificadas de prestação e análise de contas.
IX - Dos resultados dos julgamentos de prestações de contas: o exame de finalidade como parâmetro para cumprimento de objeto e sua precedência à análise da prestação de contas financeira do projeto.
O entendimento esposado acima não implica que as áreas técnicas competentes estejam impedidas de diligenciar parceiros ou proponentes por documentos comprobatórios em sede de monitoramento ou prestação de contas pelo simples fato de que os regulamentos dispensem documentação detalhada da execução financeira de um dado projeto cultural. Cabe à área técnica de prestação de contas avaliar a necessidade de exigir ou não documentação mais detalhada a respeito do cumprimento de objeto ou da realização de despesas específicas para verificar se houve ou não o devido cumprimento do objeto do projeto. Esta prerrogativa sempre foi exercida de forma relativamente discricionária pelos analistas de prestações de contas, conforme as circunstâncias de cada projeto, e relaciona-se diretamente com a capacidade de determinar a existência ou não de desvio de objeto ou desvio de finalidade na execução de um projeto cultural, considerado o desvio de objeto como uma manifestação objetiva do desvio de finalidade.
A jurisprudência[14] do Tribunal de Contas da União se direciona no sentido de que a busca da finalidade cultural de um projeto pode ser considerada fator relevante para que modificações no objeto sejam descaracterizadas como desvio de objeto, justamente porque o objeto se subordina à finalidade. Neste sentido, características acidentais (não essenciais) do objeto podem ser modificadas sem que este desvio de objeto seja considerado relevante para uma reprovação da prestação de contas do projeto. A realização de despesas com itens não previstos expressamente, a substituição de itens de despesa por outros similares, ou mesmo a realização de despesas em quantidades ou em valores diversos dos expressamente previstos em orçamento podem ou não integrar esta avaliação, conforme cada caso em concreto, desde que não desrespeitem normas condicionantes da aprovação do projeto.
As já revogadas Instruções Normativas nº 1/2023 e nº 11/2024, assim como a IN nº 23/2025/MinC, atualmente em vigor, inovaram o processo de análise das prestações de contas pelo fato de a análise de objeto preceder a análise da execução financeira, bem como pelo fato de a análise financeira poder ser dispensada em determinadas hipóteses. Com isso, esta prerrogativa dos analistas de avaliar a pertinência de itens de despesa com o cumprimento de objeto, que sempre contou com alto grau de discricionariedade no momento da análise, agora passa a ser exercida com maior moderação no que diz respeito à execução financeira, uma vez que a análise de cumprimento de objeto será realizada não apenas como uma etapa prévia, mas vinculante para a análise financeira.
Neste sentido, não é mais possível, por exemplo, dentro do regramento da nova instrução normativa, que uma análise de execução financeira, ao se debruçar sobre a execução de itens de despesas específicos, conclua pela reprovação de um projeto por entender que tais itens resultam em descumprimento de objeto, uma vez que tal análise já estaria superada.
Em tal hipótese, havendo obrigatoriedade de parecer financeiro, deve o processo retornar para a fase de análise de objeto, a fim de que haja um reexame desta contradição, e eventualmente, se entenda pelo descumprimento total ou parcial do objeto, resultando em "reprovação". Fora desta hipótese, apenas inconsistências financeiras que não impactem na avaliação do objeto podem ser objeto de glosa e ter seguimento no julgamento das contas sem que o parecer/relatório de objeto seja revisto, podendo resultar em "aprovação com ressalvas", devendo ser especificada a ressalva no parecer/relatório.
É importante destacar que, com a aproximação das metodologias de análise de todos os instrumentos de fomento direto e indireto, os critérios de julgamento também se tornaram similares na legislação, embora haja diferenças sutis na forma como os regulamentos os descrevem. De um modo geral, em todos os casos o critério para reprovação (rejeição) da prestação de contas é, primordialmente, o descumprimento do objeto de forma injustificada, que resulta em desvio de finalidade do projeto. Embora o dano ao erário também apareça descrito nas normas de cada instrumento como uma causa de reprovação, em geral tal dano é aferido a partir de uma análise de cumprimento do objeto, cujas falhas ensejam uma análise pormenorizada da execução financeira do projeto.
Neste sentido, inclusive, é o art. 21, incisos III e IV, da Lei nº 14.903/2024, onde se estabelece que nos Termos de Execução Cultural (i) a aprovação com ressalvas é cabível quando, apesar de cumprido o objeto, verifica-se alguma inadequação na execução do objeto ou na execução financeira, sem má-fé. A contrario sensu, (ii) a rejeição da prestação de contas tem lugar quando o objeto é descumprido, resultando ou em desvio de finalidade (desvio de objeto injustificado), ou em dano ao erário (desvio financeiro), com ou sem má-fé. Este critério legal no novo Marco Regulatório do Fomento à Cultura baliza as legislações precedentes e os regulamentos infralegais em vigor, especialmente diante do já citado princípio geral da subordinação da análise financeira à análise de objeto, conforme se verá a seguir.
56. 1. No âmbito do MROSC, o art. 72 da Lei nº 13.019/2014 e o art. 66, §§ 2º e 3º, do Decreto nº 8.726/2016 estabelecem que as prestações de contas estão sujeitas a "aprovação com ressalva" quando cumprido o objeto, mas com evidências de "impropriedade ou qualquer outra falta de natureza formal que não resulte em dano ao erário" (destacando que irregularidades financeiras de pequeno vulto e sem má-fé não caracterizam dano ao erário), e sujeitas a "reprovação" quando comprovada a omissão da prestação de contas ou atos que importem em ilegalidade, descumprimento injustificado de objeto ou dano ao erário.
56.2. Para as parcerias da PNCV, os arts. 49 e 51 da IN MinC nº 1/2015[2] estabelecem que a "aprovação com ressalva" tem lugar quando constatada a existência de impropriedades ou falhas formais que não caracterizem desvio de finalidade ou descumprimento de objeto, citando exemplos como o uso irregular das marcas de governo, falhas na proteção a direitos autorais e outras falhas de "baixa gravidade" financeira ou para o objeto; devendo ser reprovadas (rejeitadas) apenas nos casos de omissão no dever de prestar contas, desvio de finalidade, descumprimento injustificado de objeto (que equivale a desvio de finalidade), ou dano ao erário na execução financeira (o que não abrange falhas financeiras de "baixa gravidade", isto é, aquelas que não importem em desvio de finalidade).
56.3. No mecanismo de incentivos fiscais da Lei Rouanet, o art. 77 da IN MinC nº 23/2025[4] diz que a prestação de contas do projeto deve ser aprovada com ressalvas quando, embora cumprido o objeto, ainda seja detectada alguma "inadequação de ordem financeira", sem dolo, ou ainda desconformidades no objeto do projeto que não importem em descumprimento injustificado de objeto ou desvio de finalidade, com exemplos citados nas alíneas "b" a "h" do inciso II do artigo. Outrossim, a reprovação tem lugar nas hipóteses de "omissão no dever de prestar contas" ou "dano ao erário" por má-fé ou descumprimento de objeto.
Tanto para o fomento direto como para o indireto, é importante destacar que, sempre que identificada, a inconsistência financeira deve ser apontada no relatório ou parecer de análise financeira, a fim de que a ressalva possa ser registrada no ato de aprovação com ressalvas, ou então para que o processo retorne para revisão do parecer de análise de objeto. E, caso o parecer financeiro seja dispensável, em virtude do porte do projeto (com respaldo nos arts. 30 ou 32 do Decreto nº 11.453/2023 ou no art. 72 da IN MinC nº 23/2025) mas já tenha sido realizado, este reexame de eventuais contradições poderá ser feito no bojo da própria decisão da autoridade competente, caso entenda desnecessária nova manifestação da área técnica.
X - Da força probante dos documentos de execução financeira.
Os regulamentos do Ministério da Cultura relativos aos procedimentos para apresentação, aprovação, acompanhamento, monitoramento e prestação de contas dos projetos culturais executados pelo mecanismo de incentivos fiscais do Pronac sempre permitiram ao proponente a comprovação da execução física e financeira de seus projetos por todos os meios aptos a demonstrar a efetiva realização do objeto e o devido nexo de causalidade entre as despesas e as metas (produtos e ações) do projeto.
O art. 73, § 1º, da IN MinC nº 1/2010, o art. 79, § 1º, da IN MinC nº 1/2012, o art. 83, § 1º, da IN MinC nº 1/2013, já falavam em faturas, recibos, notas fiscais, cheques e quaisquer outros documentos aptos a demonstrar a discriminação dos produtos e serviços utilizados no projeto. Redações similares foram adotadas nos regramentos supervenientes, até chegarmos à atual redação da IN MinC nº 23/2025, que em seu art. 70 trata da apresentação de documentação comprobatória da execução financeira ao longo da execução do projeto por meio das ferramentas de análise automatizada do sistema Salic, e em seu art. 71 trata das comprovações da execução do objeto necessárias ao relatório final do projeto.
No Parecer nº 408/2011/CONJUR-MinC/CGU/AGU (Processo 01400.018347/2011-20), esta Consultoria Jurídica já apontava para a previsão do Acórdão nº 2261/2005 do TCU no sentido de que a comprovação de despesas, no caso de fornecedor pessoa jurídica, poder ser realizada por meio de “notas fiscais ou documentos fiscais equivalentes”. No mesmo sentido, o Parecer nº 620/2012/CONJUR-MinC/CGU/AGU já asseverou que “documentos diferentes devem ser tomados como indícios probatórios e, estes, em cotejo com outras informações em poder da Administração podem conduzir a um juízo de verossimilhança da alegação”. E o Despacho nº 1004/2014/CONJUR-MinC/CGU/AGU (Processo 01400.005428/2005-11) já firmou o entendimento de que “no âmbito da relação jurídica constituída entre Ministério da Cultura e proponente, isto é, no que se refere à prestação de contas do projeto, cabe a este comprovar [apenas] o nexo de causalidade entre a despesa realizada e o bem ou serviço executado no projeto”, não sendo dele “o ônus de diligenciar para que o seus fornecedores observem a legislação tributária e emitam notas fiscais livres de irregularidades”.
É certo, todavia, que se uma determinada despesa consta dos extratos bancários do projeto e não é demonstrada ou sequer correlacionada em nenhum outro documento apresentado na fase de monitoramento preditivo ou em relatório de prestação de contas, não há como se afirmar se foi uma despesa realizada no objeto do projeto, e pode vir a ser glosada se, diligenciado, o proponente não sanar a inconsistência. Ao final da análise, se não for sanada, tal inconsistência pode resultar em ressalva na aprovação das contas, se não houver indício de má-fé, ou mesmo em reprovação (com necessidade de devolução) se ficar demonstrado o desvio de finalidade na execução dessa despesa, resultando em dano ao erário.
XI - Da presunção de veracidade e suficiência dos modelos preditivos de conformidade estabelecidos com base em matriz de risco.
Conforme já elucidado na Seção V deste parecer, no que se refere a fomento direto, a adoção de procedimentos informatizados de análise de prestações de contas por meio de trilhas de auditoria encontra-se positivada apenas para convênios e contratos de repasse, por meio da Portaria Conjunta MGI/CGU nº 41/2023[12] e da Portaria MinC nº 124/2024[13], não aplicáveis aos instrumentos de fomento do MROSC ou da PNCV. Porém, no que se refere ao fomento indireto, o art. 66, § 1º, combinado com o art. 72, inciso III, da IN MinC nº 23/2025[4] permite a utilização de análises preditivas realizadas em fase de monitoramento nas prestações de contas dos projetos de incentivos fiscais, simplificando a elaboração dos relatórios de execução financeira e de objeto.
A possibilidade de análise automatizada de prestações de contas, porém, não afasta a possibilidade de reprovação da contas de um projeto que tenha passado por todas as trilhas de auditoria, relatórios de monitoramento e instrumentos análogos sem apresentar qualquer inconsistência, pois a análise financeira não se restringe às inconsistências detectadas em tais procedimentos padronizados, ou apenas a partir de denúncias, podendo o analista responsável analisar toda a documentação pertinente à execução financeira do projeto, além de ter a prerrogativa de, motivadamente, requerer em diligência a complementação da documentação apresentada, sempre que identificar indícios de fraude ou má-fé na execução dos recursos do projeto.
A Instrução Normativa MinC nº 23/2025, em seu art. 95, reproduzindo dispositivos de regulamentos anteriores, prevê a possibilidade de diligenciar o proponente para solicitar documentos ou informações complementares, sempre que julgar necessário, como no caso de insuficiência da documentação apresentada. Ademais, em seu art. 70, parágrafo único, o atual regulamento também prevê a possibilidade de acesso direto do ministério a informações e documentos fiscais eletrônicos, mediante autorização do proponente junto à Receita Federal.
No entanto, é relevante reiterar que a nova sistemática de prestação de contas implantada por meio da Instrução Normativa MinC nº 1/2023 e mantida na Instrução Normativa MinC nº 23/2025 atribui ao cumprimento do objeto a função primordial da prestação de contas, de modo que a comprovação da execução financeira possui caráter meramente instrumental, para (i) auxiliar na comprovação de objeto e (ii) prevenir a malversação dos recursos. Neste sentido é que o art. 66, § 1º, da nova Instrução Normativa estabelece que a comprovação da execução do projeto é realizada ao longo da execução por meio de monitoramento automatizado, por meio de análise preditiva sobre vários parâmetros do projeto, simplificando a análise da prestação de contas ao final do projeto.
A metodologia de análise de prestação de contas prevista no art. 72 da nova instrução normativa decorre do próprio Decreto nº 11.453/2023, que consolida o novo paradigma de prestação de contas com foco no resultado ao estabelecer a possibilidade de, com base e matriz de risco, dispensar a análise financeira de projetos de pequeno porte, de forma a otimizar a capacidade estatal na análise de processos onde o risco é maior, partindo do pressuposto de que as análises preditivas realizadas ao longo dos projetos é capaz de promover uma devida avaliação e controle de processos.
Portanto, o paradigma estabelecido na nova regulamentação do Pronac permite ao gestor e ao analista de prestações de contas adotar a presunção de veracidade dos fatos apurados com base nos relatórios automatizados de análise preditiva e outros mecanismos de conformidade que venham a ser estabelecidos para os diversos mecanismos de fomento à cultura. Certamente não se trata de uma presunção absoluta, pois pode ser afastada mediante comprovação de fraude por quaisquer meios juridicamente viáveis, mas, uma vez estabelecida tal presunção de veracidade, a requisição de documentos adicionais deve estar devidamente motivada para que justifique medidas excepcionais de comprovação dos fatos.
Em outras palavras, quando da análise de prestações de contas de projetos que, dentro da matriz de riscos aprovada nas normas do ministério, não exijam maior detalhamento de sua execução financeira, é recomendável uma explicitação pormenorizada das suspeitas ou denúncias que deem respaldo a tais medidas e diligências excepcionais.
Com relação à severidade das sanções decorrentes de tais procedimentos excepcionais, trata-se de questão que dependerá de cada caso concreto, podendo ou não resultar em reprovação da prestação de contas, conforme as circunstâncias já elucidadas na seção IX deste parecer.
XII - Procedimentos para elisão ou ressarcimento de danos.
Das ações compensatórias.
O ressarcimento ao erário mediante ações compensatórias encontra previsão legal no § 2º do art. 72 da Lei nº 13.019/2014, para os instrumentos do MROSC; no art. 53 da Instrução Normativa MinC nº 1/2015, com respaldo na Lei nº 13.018/2014, para as parcerias da PNCV; no art. 21 da Lei nº 14.903/2024, para os Termos de Execução Cultural; e nos arts. 90 e 97 da Instrução Normativa MinC nº 23/2025, com respaldo no art. 34 e no parágrafo único do art. 51 do Decreto nº 11.453/2023, para os projetos do mecanismo de incentivos fiscais do Pronac.
Os procedimentos para aplicação de medidas compensatórias no âmbito do Ministério da Cultura encontram-se atualmente regulados por meio da Instrução Normativa MinC nº 5/2018[15], que estabelece procedimentos para aplicação do ressarcimento ao erário mediante ações compensatórias de interesse público previstas no § 2º do art. 72 da Lei nº 13.019/2014 (MROSC).
Por meio do Parecer nº 304/2023/CONJUR-MinC/CGU/AGU[16], a esta Consultoria Jurídica entendeu possível estender a aplicabilidade da Instrução Normativa MinC nº 5/2018 a outras modalidades de fomento direto e indireto celebradas no âmbito do Ministério da Cultura, recomendando, para tanto, que o texto da referida instrução normativa fosse atualizado para refletir o devido alcance necessário em face das legislações específicas em vigor.
Enquanto esta atualização da IN nº 5/2018/MinC não ocorre, o deferimento de ações compensatórias não está interditado, visto que possui previsão legal específica para os demais instrumentos e mecanismos do fomento direto e indireto, conforme citado acima.
Ocorre que, na ausência de regulamentação detalhada, tais ações compensatórias dependerão de decisão motivada em cada caso concreto com o qual de depare a autoridade competente para avaliar as prestações de contas, a quem caberá decidir discricionariamente conforme as peculiaridades de cada situação, desde a extensão do dano até a capacidade da entidade responsável. Embora as autoridades competentes para avaliar solicitações de ações compensatórias em TCCs, TECs ou projetos do mecenato não estejam vinculadas aos requisitos de admissibilidade e outras condições e procedimentos da IN nº 5/2018/MinC, nada impede que tais requisitos sejam adotados na motivação das decisões discricionárias sobre pedidos que venham a ser formulados em cada prestação de contas.
Não havendo proposta de ações compensatórias, ou na hipótese de eventual plano de ações compensatórias não ser acatado pela Administração, ou ainda na hipótese das ações compensatórias aprovadas não serem realizadas a contento, deverá a autoridade competente para julgamento da prestação de contas determinar a aplicação das penalidades cabíveis conforme o instrumento ou mecanismo de fomento, bem como a adoção dos procedimentos ulteriores para a elisão do dano ao erário, culminando com a instauração de tomada de contas especial e encaminhamento ao TCU, caso as medidas administrativas ao alcance do ministério não sejam satisfatórias para o ressarcimento do dano.
Da incidência de juros e atualização monetária.
A incidência de juros sobre os valores do débito apurado em prestações de contas de projetos culturais tem a ver com o termo inicial a partir do qual o responsável é constituído em mora perante a administração. Para determinados instrumentos de fomento direto, a mora é ex re ou ex lege, isto é, existe um marco temporal definido em lei para a caracterização desta mora.
É o caso do Termo de Execução Cultural (TEC), em que o termo inicial para a caracterização da mora é a data do término da vigência do instrumento, conforme definido no art. 21, § 6º, da Lei nº 14.903/2024, com atualização monetária pelo IPCA e juros de mora nos termos do art. 406 do Código Civil. É também o caso de termos de fomento e termos de colaboração, pois o art. 71, § 4º, inciso II, do MROSC, ao presumir a suspensão da incidência de juros após prazo do caput do artigo, contado do recebimento da prestação de contas, permite inferir que a data da entrega da prestação de contas é o marco inicial da caracterização da mora e início da incidência de juros.
Para os demais instrumentos, porém, não existe uma data estipulada em lei para o vencimento da obrigação de devolução ao erário, de modo que somente a interpelação formal por parte do concedente terá o efeito de caracterizar o responsável como devedor, ressalvados os casos de má-fé. É o entendimento firmado no Parecer nº 1.363/2010/CONJUR/MinC e no Parecer nº 516/2016/CONJUR-MinC/CGU/AGU[17], com base no art. 396, no parágrafo único do art. 397 e no art. 398 do Código Civil, que assim dispõem:
Art. 396. Não havendo fato ou omissão imputável ao devedor, não incorre este em mora.
Art. 397. O inadimplemento da obrigação, positiva e líquida, no seu termo, constitui de pleno direito em mora o devedor.
Parágrafo único. Não havendo termo, a mora se constitui mediante interpelação judicial ou extrajudicial.
Art. 398. Nas obrigações provenientes de ato ilícito, considera-se o devedor em mora, desde que o praticou.
Assim, não havendo ato ilícito (fraude, dolo, simulação) na gestão dos recursos do projeto, somente a partir do momento em que o responsável é intimado a devolver os recursos, com prazo assinalado para o cumprimento, é que se pode falar em efetiva mora e início da incidência de juros. Antes disso, apenas se pode falar em atualização monetária para preservação do valor real dos recursos devidos.
A depender do regime jurídico aplicável ao instrumento e à modalidade de fomento, pode haver especificidades com relação ao prazo que pode ser dado ao responsável para quitar o débito antes da caracterização da mora e incidência de juros.
Nos casos de Termo de Compromisso Cultural (TCC) da PNCV, por exemplo, o art. 46 da Instrução Normativa MinC nº 1/2015, estabelece que diante da omissão no dever de prestar contas, a administração enviará notificação exigindo que o faça no prazo máximo de 30 dias, sob pena de rejeição das contas e exigência de devolução integral dos recursos, com atualização monetária e juros.
Nos casos de projetos de incentivos fiscais do Pronac, este prazo é de 20 dias após o registro da reprovação no Salic, conforme o art. 80 da IN nº 23/2025, sendo que a notificação inicial deverá consolidar o débito a ser quitado apenas com a atualização monetária.
No casos de termos de fomento e termos de colaboração do MROSC, o art. 70, II, "b", do Decreto nº 8726/2016 estabelece que os juros podem incidir desde o término da parceria quando a administração não providenciar a notificação do devedor no prazo legal que possui para finalizar a análise das contas, descontando-se porém, o período de inércia administrativa. Não sendo este o caso, a notificação tempestiva do devedor para pagamento do débito deve apenas consolidar o valor devido com a atualização monetária, assinalando prazo para pagamento, não definido previamente na lei.
Interrupções da incidência de juros de mora contra o devedor.
Seja qual for o termo inicial da incidência de juros conforme os critérios acima descritos, deve-se atentar para a possibilidade de recursos administrativos ou pedidos de revisão pelo responsável, depois de constituído em mora. Nestes casos, ainda que tais impugnações possam ter efeito suspensivo, impedindo a adoção de medidas imediatas de elisão do dano, caso a decisão de rejeição/reprovação das contas seja mantida, permanecerá também a incidência de juros desde a data da caracterização da mora.
No entanto, é importante observar que nem sempre haverá incidência de juros durante todo o período em que o processo esteja pendente de julgamento de recursos ou impugnações, visto que poderá existir períodos caracterizados como inércia da administração não imputável ao recorrente. Na ocorrência de situações desse tipo, os juros incidem apenas nos períodos em que não haja mora processual da Administração.
A respeito dessas interrupções na incidência de juros, é importante destacar que, assim como a Administração não pode protelar indefinidamente a duração de um processo sem tomar uma decisão, dando causa à acumulação irrazoável de juros ao administrado, também a interposição de recursos e impugnações não pode ter o mero efeito procrastinatório de retardar a consolidação da decisão desfavorável e impedir a incidência de juros enquanto a questão não se resolve. Logo, o uso do prazo legal para julgamento de recursos administrativos e pedidos de revisão não caracteriza mora da Administração, somente se caracterizando sua inércia quando o processo decisório extrapola tais prazos legais. Neste sentido, vide o Parecer nº 142/2015/CONJUR-MinC/CGU/AGU[18].
Afora as hipóteses genéricas de mora da Administração citadas acima, as parcerias do MROSC e os Termos de Execução Cultural (TEC) contam com algumas presunções legais de mora da Administração que impedem a incidência de juros. Tais hipóteses estão previstas na legislação porque envolvem instrumentos nos quais a constituição da mora do devedor é ex re, e ocorre antes da decisão de rejeição das contas.
No caso de TEC, os §§ 1º e 6º do art. 21 da Lei nº 14.903/2024 estabelecem que a decisão de aprovação ou de rejeição de contas deve ser proferida no prazo de 360 dias, a contar da data de término de vigência do instrumento. No momento em que tal prazo é extrapolado, cessa a incidência de juros que se havia iniciado na data de término de vigência do instrumento. Em outras palavras, se a prestação de contas é rejeitada, o valor devido só é acrescido de juros nos primeiros 360 dias de mora, porque depois deste prazo a mora é da Administração. Em tal situação, os juros somente voltam a incidir depois do trânsito em julgado administrativo, quando as medidas de elisão do dano se tornam possíveis.
No caso das parcerias do MROSC, a Lei nº 13.019/2014 estabelece em seu art. 71 o prazo de 150 dias para julgamento das prestações de contas, contados da data da entrega ou cumprimento de eventuais diligências adicionais à entrega. Com a possibilidade de eventual prorrogação, este prazo pode atingir 300 dias. Conforme o § 4º, inciso II, do art. 71, o transcurso desse prazo sem apreciação das contas impede a continuidade da incidência de juros de mora sobre débitos apurados, os quais só voltam a incidir a partir da data em que a decisão de rejeição da prestação de contas seja ultimada.
Da má-fé (dolo, fraude ou simulação) como causas de antecipação da mora
Em todos os casos acima citados, a evidência de dolo, fraude ou simulação do responsável pelo dano modifica a regra de início da incidência de juros, os quais passam a incidir a partir da data do ato ilícito, na forma do art. 398 do Código Civil, citado no § 78 deste parecer.
Do cabimento da atualização monetária mesmo sem a incidência de juros.
De qualquer forma, conforme mencionado no § 79 acima, a atualização monetária deve ocorrer independentemente da incidência de juros de mora, desde a data em que o responsável tem a disponibilidade financeira sobre o recurso que foi objeto de glosa em prestação de contas, para preservação de seu valor real. Esta data também pode variar, conforme se trate de fomento direto ou indireto.
Para todos os instrumentos de fomento direto, a atualização monetária é contada desde a data do repasse. Tal marco temporal está presente desde os convênios anteriores ao MROSC, com base no art. 7º, incisos XII e XIII, da Instrução Normativa nº 1/1997/STN, sendo que o índice de atualização vigente é o IPCA, conforme o art. 69, § 3º, do Decreto nº 8.726/2016, e o § 6º do art. 21 da Lei nº 14.903/2025.
Para os projetos do mecanismo de incentivos fiscais, o valor deve ser atualizado a partir do momento da captação. Porém, como a captação não se dá em um momento único, mas ao longo de um período em que o proponente é autorizado por ato do ministério, resta ao regulamento apenas definir que critério adotar nas hipóteses de múltiplos eventos de captação ao longo do período em que o proponente tem autorização para tanto. A IN MinC nº 11/2016 foi a primeira a prever que o débito apurado em prestação de contas fosse atualizado apenas a partir do término do prazo de captação, visto que tal prazo delimita a prerrogativa do proponente para captar recursos de incentivos fiscais. Tal regra permanece na atual IN nº 23/2025/MinC, em seu art. 80, que determina a atualização monetária desde a data do término do prazo de captação pelo índice da aplicação financeira da conta vinculada.
Ocorre que, tanto no fomento direto como no fomento indireto por incentivos fiscais, os recursos repassados ou captados são depositados em contas com rendimentos de aplicação financeira automática que lhe preserva a atualização monetária, conforme o art. 29 da Lei nº 8.313/1991 e art. 51 da Lei nº 13.019/2014. Nos regulamentos do Pronac, tal regra é replicada desde a Instrução Normativa MinC nº 1/2010 (art. 46, § 2º) e vem constando, desde então, nas sucessivas reedições do regulamento. Atualmente, consta do art. 56, § 2º, da IN nº 23/2025/MinC. Assim, na hipótese de inexecução do projeto pela simples não utilização dos recursos, basta o recolhimento tempestivo dos valores depositados na conta para que o responsável quite seu débito, o que ocorre de forma automatizada mediante recolhimento dos saldos do projeto ao FNC ao término de seu prazo de execução. Porém, nos casos de malversação dos recursos glosados, a retirada da conta impede sua atualização automática, devendo ser aplicados os índices de atualização monetária a partir das datas indicadas no parágrafo anterior, sem prejuízo dos eventuais juros, conforme já mencionado.
Registros de inadimplência, sanções e instauração de tomada de contas especial.
A sanção de inabilitação, o registro no CADIN – Cadastro Informativo de Créditos não Quitados do Setor Público Federal – e a inscrição em Dívida Ativa da União – DAU – são medidas de elisão do dano ao alcance da administração antes da instauração de TCE – Tomada de Contas Especial – relacionada aos instrumentos e modalidades de fomento de que trata este parecer.
A inabilitação é sanção prevista no art. 4º, § 8º, da Lei nº 8.313/1991, para pessoas jurídicas recebedoras de recursos do Fundo Nacional de Cultura (FNC), e no art. 20, § 1º, da mesma lei, para pessoas físicas ou jurídicas beneficiadas com recursos do mecanismo de incentivos fiscais. Portanto, pode ser aplicada em caso de reprovação de contas de projetos culturais do fomento indireto ou do fomento direto – neste último caso, quando executados com recursos do FNC.
Para o mecanismo de fomento indireto, os efeitos da inabilitação encontram-se previstos no art. 87 da Instrução Normativa MinC nº 23/2025: (i) impossibilidade de apresentar novas propostas no Pronac; (ii) impossibilidade de prorrogação de prazos de captação de projetos; e (iii) impossibilidade de novas aprovações de captação, com o consequente arquivamento de propostas em análise e de projetos já aprovados mas sem movimentação liberada. Para o fomento direto, a inabilitação resulta em impedimento de recebimento de novos recursos do FNC, conforme previsto no § 8º do art. 4º da Lei nº 8.313/1991.
A sanção de inabilitação tem duração de 3 anos mas pode ser levantada se houver o recolhimento do débito, conforme previsto nos mesmos dispositivos legais e no art. 89 da IN nº 23/2025/MinC, desde que sanadas todas as irregularidades que levaram à sanção. Nos projetos de incentivos fiscais, sua aplicação é automatizada no Salic, após o decurso do prazo de 20 dias que o responsável tem para regularizar sua situação antes de ser constituído em mora, referido no art. 80 da IN nº 23/2025/MinC (cf. art. 87, § 3º, da mesma IN), servindo de parâmetro para consulta de regularidade junto ao Pronac.
O registro no CADIN, por sua vez, é medida prevista na Lei nº 10.522/2002, que instituiu o cadastro, e regulado na Portaria STN nº 685/2006, e deve ser aplicado a todas as pessoas físicas ou jurídicas em débito com a administração pública federal.
Como pressupõe o débito, a inscrição do responsável no CADIN só pode ser efetuada após o trânsito em julgado administrativo da decisão de reprovação ou rejeição das contas, qualquer que seja o instrumento ou modalidade de fomento utilizada, momento em que o débito está também passível de instauração de Tomada de Contas Especial (TCE). É o entendimento que se extrai do art. 91 da IN nº 23/2025/MinC, para o Pronac, bem como do art. 53, § 4º, da IN nº 1/2015, para a PNCV, além da própria regra geral do art. 2º (incisos I e III) da Lei nº 10.522/2002. Ademais, mesmo após o trânsito em julgado administrativo, deve-se aguardar o prazo de 30 dias após a confirmação da intimação do devedor para que o cadastro seja efetuado, conforme §§ 2º e 3º do art. 2º da Lei nº 10.522/2002.
É relevante observar ainda as hipóteses em que é necessária inscrição no CADIN mesmo quando o crédito já está prescrito.
Conforme o art. 6º, inciso I, da Lei nº 10.522/2002, a suspensão do registro no CADIN deve ser levada a efeito pelo órgão credor, no prazo de cinco dias úteis, quando haja suspensão da exigibilidade do crédito. Ora, a prescrição é instituto jurídico que implica a perda do direito de exigir uma obrigação em razão do decurso do tempo, mesmo que o direito não tenha sido extinto. Portanto, com a prescrição, a exigibilidade do crédito é suspensa em definitivo, pois ainda que não extinto o direito, este já não pode mais ser exercido.
No entanto, os arts. 6º e 7º da Instrução Normativa TCU nº 98/2024, ao tratar das hipóteses de dispensa de tomada de contas especial, estabelecem que somente pode ser dispensada a instauração da TCE quando o valor do débito for inferior a R$ 120.000,00, ou quando houver transcorrido mais de 10 anos entre a data provável do dano e a primeira notificação do responsável, o que admite em tese a instauração de TCE para créditos prescritos. Tal entendimento se confirma ao se analisar a regra do § 1º do art. 6º, segundo o qual a dispensa em função do valor não se aplica quando o somatório com outros débitos de um mesmo responsável ultrapassar o valor de R$ 120.000,00.
Considerando que a inscrição no CADIN, como medida preliminar de elisão do dano, pode ser entendida como condição para a instauração da TCE; que a baixa no CADIN depende da suspensão da exigibilidade do débito; e que entre os débitos do somatório de um mesmo responsável pode haver débitos não prescritos ou mesmo imprescritíveis, conclui-se a inscrição no CADIN torna-se necessária mesmo quando o débito estiver prescrito, em razão da necessidade de assegurar a instauração de TCE para a persecução de outros débitos combinados, quando estes não estiverem prescritos.
Portanto, somente quando verificada a possibilidade de dispensa da TCE é que se admite a não inscrição ou a baixa da inscrição no CADIN de débito comprovadamente prescrito.
Prosseguindo com as demais medidas de elisão de dano, com a inscrição no CADIN, o débito torna-se passível de instauração da TCE, para posterior encaminhamento do Tribunal de Contas da União. No entanto, conforme previsto no art. 3º da Instrução Normativa TCU nº 98/2024[19], a TCE constitui medida de exceção, sendo instrumento subsidiário para recuperação de créditos da União, uma vez que a Administração deve esgotar todas as medidas administrativas ao seu alcance para a elisão ou ressarcimento do dano.
Havendo condições para apuração da liquidez e certeza do débito, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) já possui entendimento consolidado[20] no sentido de que a instauração da TCE deve ser precedida no órgão de origem pela inscrição em Dívida Ativa da União, que abrange, entre outros créditos, aqueles oriundos de reposições ao erário por responsáveis devidamente julgados, com respaldo no art. 39, §§ 1º e 2º, da Lei nº 4.320/1964.
Uma das vantagens da inscrição em Dívida Ativa em relação à instauração da TCE é que aquela suspende o prazo prescricional por 180 dias, para que a PGFN tente a recuperação do crédito de forma extrajudicial, até o ajuizamento da execução fiscal, conforme previsto no art. 2º, § 3º, da Lei nº 6.830/1980. Outra vantagem é que o valor mínimo para inscrição em Dívida Ativa é de apenas R$ 1.000,00, conforme o art. 1º da Portaria MF nº 75/2002, o que permite maior agilidade na recuperação de créditos de baixo valor, que não precisam aguardar eventuais somatórios de débitos acumulados.
Para assegurar que o crédito é efetivamente líquido, certo e exigível, o encaminhamento à PGFN para inscrição em Dívida Ativa pressupõe uma série de procedimentos que lhe permitem apurar se o débito já foi devidamente quantificado, atualizado e com o responsável devidamente individualizado e constituído em mora, tendo-se esgotado todas as notificações e demais providências administrativas cabíveis para a sua recuperação no âmbito administrativo do órgão de origem.
Tais procedimentos envolvem todo o devido processo legal de prestação de contas enunciado neste parecer, até o trânsito em julgado administrativo da decisão, consolidação do débito, aplicação das penalidades cabíveis, inscrição no CADIN e elaboração de demonstrativo de débito circunstanciado análogo ao relatório elaborado para os casos de tomada de conta especial, porém dentro dos requisitos específicos apresentados na Cartilha aos Órgãos Públicos para Inscrição em Dívida Ativa da União[21]. Se os procedimentos forem suficientes para caracterização da liquidez, certeza e exigibilidade do crédito, o encaminhamento à PGFN para inscrição em Dívida Ativa é obrigatório, no prazo de 90 dias contados da data em que a administração certifique a liquidez, certeza e exigibilidade do crédito, conforme o art. 22 do Decreto-Lei nº 147/1967.
Caso esteja caracterizada a prescrição, o crédito não possui exigibilidade, não podendo ser inscrito em Dívida Ativa da União. Neste caso, proceder-se-á apenas a inscrição no CADIN e a instauração da TCE, salvo se verificada alguma hipótese de dispensa pelo TCU, conforme já elucidado nos §§ 103 e 104 deste parecer.
A caracterização da prescrição, aqui abordada como fator impeditivo da exigibilidade do crédito e de medidas de elisão do dano, é inovação legislativa importante decorrente de reorientação jurisprudencial do STF e será tratada na seção seguinte deste parecer.
XIII - Da decadência e da prescrição de ações punitivas e ressarcitórias.
Decadência da prerrogativa de anulação de decisões em prestação de contas.
Nas seções VII e VIII deste parecer abordou-se a necessidade de respeito a direitos adquiridos na aplicação intertemporal de regras de prestação de contas, bem como a possibilidade de eventual revisão de pareceres para aplicação de regras com metodologias simplificadas de prestação e análise de contas. Em geral, tais revisões são aplicadas em benefício do administrado, e encontram respaldo no poder de autotutela da Administração, consagrado nas Súmulas nº 346 e 473 do Supremo Tribunal Federal, e positivado no art. 53 da Lei nº 9.784/1999, segundo o qual "a Administração deve anular seus próprios atos, quando eivados de vício de legalidade, e pode revogá-los por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos".
Todavia, o poder de autotutela administrativa abrange também a prerrogativa de anular atos administrativos em desfavor dos administrados, desde que respeitado o devido processo legal, com garantia de contraditório e ampla defesa. Para estas situações de anulação de atos administrativos dos quais decorram efeitos favoráveis aos interessados, a Administração está sujeita a um prazo decadencial quinquenal, contado da data em que os atos foram praticados, salvo comprovada má-fé do administrado, conforme disposto no art. 54 da Lei nº 9.784/1999.
A revisão por meio de anulação não pressupõe a pendência de recurso administrativo, podendo ser levada a efeito de ofício a qualquer tempo, desde que respeitado o prazo decadencial.
Portanto, as prestações de contas de projetos culturais aprovadas com vícios de legalidade somente podem ser anuladas administrativamente e convertidas em reprovação ou aprovação com ressalvas dentro do prazo de cinco anos, contados da data da decisão, não havendo possibilidade jurídica de suspensão ou interrupção de tal prazo, visto tratar-se de prazo decadencial (art. 207 do Código Civil).
Por outro lado, os atos de reprovação de prestações de contas que apresentem nulidades podem ser anulados e convertidos em aprovação ou aprovação com ressalvas a qualquer tempo, pois nestes casos não incide o prazo decadencial.
Decadência da prerrogativa de reprovação das contas de TEC.
Com o advento do Marco Regulatório do Fomento à Cultura (Lei nº 14.903/2024), uma nova hipótese de decadência também foi instituída para as parcerias executadas por meio de Termo de Execução Cultural, cujas prestações de contas devem ser julgadas no prazo de 360 dias após o término da vigência do instrumento (art. 21, § 1º). Embora este prazo possa ser extrapolado e o julgamento das contas possa ser realizado posteriormente, o § 4º do art. 18 da lei estabelece um prazo decadencial de cinco anos para o exercício da prerrogativa de rejeitar as contas do projeto, quando as falhas identificadas não apresentem evidência de má-fé.
Em outras palavras, salvo casos de comprovada má-fé, sempre que extrapolado o prazo de cinco anos após o término de vigência de um TEC, a administração perde o direito de rejeitar sua prestação de contas ou aprová-la com ressalva, devendo considerá-la aprovada.
Prescritibilidade das ações punitivas e ressarcitórias em processo administrativo.
Não se pode tampouco ignorar a importante inovação jurídica implementada por meio do art. 79 do Decreto nº 11.453/2023 no enfrentamento da questão prescricional em processos de prestações de contas no âmbito do Ministério da Cultura, consolidando a jurisprudência sobre o tema para os processos de competência deste ministério. Além da previsão geral da possibilidade do reconhecimento de ofício, em seu parágrafo único tal artigo dispõe expressamente que a análise da ocorrência de prescrição para o exercício das pretensões de ressarcimento precederá as análises de documentação de prestações de contas, autorizando assim o reconhecimento de ofício não apenas da pretensão punitiva, mas também das ações de ressarcimento do Estado.
Esta previsão normativa consolida uma radical reorientação jurisprudencial no tratamento a ser dado às hipóteses de dano ao erário, antes consideradas sempre imprescritíveis, e respalda-se em recentes decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal no Tema 899 da Repercussão Geral da Corte, especialmente no Recurso Extraordinário nº 636.886/AL[22] e na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5509[23]. Ademais, trata-se de matéria já regulamentada no âmbito do TCU por meio da Resolução nº 344/2022[24].
Esta Consultoria Jurídica possui grande acúmulo de entendimentos proferidos no sentido de que o prazo prescricional quinquenal de que trata a Lei nº 9.873/1999 sempre foi plenamente aplicável às sanções de inabilitação e multa previstas no art. 20, § 1º, e no art. 38 da Lei nº 8.313/1991, respectivamente, tendo em vista que nestes casos, trata-se do exercício da ação punitiva do estado por meio de processo administrativo sancionador. Especificamente nas hipóteses dos crimes de fraude do patrocinador (art. 40, caput) e de inexecução dolosa de projeto com recursos captados (art. 40, § 2º), a prescrição da ação punitiva administrativa regula-se pela prescrição penal, ocorrendo em 3 anos conforme art. 109, VI, do Código Penal.
Todavia, no que tange especificamente às ações ressarcitórias da administração, seja para o fomento direto ou indireto, sempre houve cautela na aceitação da tese da prescrição, diante da previsão constitucional de uma imprescritibilidade geral das ações de ressarcimento de dano ao erário, no art. 37, § 5º, da Constituição Federal.
Mesmo com o início de uma mudança de orientação do STF nesta questão (Recurso Extraordinário nº 669.069/MG[25]) para reconhecer uma imprescritibilidade relativa, esta Consultoria Jurídica manteve seu entendimento consolidado no sentido da imprescritibilidade no âmbito dos programas do MinC, uma vez que em tal julgamento havia-se firmado tão-somente a tese da possibilidade de prescrição das ações de ressarcimento relativas a danos decorrentes exclusivamente de ilícito civil não associado a sanções de outras naturezas, especificamente relacionado a responsabilidade civil extracontratual prevista em norma de direito privado. Como nas hipóteses das leis de fomento e incentivo à cultura estamos tratando de responsabilidades outras que importam em violação de norma de direito público associada a sanções administrativas, concluía-se que o art. 37, § 5º, da Constituição, reconhecia a prescrição apenas das sanções cominadas ao ilícito, mas não da pretensão ressarcitória. Este entendimento, contudo, evoluiu na própria esteira da jurisprudência do STF.
O julgamento do RE nº 669.069/MG havia servido de paradigma para o Tema 666 da Repercussão Geral da Suprema Corte, assentando o entendimento de que ilícitos exclusivamente civis decorrentes de normas de direito privado são prescritíveis. Porém, não havia concluído, a contrario sensu, que apenas ilícitos dolosos ou de improbidade administrativa conduziriam à imprescritibilidade do dano ao erário. Já no julgamento do Tema 897[26] da Repercussão Geral, o tribunal discutiu sobre a imprescritibilidade da pretensão de ressarcimento ao erário em face de agentes públicos por ato de improbidade administrativa. No leading case (RE 852475/SP[27]), ficou decidido que “são imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa”.
A jurisprudência formada a partir destes dois julgamentos fornece parâmetros razoáveis para abranger uma grande variedade de hipóteses, firmando orientação no sentido da prescritibilidade nos casos de ilícitos meramente civis e decorrentes de normas de direito privado, e no sentido da imprescritibilidade nos casos de atos de improbidade administrativa, isto é, atos dolosos que resultem em dano ao erário. Contudo, permanecia uma lacuna no que se refere a danos decorrentes de violações não dolosas a normas de direito público, como ocorre ordinariamente nas prestações de contas dos programas, projetos e ações do Ministério da Cultura.
Buscando sanar esta lacuna, o Tema 899 da Repercussão Geral do STF foi debatido no julgamento do leading case do Recurso Extraordinário nº 636.886/AL[22], resultando no seguinte acórdão:
REPERCUSSÃO GERAL. EXECUÇÃO FUNDADA EM ACÓRDÃO PROFERIDO PELO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. PRETENSÃO DE RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. ART. 37, § 5o, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PRESCRITIBILIDADE.
1. A regra de prescritibilidade no Direito brasileiro é exigência dos princípios da segurança jurídica e do devido processo legal, o qual, em seu sentido material, deve garantir efetiva e real proteção contra o exercício do arbítrio, com a imposição de restrições substanciais ao poder do Estado em relação à liberdade e à propriedade individuais, entre as quais a impossibilidade de permanência infinita do poder persecutório do Estado.
2. Analisando detalhadamente o tema da “prescritibilidade de ações de ressarcimento”, este SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL concluiu que, somente são imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato de improbidade administrativa doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa – Lei 8.429/1992 (TEMA 897). Em relação a todos os demais atos ilícitos, inclusive àqueles atentatórios à probidade da administração não dolosos e aos anteriores à edição da Lei 8.429/1992, aplica-se o TEMA 666, sendo prescritível a ação de reparação de danos à Fazenda Pública.
3. A excepcionalidade reconhecida pela maioria do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL no TEMA 897, portanto, não se encontra presente no caso em análise, uma vez que, no processo de tomada de contas, o TCU não julga pessoas, não perquirindo a existência de dolo decorrente de ato de improbidade administrativa, mas, especificamente, realiza o julgamento técnico das contas à partir da reunião dos elementos objeto da fiscalização e apurada a ocorrência de irregularidade de que resulte dano ao erário, proferindo o acórdão em que se imputa o débito ao responsável, para fins de se obter o respectivo ressarcimento.
4. A pretensão de ressarcimento ao erário em face de agentes públicos reconhecida em acórdão de Tribunal de Contas prescreve na forma da Lei 6.830/1980 (Lei de Execução Fiscal).
5. Recurso Extraordinário DESPROVIDO, mantendo-se a extinção do processo pelo reconhecimento da prescrição. Fixação da seguinte tese para o TEMA 899: “É prescritível a pretensão de ressarcimento ao erário fundada em decisão de Tribunal de Contas”. [grifo nosso]
Portanto, a partir de tal jurisprudência, há segurança jurídica para que a administração pública reconheça de ofício a prescrição da pretensão de reparação civil decorrente de quaisquer atos ilícitos, exceto aqueles qualificados como atos dolosos de improbidade administrativa.
É relevante notar, ainda, que o caso paradigmático utilizado no julgamento da repercussão geral e resultou no acórdão supracitado consistia justamente em hipótese de dano ao erário decorrente de reprovação em prestação de contas de convênio celebrado no Ministério da Cultura, como registrado na decisão do tribunal que reconheceu a repercussão geral:
1. Trata-se de recurso extraordinário interposto em ação de execução de acórdão do Tribunal de Contas da União. (...)
2. Com razão o Tribunal de origem ao devolver os autos à apreciação desta Corte. Debate-se, neste recurso extraordinário, a prescritibilidade da pretensão de ressarcimento ao erário determinada pelo Tribunal de Contas da União. Consta que Vanda Maria Menezes Barbosa, na qualidade de presidente da Associação Cultural Zumbi, deixou de prestar contas de recursos recebidos do Ministério da Cultura para fins de aplicação no projeto Educar Quilombo. Por essa razão, o TCU, no julgamento de Tomadas de Conta Especial, a condenou a restituir aos cofres públicos os valores recebidos por meio do Convênio 14/88. Instada a cumprir a obrigação, a parte não a adimpliu, o que ensejou a propositura de execução de título executivo extrajudicial pela União.
Assim sendo, não obstante o disposto no art. 37, § 5º, da Constituição Federal, considerando a jurisprudência consolidada no STF, parece-me não haver mais dúvidas quanto à legalidade e constitucionalidade do art. 79, caput e parágrafo único, do Decreto nº 11.453/2023, que autoriza a administração pública a reconhecer, de ofício, a prescrição do poder administrativo sancionatório, bem como das pretensões de ressarcimento relacionadas às prestações de contas de todos dos instrumentos de fomento direto e indireto à cultura. Tal orientação reforça-se a partir da edição da Resolução nº 344/2022/TCU[24], que regulamentou a prescrição para o exercício das pretensões punitiva e de ressarcimento no âmbito do Tribunal de Contas da União (TCU), e confirmou a prescrição quinquenal de tais pretensões, exceto quando aplicável a prescrição penal.
Em seus princípios gerais, a resolução do TCU aplica-se a quaisquer créditos da Fazenda Pública de natureza não-tributária, inclusive às prestações de contas objeto do presente parecer, visto que passíveis de tomadas de contas especial no âmbito da corte de contas.
No entanto, algumas ponderações devem ser feitas quanto às especificidades de cada regulamentação. A Resolução nº 344/2022/TCU foi editada a partir das competências do TCU, e parte do pressuposto de que todo processo de tomada de contas especial é um processo administrativo sancionador desde o seu início. Uma das consequências mais importantes dessa distinção diz respeito aos marcos temporais de início da contagem do prazo prescricional, como se verá a seguir.
Termo inicial do prazo prescricional.
Os processos relativos a parcerias do Ministério da Cultura com o setor privado ou com o setor público, seja por meio do MROSC (Lei nº 13.019/2014), da PNCV (Lei nº 13.018/2014), de convênios, de instrumentos congêneres ou pelos demais mecanismos de fomento direto ou indireto à cultura não têm a mesma natureza de uma tomada de contas especial, somente assumindo caráter sancionador a partir do momento em que têm suas prestações de contas rejeitadas ou reprovadas, por meio de decisão da Administração que constitui em mora o seu parceiro ou beneficiário.
A regra geral estabelecida no art. 1º da Lei nº 9.873/1999 é a de que o prazo prescricional quinquenal seja contado a partir da data da prática do ato que deu origem à sanção ou da data em que este ato cessou, quando se tratar de ato continuado ou permanente.
Porém, no caso de reprovações em prestações de contas de projetos culturais, já é consolidado o entendimento desta Consultoria Jurídica[28] no sentido de que, devido à duração continuada dos projetos e da existência de múltiplos fatos e atos que, ao longo de sua execução, podem dar ensejo à sua reprovação ou aprovação com ressalva, não é possível determinar um único evento ou data que possa ser utilizado como marco temporal para início da contagem do prazo prescricional, especialmente considerando que eventuais irregularidades podem ser sanadas tempestivamente até o prazo final de apresentação da prestação de contas, que ocorre somente após o término do prazo de execução do projeto.
Nos débitos originados das reprovações em prestações de contas de projetos culturais a mora do devedor é, a princípio, ex personae. Isto é, somente a interpelação pelo credor (União) é que constitui efetivamente a dívida, e somente a partir deste momento (reprovação das contas) é que incide atualização monetária sobre o débito consolidado. Assim sendo, salvo previsão legal expressa, não é possível que o prazo prescricional inicie antes deste momento, visto que, até então, não há evento danoso passível de cobrança, ressalvados apenas os casos de ato ilícito praticado com comprovado dolo.
Portanto, é importante ter em conta que o termo inicial a partir do qual deve ser contado o prazo prescricional pode variar conforme o regime jurídico aplicável à parceria ou à modalidade de fomento, a depender dos prazos de que o administrado dispõe para apresentar sua prestação de contas ou responder a eventuais diligências antes de ser constituído em mora, ou ainda do prazo de que a administração dispõe para julgar as contas, uma vez que sejam apresentadas.
137.1. Para parcerias firmadas por meio dos instrumentos do MROSC – termos de fomento, termos de colaboração e acordos de cooperação – o início do prazo prescricional é contado (i) da data da apresentação da prestação de contas, por força do § 2º do art. 73 da Lei nº 13.019/2014, ou (ii) noventa dias após o término da vigência da parceria, em caso de omissão do dever de prestar contas.
137.2. Para as parcerias da PNCV, o prazo prescricional inicia-se noventa dias após o término da vigência do Termo de Compromisso Cultural, conforme o art. 63 da Instrução Normativa MinC nº 1/2015, com a redação dada pela Instrução Normativa MinC nº 8/2016. Porém, pode iniciar antes deste marco temporal, com o ato de reprovação das contas, se tal ato ocorrer antes de noventa dias do término da vigência do instrumento, tendo em vista o disposto no parágrafo único do art. 63.
137.3. Para o mecanismo de incentivos fiscais de fomento indireto da Lei Rouanet, esta Consultoria Jurídica já tem entendimento consolidado no sentido de que não é possível contar o prazo prescricional quinquenal a partir da data de apresentação da prestação de contas, mas apenas (i) a partir da data da decisão de reprovação ou aprovação com ressalva que resulte em sanção, ou (ii) a partir do decurso do prazo de seis meses que a administração tem para tal julgamento após o término do prazo de execução do projeto, nos termos do art. 20 da Lei nº 8.313/1991, caso a decisão tenha ultrapassado tal período. Afinal, é neste ato de julgamento (ou no momento do prazo limite para sua produção) que a administração potencialmente constitui o beneficiário em mora, apontando uma irregularidade sujeita a sanção, ou um evento danoso sujeito a sanção e ressarcimento.
137.4. Para os Termos de Execução Cultural, o art. 21, § 8º, da Lei nº 14.903/2024, estabelece que o prazo prescricional somente se inicia após o trânsito em julgado da decisão de rejeição das contas na esfera administrativa, de forma similar ao critério adotado para o mecanismo de incentivos fiscais, porém já com a previsão legal de que eventuais recursos administrativos possuem efeito suspensivo, algo que no mecanismo de incentivos depende de previsão expressa em instrução normativa (o efeito suspensivo dos recursos administrativos no âmbito do fomento indireto encontra-se atualmente previsto no § 3º do art. 87 da IN MinC nº 23/2025).
137.5. Em qualquer das hipóteses citadas, o início do fluxo prescricional antes de tais marcos temporais é possível quando caracterizado ato ilícito (dolo, fraude, simulação), identificável em evento específico em momento anterior, desde que a Administração tenha conhecimento do ato, até mesmo porque em tais situações a execução da parceria pode vir a ser suspensa. Verificada tal situação, a contagem do prazo pode dar-se a partir da data da ciência do fato pela Administração ou da cessação da conduta se esta for continuada ou permanente, e o prazo de prescrição será o previsto na lei penal se o ato for tipificado como crime e houver recebimento de denúncia na esfera criminal.
137.6. Por oportuno, é relevante observar que os marcos prescricionais acima citados não se aplicam a convênios e contratos de repasse, os quais se regem pelos arts. 20 e 21 do Decreto nº 11.531/2023 e não se encontram no escopo do presente parecer. Em tais instrumentos, o prazo prescricional começa a correr 180 dias após o recebimento da prestação de contas ou, em caso de omissão, 105 dias após o término de sua vigência, podendo iniciar na data da rejeição das contas se esta ocorrer primeiro.
137.7. Contudo, quando se tratar de convênio com Organização da Sociedade Civil anterior ao MROSC, aplica-se-lhe o disposto no art. 31 da Instrução Normativa nº 1/1997/STN, que previa o prazo de 60 dias para conclusão da análise após o término de vigência do convênio, marco a partir do qual inicia-se o fluxo prescricional.
Em todos os casos citados nos quais o termo inicial da prescrição depende da constituição do devedor em mora, deve-se observar o prazo legal de análise que a administração tem para constituir o débito. A função de tal prazo é assegurar a razoável duração do processo administrativo. Atingido este prazo, mesmo sem decisão sobre a prestação de contas, inicia o fluxo do prazo prescricional sobre a ação punitiva da administração, conforme reiterados entendimentos desta Consultoria Jurídica, assim como a prescrição da pretensão ressarcitória do dano, conforme o art. 79 do Decreto nº 11.453/2023 e orientação jurisprudencial do STF.
Causas interruptivas da prescrição.
Uma vez iniciado, o fluxo do prazo prescricional pode ser interrompido, acarretando o reinício de sua contagem. Nos procedimentos administrativos de que trata este parecer interrompe-se o prazo prescricional nas hipóteses do art. 2º da Lei nº 9.873/1999, isto é, por meio de (i) notificação ou citação do responsável; (ii) qualquer ato inequívoco de apuração do fato; (iii) decisão recorrível de julgamento das contas; ou (iv) qualquer ato inequívoco de tentativa de solução conciliatória.
Cabe lembrar que a decisão recorrível (inciso III do art. 2º) também pode ser o marco inicial do prazo prescricional em diversas das situações descritas no § 137 deste parecer, podendo ser causa interruptiva apenas se o prazo já tiver sido iniciado em momento anterior. As decisões recorríveis, todavia, jamais terão efeito interruptivo nas prestações de contas de termos de execução cultural (TEC) e do fomento indireto pelo mecanismo de incentivos fiscais, pois em tais casos o termo inicial da prescrição não ocorre antes do trânsito em julgado da decisão administrativa condenatória – no primeiro caso, por disposição legal; no segundo, por disposição em instrução normativa (conforme § 137.4 deste parecer).
Importante destacar que o prazo prescricional somente pode ser interrompido durante o seu fluxo. Não é possível falar em interrupção do prazo após a consumação da prescrição, sendo irrelevante a ocorrência de causas interruptivas se a prescrição já se houver consumado.
Cabe observar ainda que a interrupção da prescrição em razão de notificação (art. 2º, inciso I) somente tem efeitos em relação aos responsáveis regularmente notificados.
Prescrição intercorrente.
Ainda nesta seara, é relevante observar a duração do prazo da prescrição, que em regra é quinquenal, conforme previsto no caput do art. 1º da Lei nº 9.873/1999. Porém, é possível também a incidência da prescrição trienal na hipótese do § 1º do art. 1º, que trata da prescrição intercorrente, isto é, quando, já iniciado o processo sancionador sujeito a prescrição, ou já constituído em mora o devedor, o processo ainda se encontrar pendente de julgamento ou despacho. Em tais situações, se o julgamento ou despacho não ocorrer no prazo de três anos, estará fulminado pela prescrição.
Seguindo o mesmo princípio previsto no art. 8º, § 3º, da Resolução TCU nº 344/2022, a contagem da prescrição sempre inicia com duração quinquenal, podendo tornar-se trienal a partir da primeira causa interruptiva, conforme a situação, se esta causa interruptiva não for uma decisão terminativa do processo.
Ou seja, a prescrição trienal intercorrente deve ser contada a partir de qualquer ato que evidencie o regular andamento do procedimento sancionador, mas não do ato que dê início a tal procedimento, pois antes de tal ato não há que se falar ainda em dano ou sanção, tampouco em providências para elisão do dano ou aplicação de sanções. Na ausência de previsão legal expressa, este ato é a decisão de rejeição ou reprovação da prestação de contas.
No âmbito dos mecanismos de fomento tratados neste parecer, deve-se observar se o termo inicial da prescrição, nas diversas circunstâncias do § 137 deste parecer, ocorre em momento anterior à decisão de rejeição ou reprovação das contas que dá ensejo à pretensão ressarcitória. Se o fluxo prescricional se inicia com a mera apresentação da prestação de contas ou pelo simples decurso de um prazo para apresentação ou análise que não ocorreu (como nos instrumentos do MROSC, da PNCV ou mesmo do fomento indireto quando ultrapassado o prazo legal máximo de análise), então a prescrição quinquenal torna-se trienal sempre que alguma causa interruptiva ocorrer até a tomada de decisão. Se, todavia, o termo inicial somente ocorrer após a decisão de rejeição/reprovação das contas (como nos casos de TEC ou de incentivos fiscais com reprovação das contas dentro do prazo legal de seis meses), então as hipóteses de prescrição intercorrente trienal serão restritas às interrupções por pedido de parcelamento de débito, medida compensatória ou medidas de elisão do dano, pois somente nesses casos uma decisão administrativa já transitada em julgado poderá tornar-se novamente pendente de despacho.
Causas suspensivas da prescrição.
Além das causas interruptivas previstas na Lei nº 9.783/1999, que fazem a contagem do prazo reiniciar, o prazo prescricional pode permanecer suspenso em determinadas situações que impedem seu fluxo regular. Diferentemente da interrupção, porém, na suspensão o prazo decorrido não se perde nem se reinicia, mas é retomado de onde parou, a partir do momento em que cessa a causa suspensiva. Contudo, a Lei nº 9.783/1999 e a Lei nº 9.784/1999 não tratam de causas suspensivas do prazo prescricional em processos administrativos, tampouco as leis que regulam os instrumentos de fomento direto e indireto à cultura, o que a princípio denota a impossibilidade de suspensão da prescrição nesta seara administrativa de processo sancionador.
É verdade que o Tribunal de Contas da União possui regramento sobre o tema, permitindo a suspensão dos processos que tramitem na corte nas hipóteses no art. 7º da Resolução TCU nº 344/2022[24]. Porém, tais regras não se aplicam diretamente aos processos que ainda se encontrem no ministério em fase anterior à instauração de Tomada de Contas Especial (TCE) para encaminhamento ao TCU e para sua jurisdição. Afinal, determinadas situações que a Resolução TCU nº 344/2022 trata como suspensivas são consideradas interruptivas pela Lei nº 9.973/1999, como a vigência de acordo de parcelamento de dívida, ou acordos de não persecução da dívida, como ocorre no deferimento de medidas compensatórias, por exemplo. Em casos tais, a prescrição é interrompida nos processos ainda não convertidos em TCE, por se tratar de medidas inequívocas de solução conciliatória, devendo reiniciar sempre que a causa se renove no processo.
Ainda assim, deve-se atentar para o art. 8º da Instrução Normativa TCU nº 98/2024, segundo o qual os marcos interruptivos e suspensivos da Resolução TCU nº 344/2022 aplicam-se aos processos de Tomadas de Contas Especial desde sua fase interna no ministério. E nos casos inscritos em Dívida Ativa da União, conforme já mencionado no § 107 deste parecer, o prazo de prescrição suspende-se por 180 dias, porém já com o processo no âmbito da PGFN.
Banco de processos prescritos e responsabilização dos agentes que deram causa à prescrição.
Conforme já esclarecido no § 110 deste parecer, o crédito deixa de ser exigível quando fulminado pela prescrição, o que impede sua inscrição em Dívida Ativa da União. No entanto, conforme os arts. 6º e 7º da Instrução Normativa TCU nº 98/2024[19], não é possível o imediato arquivamento do processo, visto que somente os processos com débito inferior a R$ 120.000,00 ou parados há mais de 10 anos dispensam a instauração de TCE. Afora estas hipóteses, deve-se proceder a inscrição no CADIN e instauração da tomada de contas especial
Ademais, conforme arts. 9º e 10 da Instrução Normativa TCU nº 98/2024, os processos prescritos devem ser cadastrados no Banco de Arquivamentos por Prescrição do TCU, o que reforça a impossibilidade de arquivamento no órgão de origem antes da instauração da TCE, nos termos do parágrafo único do art. 7º da referida instrução.
O arquivamento provisório com base na prescrição junto ao TCU possui duas funções: primeiro, permite que o tribunal de contas exerça sua competência de fiscalização e de eventual análise da prescrição conforme suas normas e jurisprudência; segundo, abre espaço para a eventual responsabilização daqueles que deram causa à prescrição, conforme o parágrafo único do art. 8º da IN nº 98/2024/TCU.
Com relação a essa responsabilização, esta Consultoria Jurídica já se manifestou por meio da Nota nº 149/2023/Conjur-MinC/CGU/AGU[29], no sentido da impossibilidade de apuração de responsabilidade funcional pela ocorrência de prescrição em relação a fatos ocorridos e prescritos antes da vigência do art. 79 do Decreto nº 11.453/2023, que consolidou a mudança de orientação jurisprudencial do STF sobre a prescrição da pretensão ressarcitória de danos ao erário. Afinal, até então a condução de tais procedimentos sempre se pautou pela imprescritibilidade do ressarcimento ao erário e o analista ou gestor não pode ser responsabilizado por dever de cautela não exigível à época de sua atuação no processo. Portanto, sempre que verificada tal situação, recomenda-se que tal orientação seja incluída nos relatórios de instauração de tomadas de contas especiais ao TCU destinados ao Banco de Arquivamentos por Prescrição.
Conforme o art. 11-A da Decisão Normativa TCU 155/2016, atualizada pela Decisão Normativa nº 127, de 28 de maio de 2025, o banco de arquivamentos por prescrição constituirá um módulo do sistema e-TCE, não estando ainda plenamente operacional. Enquanto não entra em funcionamento, mantém-se o controle individualizado das tomadas de contas especiais no âmbito do TCU, com prescrição reconhecida na fase interna, conforme o § 4º do art. 10 da IN nº 98/2024/TCU.
As orientações relativas às providências cabíveis na hipótese de constatação da prescrição da pretensão ressarcitória encontram-se atualmente consolidadas na Orientação Normativa AGU nº 95, de 28 de maio de 2025, vertida nos seguintes termos:
ORIENTAÇÃO NORMATIVA Nº 95, DE 28 DE MAIO DE 2025
O ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO, no uso das atribuições que lhe conferem os incisos I, X, XI e XIII, do art. 4º da Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993 e considerando o que consta do Processo nº 00688.000457/2025-07, resolve expedir, nesta data, a presente orientação normativa de caráter obrigatório a todos os órgãos jurídicos enumerados nos arts. 2º e 17 da Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993: Enunciado: I - Na eventualidade de constatação da prescrição da pretensão ressarcitória durante a fase interna ou de cobrança administrativa, as normas aplicáveis à prescrição possuem o condão de auxiliar a atuação dos órgãos e entidades, incluído Instruções Normativas e Resoluções expedidas pelo Tribunal de Contas da União, nesses dois últimos casos desde que não conflitem com os entendimentos da Advocacia-Geral da União ou com norma específica aplicável ao órgão ou entidade. II - Os processos não devem ser arquivados no âmbito dos órgãos ou entidades e devem ser remetidos para julgamento pelo Tribunal de Contas da União. III - A autoridade competente deve, imediatamente, antes da instauração da tomada de contas especial, adotar medidas administrativas para caracterização ou elisão do dano no caso de omissão no dever de prestar contas, não comprovação da aplicação de recursos repassados pela União mediante convênio, contrato de repasse, ou instrumento congênere, ocorrência de desfalque, alcance, desvio ou desaparecimento de dinheiro, bens ou valores públicos, ou da prática de ato ilegal, ilegítimo ou antieconômico de que resulte dano ao Erário. IV - A dispensa de instauração de tomadas de contas especiais prevista em norma específica não exime a autoridade administrativa de adotar outras medidas administrativas ao seu alcance ou requerer ao órgão jurídico pertinente as medidas judiciais e extrajudiciais cabíveis, com vistas à obtenção do ressarcimento. V - Aplicam-se aos processos de tomada de contas especial, ainda que na fase interna, os marcos iniciais da prescrição da pretensão de ressarcimento, bem como os marcos interruptivos e suspensivos previstos na Resolução TCU n° 344/2022 ou em norma que a suceder, desde que não conflitem com os entendimentos da Advocacia-Geral da União ou com norma específica aplicável ao órgão ou entidade. VI - Em razão do definido pelo STF na tese referente ao Tema 897, recomenda-se, em se cogitando a ocorrência de prescrição, verificar o cometimento de eventual ato de improbidade doloso. VII - Caso identificada e reconhecida a prescrição, são necessárias as seguintes providências, sem prejuízo de outras que se entenda necessárias: a) analisar a prestação de contas dos recursos públicos utilizados para fins de avaliação dos mecanismos de governança, previstos no Decreto nº 9.203/2017; b) analisar os autos, a fim de se verificar a existência ou não de indícios de improbidade administrativa dolosa, apta a autorizar o afastamento da prescrição; c) verificada a existência de indícios de improbidade administrativa, providenciar comunicação ao órgão responsável, nos termos do art. 7º da Lei nº 8.429/1992, acompanhada dos subsídios aptos a auxiliar a eventual atuação em juízo; d) apurar eventuais responsabilidades funcionais da autoridade administrativa competente ou do agente público que deram causa à prescrição, e, ao imputar responsabilidades por omissão não justificada, comunicar o órgão de controle interno do órgão ou entidade. Referência: Art. 37, § 5º, da Constituição Federal; arts. 1, 2 e 3 da Lei n. 9.873/1999; arts. 7, 9, 10 e 11 da Lei nº 8.429/1992; art. 3, I, do Decreto nº 9.203/2017; Resolução TCU n° 344/2022; arts. 6, 7, 8 e 9 da Instrução Normativa TCU n° 98/2024; Tema de Repercussão Geral nº 897 do STF (RE 852475); Acórdão da Primeira Turma do STF no MS 34.705; Acórdão TCU n° 2.234/2023 - Plenário; PARECER nº 28/2022/DECOR/CGU/AGU Fonte: Parecer nº 00001/2025/DECOR/CGU/AGU. Esta Orientação Normativa entra em vigor na data de sua publicação.
Ressalte-se, por fim, que o item IV da citada orientação normativa refere-se às hipóteses gerais de dispensa de TCE, não alcançando plenamente os casos de dispensa de TCE fulminados pela prescrição, conforme elucidado nos §§ 110 e 149 deste parecer referencial, visto que em tais casos não há providências ao alcance da autoridade administrativa para obtenção de ressarcimento, seja a inscrição no CADIN, seja na Dívida Ativa da União. Para tais casos, deve-se apenas requerer ao órgão jurídico as eventuais medidas judiciais e extrajudiciais cabíveis, especialmente se houver indícios de má-fé dos responsáveis que indiquem alguma possibilidade de reconhecimento da imprescritibilidade do dano.
XIV - Das competências para análise e julgamento das prestações de contas.
Conforme já abordado por esta Consultoria Jurídica no Parecer nº 232/2024/CONJUR-MinC/CGU/AGU[30] (Processo nº 01400.013555/2024-57), a competência para decidir sobre a prestação de contas pode variar conforme o instrumento de parceria ou mecanismo de fomento, em razão do regime jurídico aplicável, podendo pertencer tanto à autoridade que celebra a parceria quanto a alguma autoridade delegada, observadas apenas algumas vedações à subdelegação. Tal flexibilidade regulamentar decorre do fato de que a Estrutura Regimental do Ministério da Cultura (Decreto nº 11.336/2023) não estabelece tais competências, tampouco as legislações de regência dos instrumentos de parceria. Cabe, portanto, analisar como os regulamentos do ministério regem a matéria.
Com relação aos instrumentos do MROSC - termos de fomento, termos de colaboração e acordos de cooperação - a permissão de delegação e a vedação de subdelegação encontram-se previstas no art. 72, § 1º da Lei nº 13.019/2014. A competência principal para celebração encontra-se delegada pela Ministra na forma do art. 5º da Portaria MinC nº 185/2025, pertencendo aos Secretários ou ao Secretário-Executivo e seus subsecretários, no âmbito de suas competências regimentais. E a competência para decidir sobre as prestações de contas pertence exclusivamente ao Secretário-Executivo, na forma do art. 6º, § 4º, da Portaria MinC nº 185/2025[31]. Cabe recurso à Ministra da Cultura, na forma do art. 67, parágrafo único, inciso I, do Decreto nº 8.726/2016.
Com relação aos termos de compromisso cultural (TCC) da PNCV, a redação dada ao art. 51, § 2º, da IN MinC nº 1/2015 pela IN MinC nº 12/2024, uniformizou-se com os demais instrumentos do MROSC, estabelecendo que também "compete ao Secretário-Executivo a decisão quanto ao julgamento final de contas de TCC", não obstante a celebração de tais instrumentos pertença à Secretária de Cidadania e Diversidade Cultural, conforme art. 4º, parágrafo único, da IN MinC nº 1/2015. Cabe recurso à Ministra, na forma do art. 52, inciso I, da IN MinC nº 1/2015.
Com relação aos termos de execução cultural (TEC), a Lei nº 14.903/2024 não estabelece nenhuma vedação à delegação ou subdelegação de tais competências, aplicando-se, atualmente, a mesma regra vigente para os instrumentos do MROSC, por força do art. 5º, inciso III, e § 3º, inciso II, alínea "c", combinado com o art. 6º, § 4º, da Portaria MinC nº 185/2025. Ou seja, a competência para celebração também é dos Secretários ou do Secretário-Executivo e seus subsecretários, conforme o objeto da parceria e suas competências regimentais, e a competência para decidir sobre as prestações de contas também é exclusiva do Secretário-Executivo. Não há previsão legal expressa de recurso hierárquico da decisão do Secretário-Executivo. Contudo, considerando o art. 56 da Lei nº 9.784/1999, devem ser conhecidos os recursos eventualmente interpostos, os quais, se não reconsiderados, devem ser encaminhados à Ministra da Cultura para julgamento, analogamente aos demais instrumentos de parceria.
Com relação aos projetos do mecanismo de incentivos fiscais da Lei Rouanet, o regramento encontra-se previsto na IN MinC nº 23/2025, segundo a qual a aprovação de projetos compete ao Secretário de Economia Criativa e Fomento Cultural ou à Secretária do Audiovisual (art. 2º, § 7º), mas a decisão sobre a prestação de contas compete ao Secretário-Executivo (art. 77, § 4º). Cabe recurso à Ministra, conforme art. 20, § 2º, da Lei 8.313/1991, e art. 81 da IN nº 23/2025.
Com relação a outros instrumentos não alcançados por este parecer referencial, recomenda-se consultar o Parecer nº 232/2024/CONJUR-MinC/CGU/AGU[30].
Por fim, ressalte-se que a uniformidade de tratamento da competência para decidir sobre as prestações de contas não afasta a possibilidade de atribuir competências para as diversas atividades de monitoramento, análise documental, comunicação de atos e aplicação de medidas de elisão de danos relacionadas ao ato decisório em si, no âmbito das estruturas organizacionais dos órgãos com competência para firmar parcerias. A rigor, o ministério já conta com a distribuição de tais competências por meio da Portaria MinC nº 185/2025 (art. 6º, caput e § 2º), da IN MinC nº 1/2015 (art. 51, § 1º), da IN MinC nº 23/2025 (art. 2º, § 8º). Em síntese, compete à Subsecretaria de Gestão de Prestação e Tomada de Contas analisar a conformidade das prestações de contas, emitir pareceres, operacionalizar as medidas de elisão de danos e instruir e instaurar as tomadas de contas especiais, cabendo às demais secretarias, conforme suas competências de celebração, realizar o monitoramento e acompanhamento da execução dos projetos.
XV - Conclusões.
Diante de todo o exposto, recomendamos a ciência do presente parecer a todas as secretarias do Ministério da Cultura, que poderão aplicar suas orientações às prestações de contas de instrumentos de fomento direto e indireto de suas competências, sem necessidade de consulta individualizada a esta Consultoria Jurídica.
Para utilização deste parecer em casos concretos, recomenda-se às unidades técnicas competentes para o exame de prestações de contas a citação expressa do presente parecer referencial nos pareceres e notas técnicas que dele se utilizem, conforme art. 4º, inciso III, da Portaria Normativa nº 5/2022/CGU/AGU.
Em atenção ao art. 4º, inciso III, da Portaria Normativa nº 5/2022/CGU/AGU, atribui-se ao presente parecer o prazo de validade até 1º de março de 2026, devido à provável revisão de estoque regulatório do Ministério da Cultura no mês de fevereiro de 2026, quando ocorre a reabertura anual do sistema Salic, salvo em caso de revogação ou alteração, em prazo inferior, do Decreto nº 11.453/2024, da Instrução Normativa MinC nº 23/2025 ou da Instrução Normativa MinC nº 1/2015, situação em que se recomenda reanálise das questões à luz dos regulamentos supervenientes.
Em caso de alteração das demais legislações, jurisprudência ou orientação normativa citadas no presente parecer, poderá ser avaliada eventual necessidade de revisão ou mera complementação do parecer referencial, sem sua revogação.
Uma vez aprovado o presente parecer, considera-se revogado o Parecer Referencial nº 4/2023/CONJUR-MinC/CGU/AGU[1], caso ainda esteja dentro de seu prazo de validade.
Por fim, após a aprovação do presente parecer pela Consultora Jurídica, solicita-se à Coordenação Administrativa desta Consultoria Jurídica a cientificação, via Sapiens/AGU, ao Departamento de Informações Jurídicas Estratégicas da AGU, também em atenção ao art. 4º, III, da Portaria Normativa nº 5/2022/CGU/AGU.
À consideração superior.
Brasília, 12 de junho de 2025.
(assinado eletronicamente)
OSIRIS VARGAS PELLANDA
Advogado da União
Coordenador-Geral Jurídico de Políticas Culturais
Processo disponível em https://supersapiens.agu.gov.br — chave de acesso a80c81ba
Notas